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Resenha

Sobre o Chuva de Bala e sobre saudade

Chuva de Bala virou filme (Foto: reprodução/Youtube)

Por Iuska Freire*

“Não há dor que doa, como a dor da saudade”, essa frase é de Maria da Luz, uma das viúvas interpretada lindamente por Luciana Duarte, na adaptação do espetáculo Chuva de Bala no País de Mossoró, obra escrita originalmente por Tarcísio Gurgel e que narra a saga da resistência de Mossoró ao bando de Lampião. A versão audiovisual estreou na noite desta quarta-feira, 23 de junho, pelo Youtube (https://www.youtube.com/watch?v=YAOsxeTW2Bc).

Escolhi iniciar o texto com essa frase porque ela faz muito sentido em nosso contexto atual. A saudade realmente dói muito e para milhares de pessoas essa é uma dor que não cessa.

Mas voltando ao espetáculo, fiquei lembrando das vezes que vi essa versão contada e recontada no adro da Capela de São Vicente, sempre com o “molhinho da mentira” para dar um gostinho especial. Pra ser sincera, senti saudade daquele encontro de pessoas, de chegar cedo para pegar um lugar bacana, depois emendar com o Cidadela… Saudade até de reclamar dos garçons que ficavam passando na frente das mesas, atrapalhando nossa visão, e de encrencar com as pessoas que guardavam pilhas de cadeiras para quem ia chegar depois, bem depois de mim.
Engraçado que tanto no teatro como em sua versão cinematográfica, a turma do cangaço consegue ter mais carisma em cena do que a turma do prefeito. Na pele de Lampião, Jeyzon Leonardo tem uma cena muito bonita antes de anunciar que “ia chover bala em Mossoró” (eu quase pude ouvir os versos “Alguém pra bater em mim/ Não nasceu nem nascerá/ Se nasceu não se criou/ Se se criou levou fim/ Alguém pra bater em mim/ Neste terreiro não há/ Com a bênção de meu padim/ Eu já fiz bala chover, estrela correr, o tempo parar, matei por matar, ver pra ver morrer/ E fazer sol quente esfriar!). Senti falta das músicas de Danilo Guanais.

O roteiro repete a fórmula do que já foi visto no teatro – narração, dança e cantoria. Acho que havia muitas possibilidades de trazer o novo, pois o cinema permite isso, porém precisamos compreender que o período de pandemia atrapalha muito e todo o esforço da equipe, tendo à frente o diretor Marcos Leonardo, merece ser reconhecido. As cenas externas foram as que mais gostei, os tons de sépia também ficaram bem bonitos.

Convergir diferentes formas de artes nem sempre é uma tarefa fácil. Do Teatro ao Cinema um dos principais desafios é justamente a atuação dos atores, a imposição da voz e os gestos exagerados destoam um pouco.

Percebi alguns detalhes técnicos que podem ser aprimorados, como um certo delay entre imagem e áudio. Mas o que me incomodou mesmo foram as legendas automáticas do YouTube com muitos erros de tradução, fiquei imaginando a dificuldade de compreensão de pessoas surdas, sobretudo as que moram em outros estados e não conhecem a história.

Como iniciei falando sobre saudade, não tem como terminar de outra forma. Assistir a versão cinematográfica do Chuva de Bala faz carinho na memória, mas provoca a vontade de ver essa história no palco que é seu verdadeiro lugar. Que no próximo ano a gente possa se encontrar.

*É jornalista

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