Resgatando a memória de 1988: desevendando uma eleição recheada de lendas

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Sempre digo nas rodas de conversas sobre a história política que existem três eleições emblemáticas na política mossoroense: 1968 quando o “capim” (Antonio Rodrigues de Carvalho) derrotou o “touro” (Vingt-un Rosado) por 98 votos quebrando a hegemonia rosadista instalada em 1948.

As outras são 1988 e 2012. A eleição de 2012 implodiu a oligarquia Rosado e resultou na unificação em curso.

Mas vamos nos ater a 1988. Muita gente fala muito sobre esse pleito. Diz que lembra de tudo tintim por tintim. Será que lembra mesmo? Pesquisando àquele pleito encontrei muitas coisas interessantes. Uma delas foi a maior renovação registrada na Câmara Municipal. Dos 21 vereadores da época, apenas 6 se reelegeram: Chico Borges (PFL), Antônio Duarte (PFL), Janúncio Soares (PMDB), Mateus Justino (PMDB), Joalba Vale (PDT) e Davi Lima de Santana (PMDB).

Naquele pleito alguns nomes que fizeram história na Câmara Municipal estrearam na política como Chico da Prefeitura (PFL), Tomaz Neto (ele jura que foi eleito pelo PDT, mas tanto na Gazeta do Oeste como em O Mossoroense ele aparece como filiado ao PFL), Vicente Rego (o mais votado daquele pleito com 1.404 sufrágios pelo PDS e que viria a ser presidente da casa em quatro oportunidades), Francisco José (último vereador mossoroense a conseguir se eleger deputado estadual, feito alcançado em 1994) e Junior Escóssia (que foi presidente da casa três vezes).

Mas o pleito é lembrado mesmo pelo primeiro confronto direto entre os Rosado. Em 1986 eles já havia se enfrentado de forma indireta com o ramo Vingt Rosado levando a melhor com Laíre Rosado e Vingt sendo os deputados mais votados em Mossoró (sendo o primeiro o estadual mais votado do Rio Grande do Norte), levando a melhor também na majoritária com as maiores votações para governador e senador no segundo maior colégio eleitoral do Estado.

Naquele pleito, as duas alas da família Rosado evitaram ataques mais incisivos na mídia. Mas em eleição municipal o radicalismo aflora. E foi isso que aconteceu em 1988.

O pleito é recheado de algumas lendas que se confundem em alguns casos por interesses políticos e em outros por pura falha de memória de quem viveu àqueles dias de grande emoção. Nada que uma boa visita aos jornais da época não tire as dúvidas sobre a histórica eleição de 1988.

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O primeiro mito que cai é o de que Laíre Rosado, favoritíssimo naquele pleito tinha 80% de intenção de votos. Essa informação não procede. Naquele ano poucas pesquisas foram publicadas e os institutos que trabalhavam no Estado eram de nível nacional e internacional como IBOPE e Gallup, respectivamente.

Laíre pesquisa

Na pré-campanha uma única pesquisa foi publicada. Os dados foram apresentados na edição do dia 1º de maio de O Mossoroense com o seguinte quadro:

Laíre Rosado 43,3%

Carlos Augusto Rosado 15,4%

Rosalba Ciarlini 8,5%

Sandra Rosado 6,9%

Jota Belmont 3,5%

Sílvio Mendes 2,5%

O curioso sobre essa publicação é que não foram apresentados o nome do instituto nem o período em que a pesquisa foi feita. Além de dados comuns nos dias de hoje como número de entrevistados e margem de erro. Em 1988 as pesquisas não precisavam ser registradas em ano eleitoral como atualmente.

O cenário político era bem mais equilibrado que o guardado no imaginário coletivo de Mossoró.

Uma outra lenda: “a médica Rosalba Ciarlini era um nome desconhecido que do nada surgiu e atropelou Laíre Rosado”. Não procede. Rosalba era um nome muito conhecido pela atuação dela como médica em comunidades carentes e por estar na linha de frente nas campanhas de Carlos Augusto Rosado. Ela era proativa na política tanto que sempre teve o nome dela cogitado para disputa de pleitos futuros, mas sempre desconversava dizendo que “o papel dela era ser mulher de político”.

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Não foi por acaso que o nome dela foi identificado como o mais forte para encarar Laíre Rosado cujo favoritismo era muito grande, de fato.

Laíre surgia como a renovação da oligarquia Rosado, o nome que sucederia Vingt e Dix-huit no comando político do clã. O primeiro teste nas urnas o colocou como imbatível para 1988. Ele passou dois anos desconversando com o argumento de que o projeto era disputar uma vaga na Câmara dos Deputados em 1990.

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Com toda essa força política, aliada a um grande carisma pessoal e apelo popular, o ramo de Vingt Rosado achou que o nome de Laíre seria aceito incondicionalmente dentro do PMDB.

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Mas havia Dix-huit Rosado que tinha outros planos. Na mente do “Velho Alcaide” o plano era eleger o então vice-prefeito Sílvio Mendes, falecido recentemente.

Era inimaginável naqueles dias que um dia Vingt e Dix-huit tomariam rumos diferentes na política. Faltou lembrar que um dia Carlos Augusto Rosado teria um comportamento de independência em relação aos tios.

Silvio e apoio de Dix-huit

O ramo de Vingt detinha o controle da máquina partidária e impôs o nome de Laíre sem consultar Dix-huit. Isso fez a pré-campanha de Laíre ser desastrosa e desgastante. Quando o se tocaram que Dix-huit estava amuado e cogitando romper com o Vingt, era tarde demais. Foram feitas várias tentativas de diálogo que não prosperaram. Laíre chegou a escrever uma série de artigos enaltecendo Dix-huit. Já era tarde. O estrago estava feito. A volatilidade da política cobraria um preço caro ao candidato que via sua adversária crescer.

Enquanto isso acontecia, Carlos Augusto se movimentava nos bastidores. Primeiro se reaproximou do jornalista Canindé Queiroz recebendo o apoio da Gazeta do Oeste. Canindé teria peso importantíssimo naquele pleito, traçando estratégias de comunicação.

Rosalba se filiando ao PDT

Outro passo, foi levar Rosalba ao PDT que na época era o maior partido de esquerda do país. No PDT ela deu um golpe de marketing associando o apelido “Rosa” com o símbolo do pedetismo que é uma mão segurando um cravo. Como nem todos diferenciam o cravo de uma rosa estava tudo certo.

Além disso, Rosalba conseguiu atrair parte do eleitorado de esquerda. Ela crescia na medida em que Laíre se desgastava tentando recuperar o terreno perdido com Dix-huit que cada vez mais tirava a máquina municipal da campanha peemedebista chegando a declarar neutralidade.

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Outra lenda: “a entrada de Dix-huit na campanha de Rosalba decidiu”. Menos, menos. Não foi bem assim. Dix-huit desceu do muro apenas em outubro, mais precisamente no dia 3.

Uma semana antes a Gazeta do Oeste publicou uma pesquisa que apontava a virada de Rosalba Ciarlini. Os dados coletados pelo IBOPE entre 24 e 25 de setembro de 1988 apontavam o seguinte cenário:

Rosalba Ciarlini (PDT): 39%

Laíre Rosado (PMDB): 38%

Chagas Silva (PT): 7%

Branco/Nulo: 6,7%

Não opinaram: 8,6%

Claro que estava configurado um cenário de equilíbrio, mas para quem começou com uma desvantagem 27 pontos percentuais estava líquido que ela venceria o pleito de forma surpreendente.

Dix-huit declara apoio a Rosalba

A chegada de Dix-huit não deve ser minimizada, mas colocada no seu devido lugar: ele ajudou a consolidar a vitória de Rosalba.

Enquanto O Mossoroense publicava enquetes realizadas na Rádio Difusora que apontavam Laíre na frente, a Gazeta do Oeste trouxe mais uma pesquisa do IBOPE realizada entre os dias 27 e 28 de outubro. Os dados foram publicados na edição de 6 de novembro:

Rosalba Ciarlini (PDT): 45%

Laíre Rosado (PMDB): 35,8%

Chagas Silva (PT): 6,5%

Brancos/Nulos: 4%

Não opinaram: 1,2%

Não sabem: 7,5%

A vitória de Rosalba estava consolidada. Mas não se tratou de uma luta de Davi contra Golias como muitos saudosamente gostam de afirmar quando relembram de 1988 nas rodas de conversas.

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De fato, Laíre tinha uma estrutura maior. Fazia mobilizações maiores. Mas Rosalba também contava com trios e artistas da Bahia animando as suas movimentações. Não eram comícios com poucas pessoas nem carreatas pequenas, com alguns abnagados colocando seus carros à disposição como muitos gostam de dizer por falha de memória ou vontade de mitificar aquele pleito.

Eram duas campanhas muito ricas.

Pode-se dizer que Laíre perdeu a eleição na pré-campanha. Foi uma fase desastrosa. Outro aspecto que pesou foi a crise econômica e a associação à imagem do então presidente José Sarney.

No xadrez político Carlos Augusto jogou bem melhor preservando Rosalba para lança-la no momento certo e poupando ela de assuntos desgastantes ficando na espreita para receber o apoio de Dix-huit Rosado.

Abaixo os resultados das eleições de 1988 para Câmara e Prefeitura de Mossoró:

Rosalba Ciarlini (PDT): 37.307 (49,7%)

Laíre Rosado (PMDB): 30.226 (40,2%)

Chagas Silva (PT): 2.507 (3,3%)

Brancos:  3.594 (4,8%)

Nulos: 1.503 (2%)

Votantes: 75.137

Câmara Municipal

PMDB

Nivaldo Dantas: 1.112

Paulo Fernandes: 930

Cláudio Rodrigues: 1.287

Marcos Medeiros: 1.001

Carlinhos Silveira: 815

Junior Escóssia: 1.144

De Assis Vieira: 955

Davi Lima de Santana: 811

Janúncio Soares: 1.117

Lupércio Luiz: 953

Pedro Fernandes (ex-diretor da ESAM): 768

PFL

Chico Borges: 1.245 votos

Gidel Gomes de Carvalho: 670

Francisco José: 1.362

Tomaz Neto: 891

Chico da Prefeitura: 840

Francisco Bezerra de Maria: 933

Mateus Justino: 628

Antônio Duarte: 1.115

PDS

Vicente Rego: 1.404

PDT

Joalba Vale: 978

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Canal Bruno Barreto