Por João Paulo Jales dos Santos*
Quem diria que a governadora Fátima Bezerra (PT) estaria numa situação tão delicada com seu companheiro de chapa ao Senado, o ex-prefeito de Natal Carlos Eduardo (PDT). O pedetista se tornou um entrave para a campanha governamental, ofuscando uma largada que mostra a governadora melhorando seu desempenho, aumentando as chances de vitória em 1º turno. Sinais de que o acordo PT-PDT seria complicado de aplicar no decorrer da caminhada eleitoral reluzia no farol da pré-campanha.
A governadora não tinha uma robusta aprovação popular para sustentar um nome tão controverso como Carlos. Fátima não possui o mesmo passe que seus correligionários Wellington Dias (candidato ao Senado, licenciado do Governo do Piauí), Camilo Santana (também candidato ao Senado, licenciado do Governo do Ceará) e Rui Costa (governador da Bahia) tem para sustentar uma candidatura que não passou pelo crivo de toda coligação. Dias, Santana e Costa gozam de governos com boa aprovação popular, o que fazem ter cacife junto à população para bancarem seus poucos conhecidos candidatos aos Governos de seus estados. Fátima enfrentou uma pré-campanha onde o descompasso entre aprovação e reprovação de seu mandato era o fator que elevava dúvidas sobre uma reeleição em 1º turno.
A petista tem que assistir duas realidades que mostram o quanto pouco fôlego tinha para afiançar a senatorial de Carlos. Dos prefeitos, teve que aceitar o denominado voto ‘farinho’, não tem como sustentar seu senadorável, que após a derrota de 2018 cuidou de sumir do mapa político. No ninho petista, nem perante sua base consegue impor o nome do pedetista, onde é latente a lembrança do voto que Carlos deu em 2018 a Bolsonaro e a empáfia com que chegou na casa governista, gerando ainda mais desconfiança entre a militância da legenda.
Carlos depende exclusivamente da militância do PT para tocar sua empreitada, vide que não arregimentou nesses últimos anos um grupo político para lhe dar arrimo. No entanto, com uma militância que não toca nem em seu nome, a candidatura do pedetista se encontra num entrave, podendo respingar na reeleição da governadora. O acordo que juntou a petista e o ex-prefeito já era por si só confuso, em prática vem se mostrando aquilo que já surgia como alerta, mas que a governadoria enxergava como contornável.
Carlos pedir voto para Ciro Gomes (PDT), estando junto a uma governadora lulista, causa enorme desagrado nas bases do PT. Ciro Gomes é malquisto pelos petistas que enxergam que sua candidatura visa tão somente atrapalhar a eleição de Lula (PT) já em 1º turno, visão que nada tem de errônea. Ciro não vai admitir, mas é visível, e confessado entre seus aliados mais íntimos, que o ex-governador cearense nutre profunda mágoa com o PT, que em 2018 não abriu mão da candidatura de Fernando Haddad (PT) para lhe apoiar, num cenário onde pesquisas mostravam que Ciro era o nome mais competitivo contra Bolsonaro (PL) no 2º turno. Tendo rompido com seus irmãos Cid Gomes (PDT) e Ivo Gomes (PDT) e com Camilo Santana, ao lançar o ex-prefeito de Fortaleza, Roberto Cláudio (PDT) ao Governo do Ceará, interrompendo uma aliança de quase 2 décadas com o PT, não seria problema nenhum para Ciro judiciar contra Carlos Eduardo, caso este não cumpra equanimemente o que fora acordado com o alto escalão da cúpula pedetista. Com uma candidatura que já começa mal na largada, criando arsenal contra si mesmo, uma querela com Ciro Gomes afunda ainda mais a chance de vitória de Carlos Eduardo.
A coligação Fátima-Carlos enfrenta um problema de timing, não seria no contexto deste pleito que essa união seria bem recebida, falta sinergia entre os dois. A governadora fica num outro impasse porque não pode criar desavenças contra Rafael Motta (PSB), colocando a militância do pessebista contra seu projeto de reeleição. Na dobradinha que faz com Carlos, vai faltando até mesmo comunicação entre as equipes. A ação protocolada para afastar Motta, com uso de força policial, das manifestações de Fátima, é uma ação de um candidato que politicamente está grogue. A ação além de prejudicial a Carlos, impacta a governadora, tumultuando as parcerias que Fátima tem com os prefeitos que votam ‘farinho’. O pedetista ainda causou a proeza de pôr em evidencia o nome de Rafael, ainda bastante desconhecido do eleitorado, equipando ainda mais a campanha de Motta, já que a ação foi rejeitada pela Justiça Eleitoral.
A peça judicial fez com que Rafael fosse assunto em grupos de redes sociais e em emissoras de rádio, salientando um dos maiores ativos que o deputado possui a seu favor, o voto que dá a Lula. Vai chegando ao conhecimento das massas lulista, da capital ao interior, que Rafael está com Lula, enquanto Carlos está com Ciro Gomes. Colar rapidamente sua imagem com Lula é tudo que Rafael precisa para facilitar ainda mais sua arrancada nas pesquisas.
A senatorial de 2022 tem características semelhantes às de 2006 e 2018, que quebraram protocolos convencionais, tendo como marca as várias nuances que definiram aquelas contendas. Rosalba Ciarlini (à época no extinto PFL), vencedora do pleito em 2006, iniciou a pré-campanha em 3º lugar. Fernando Bezerra (à época no PTB), era o incumbente, líder de Lula no Senado Federal, que tinha o arrimo de mais de 100 prefeitos. Num jogo de bastidores movido com sagaz habilidade, Rosalba explorou aos limites as falhas de Bezerra, neutralizando e conquistando apoios de prefeitos que fecharam com o senador, ultrapassou Geraldo Melo (PSDB), amealhando os votos de Geraldo e dos indecisos, terminando por impor a Fernando Bezerra a derrota que o tiraria para sempre da cena pública.
Em 2018, Garibaldi Filho, o senador de 1 milhão de votos no pleito de 2010, buscava reeleição. Com centena de prefeitos lhe dando bases e aporte do MDB nacional, a vitória do velho Gari era tida, por muitos, como garantida. Já em meados de agosto, o midiático policial militar Styvenson Valentim (que estava filiado à REDE), assumiu a liderança, de onde não mais saiu. Geraldo Melo (PSDB), com dezenas de prefeituras à sua disposição, despontava na pré-campanha como nome viável a conquistar a 2ª vaga. Coube a Zenaide Maia (na ocasião no PHS), surpreender e ficar com a vaga que foi cravada a Melo. O gap (diferença), que Zenaide impôs a Geraldo (3º colocado) e Garibaldi (4º colocado), não foi mensurado pelas inúmeras pesquisas.
Rosalba, Styvenson e Zenaide movimentaram as disputas de 2006 e 2018, virando o jogo em derrotas que lhes pareciam certas. É o mesmo movimento que Rafael Motta vai iniciando neste pleito. É a sua candidatura a responsável por cativar uma corrida que tinha tudo para ser anêmica. A pesquisa IPEC em parceria com a Inter TV Cabugi, a com maior grau de credibilidade na miríade de pesquisas jorradas na mídia potiguar, mostrou Motta com 14%, tecnicamente empatado com Rogério Marinho (PL), 17%, Carlos com 27%, é indício de que o pedetista atingiu seu teto de votos. Ao aparecer com 14%, com uma pré-campanha que teve pouco tempo para garantir mais capilaridade de adesão, Rafael assusta seus dois principais adversários. Marinho, já não bastasse carregar o fardo de ser o senador de Bolsonaro, se vê envolto em suspeitas sobre superlativo aumento de seu patrimônio, tendo que se esquivar dos casos de corrupção que pipocam no Ministério do Desenvolvimento Regional, que presidia até bem pouco tempo.
Outro número que causa tormenta em Carlos e Rogério nos números do IPEC, é o considerável número de votos branco/nulos/indecisos, 33%. Eles sabem que essa expressiva fatia é o principal capital político que tem o poder de catapultar Rafael à liderança. Até mesmo o pouco tempo que o deputado terá na propaganda eleitoral em rádio e TV, tem o poder de ser neutralizado por um bom trabalho nas redes sociais, importantes canais de massificação da informação.
Dando uma guinada numa trajetória que se iniciou no direitista Partido Progressista (PP, hoje denominado Progressistas), quando de sua eleição à vereança em Natal em 2012, Rafael assusta à esquerda, pelo PT temer a ascensão de um esquerdista fora das hostes da legenda, e à direita, receosa com um nome que possa atrair as forças do centro à direita. É uma questão de tempo que a emaranhada corrida ao Senado no pouco politicamente relevante Rio Grande do Norte chegue às manchetes da grande mídia nacional e atraia a atenção da cúpula petista e maior dedicação da cúpula do PSB.
Como parar Rafael Motta? A pergunta que inquieta os marketings de Carlos Eduardo e Rogério Marinho parece ser o prenúncio daquilo que passou longe das conjecturas traçadas à centro-esquerda e à extrema-direita, a propulsão do deputado que preparou um mandato na Câmara com condições para alcançar aquilo que muitos com desdém tratavam há 4 meses, sua vitória ao Senado Federal.
*É Graduado em Ciências Sociais pela UERN.
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