A banalização do uso da máquina estatal em favor do clientelismo eleitoreiro

Por Herval Sampaio Junior

Até aonde vai a “cara de pau” de alguns homens públicos brasileiros?

Inicialmente ressalto que não estou a me referir a caso específico, até mesmo porque não cabe condenar ou atacar pessoas e/ou instituições de modo generalizado.

O que não posso, destaco, é ver tudo o que está acontecendo sem me revoltar, me rebelar, pois o que vejo é algo extremamente assustador, mostrando que a ousadia passou do limite do tolerável. Aliás, há muito que esse limite já foi ultrapassado!!

E como forma de se contrapor a essa ousadia de alguns homens públicos brasileiros no trato da coisa pública, nada mais salutar do que me utilizar de expressões fortes para contextualizar o modelo de clientelismo que se faz com a estrutura dos cargos públicos nesse país.

Já tratei do tema neste artigo “Direito de Todos – políticos brasileiros potencializam a crise econômica“, chamando a atenção que tal modo de agir indiscutivelmente potencializa a atual crise que passa o País, pois quando se utiliza claramente os cargos públicos fora do conjunto legal de suas atribuições, chega-se à desestruturação de todo o sistema.

A corrupção é algo passível de acontecer em todos os setores e em todos os lugares, contudo aqui no Brasil é um estilo indissociável da maioria dos homens públicos que detém o poder e utilizam as mais diversas formas de corrupção justamente para se perpetuar no poder.

Há muito tempo venho condenando em meus textos e vídeos o que chamo de estrutura do poder pelo poder (Triste realidade da politicagem brasileira: uma verdade que precisa ser enfrentada com rigor e firmezaTriste realidade da politicagem brasileira II: uma verdade que precisa ser enfrentada com rigor e firmeza) e se prestarmos bem atenção nos passos de alguns homens públicos e principalmente nos diversos escândalos de apadrinhamento político de cargos públicos, a citada estrutura é o modus operandi da maioria deles e tudo estritamente conectado com os fins eleitoreiros.

O detentor do poder de indicar pessoas para assumir cargos públicos nesse país raramente se vale de questões técnicas para definir o seu titular, daí a ineficiência como um todo de nossa máquina estatal, não escapando quase nenhum ente público e somente o número de cargos comissionados já nos autorizaria a conclusão trazida.

Entretanto, não é só isso que estou vendo atualmente, pelo contrário, se fatia a estrutura de cargos públicos entre as pessoas próximas do detentor político na acepção do termo, sem nenhuma cerimônia e muitas vezes sequer o labor em si é efetivamente realizado.

A quantidade de cargos ocupados por fantasmas assusta a qualquer pessoa e autoriza a conclusão de que a impunidade ainda é a expectativa que se tem de quem deliberadamente comete tais ilícitos, já que não se pode ter como razoável que ainda se insista em tal prática com tanta agressividade.

Com o surgimento da lei de acesso a informação, vez por outra a sociedade fica estarrecida, não só com a quantidade desproporcional de cargos comissionados em relação aos efetivos, mas principalmente com a impossibilidade física de ocupação de tais cargos e, por conseguinte, a própria necessidade de existência de tais cargos no que tange às atribuições de dada instituição.

Tal constatação é para mim a prova cabal do modelo de clientelismo eleitoreiro ora denunciado, que começa praticamente no primeiro dia em que o detentor do poder político chega ao poder e procura aparelhar a instituição com cargos que no futuro serão utilizados justamente para sua manutenção no poder. Tudo na vida tem limite: alargaram o portão de Grayskull da infidelidade partidária. Uma tapa na cara do eleitor!

E o pior de tudo isso é vermos que tudo acontece como se diz nas “nossas barbas” e não fazemos nada como de costumeA mudança só virá de fato quando nós nos tocarmos da origem de tudo e resolvermos fazer a nossa parte! pois parece que nos acostumamos com todo tipo de corrupção, já que sendo um problema estrutural de nossa cultura acabamos por tolerarmos e ao mesmo tempo cultuarmos.

E muitas vezes até participamos, já que apontar os outros como corruptos é a nossa especialidade e efetivamente fazermos o dever de casa não é a nossa tônica.

Portanto, a saída para esse quadro de clientelismo eleitoreiro é mudar drasticamente o sistema, vedando a todos os agentes políticos na acepção ampla do termo, o poder de indicar pessoas para exercício dos cargos públicos sem a devida qualificação técnica, além do próprio enxugamento da máquina estatal em todas as esferas.

Ouso dizer que serão poucas as instituições públicas brasileiras que passarão no teste da apuração técnica de seu quadro de cargos comissionados, ou seja, a patente maioria é absorvida pelo modelo de clientelismo eleitoreiro que condeno.

O abuso de poder político que tanto repudio acontece durante todo o exercício do mandato dos políticos e nas demais autoridades enquanto têm o poder de indicação dos cargos, tudo na diretriz de supremacia do interesse pessoal e não republicanos sobre o interesse coletivo.

Uma patente e cruel inversão de valores que atinge no âmago o povo brasileiro!

A ausência da qualidade do serviço público como um todo prestado pela grande maioria de nossos entes públicos está diretamente ligado a essa estrutura de poder pelo poder, que tem um fim em si mesmo, a satisfação do interesse pessoal de quem não quer de modo algum perder, como se diz, a “boquinha”.

O conjunto que deveria ser de prerrogativas do cargo ocupado em prol da coletividade se transforma em privilégios insaciáveis de quem só pensa em seu umbigo.

Tá na hora de exigirmos de todas as autoridades desse país a devida justificativa para cada titular de cargo comissionado, mesmo que se atinjam alguns que não usam o poder do cargo em benefício próprio, contudo, não temos capacidade de fiscalização, logo a saída parece ser somente essa.

Por outro lado temos que cobrar das autoridades e órgãos que fiscalizam, o mesmo critério, sendo inadmissível quem em sua própria estrutura se tenha o que deva ser combatido.

Como posso acreditar em quem vai fiscalizar, se muitas vezes o próprio clientelismo é prática corrente em seu agir?

Acredito nesse país, por mais que os fatos digam o contrário, pois se deixar de acreditar que podemos vencer a corrupção pelo menos como regra geral de nosso atuar, os nossos filhos e netos estão fadados a ter que conviver ainda por muitos anos e gerações com essa promiscuidade.

A crítica que ora faço, e talvez um pouco mais ousada como enunciei desde o início, não é a situação ou a oposição de dado grupo político em específico ou a determinada autoridade. Certo é que enquanto continuarmos nesse tipo de discurso vazio e generalizado, continuaremos na mesma, ao ponto das pessoas banalizarem as acusações, como vi em um texto que farei questão de postar abaixo. O texto informa como suposto autor o Presidente Nacional da OAB em recente discurso, fato que não se confirmou, de modo que tenho-o como anônimo até a publicação deste artigo. O que se vê, contudo, é o indicativo de que o povo começa a despertar e talvez o faça pelo desespero da situação.

Veja o duro teor do mesmo:

VOCÊ SABE O QUE É SAFADEZA??? O título até pode ser deselegante, mas que é muito verdadeiro…

1.SAFADEZA é comparar a pensão de um Deputado com a de uma Viúva.

2.SAFADEZA é um Cidadão ter que contribuir ao longo de 35 anos para ter direito a receber pensão, enquanto Deputados necessitam somente 1 ou 2 mandatos, conforme o caso, e alguns membros do Governo, para terem o direito de cobrar Pensão Máxima precisam unicamente do Juramento de Posse.

3.SAFADEZA é que os Deputados sejam os únicos Trabalhadores (???) deste País que têm isenção de IR sobre 1/3 de seu salário.

4.SAFADEZA é por, na Administração pública, milhares de Assessores (leia-se Amigalhaços) com Salários almejados pelos Mais Qualificados Técnicos.

5.SAFADEZA é a enorme quantidade de Dinheiro destinado a apoiar os Partidos, situação aprovada pelos mesmos Políticos que vivem deles.

6.SAFADEZA é que a um Político não se exija a mínima comprovação de Capacidade para exercer o Cargo (e nem estamos a nos referir à capacidade
Intelectual ou Cultural).

7.SAFADEZA é o valor gasto por essa tropa de safados com alimentação, veículos Oficiais, Motoristas, Viagens (sempre em 1ª Classe), Cartões de Crédito e etc.

8.SAFADEZA é essa mesma corja ter direito a quase 5 meses de Férias ao Ano (48 dias no Natal, uns 17 na Semana Santa, (mesmo que muitos se declarem não religiosos), e uns 82 dias no Verão).

9.SAFADEZA é essa corja, quando acaba um mandato, manter 80% do Salário por mais 18 meses.

10.SAFADEZA é ex-Ministro, ex-Secretário de Estado e outros de Altos Cargos da Política serem os únicos cidadãos deste País que podem legalmente acumular dois recebimentos do Erário Público.

11.SAFADEZA é se permitir que usem os Meios de Comunicação Social para mentir à Sociedade sobre seus feitos e seguirem assaltando os Bolsos dos Contribuintes.

Esta deveria ser uma dessas correntes que nunca poderia se romper!!!
NUNCA, porque só nós podemos acabar com TUDO ISSO.

UMA GRANDE SAFADEZA SERÁ NÃO REENVIAR ESSA MATÉRIA A TODOS OS MEMBROS DA SUA LISTA, ESPECIALMENTE ÀQUELES EVENTUAIS AMIGOS POLÍTICOS, VEZ QUE ELES SÃO OS PRINCIPAIS RESPONSÁVEIS POR TODA ESSA GRANDE SAFADEZA!!!

Destarte, a generalização e o ataque às instituições feitos no texto supra, o que não concordo, significa para mim o patente desespero de parte do povo brasileiro que não mais admite o modelo que ora condeno e que, quem sabe, seja o prenúncio finalmente da iminência de uma verdadeira revolução social acaso os nossos homens públicos não parem de abusar de nossa paciência no trato da coisa pública.

Ou alguem acha que estou errado em afirmar que o uso deturpado do cargo público para satisfação de fins pessoais seja correto e nós temos mesmo que nos acostumar com isso?


José Herval Sampaio Júnior é Mestre e Doutorando em Direito Constitucional. Professor de Processo Civil e Direito Eleitoral. Membro da ANNEP, IBDP e ABDPC. Juiz de Direito.

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