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Defesa de PMs é bala perdida no rumo de Doria

Por Josias de Souza

Chama-se Fernando Capano o advogado de seis policiais militares envolvidos na operação que resultou na morte de nove jovens num baile funk de Paraisópolis. Ele divulgou uma nota. Como peça de defesa, o texto é frágil. O doutor parece mais preocupado em embaralhar o jogo do que em mostrar as cartas. Há no baralho uma bala perdida na direção de João Doria.

Capano como que tira para dançar os organizadores do baile. Faz isso ao anotar que é preciso investigar a “responsabilidade dos organizadores desse tipo de evento que, reunindo grande multidão e sem cumprir minimamente as regras e posturas municipais de ocupação do espaço público, expõe seus frequentadores a grande risco”.

Noutro trecho, o advogado aponta no rumo da prefeitura paulistana. “Também causa espécie a ausência de qualquer fiscalização do poder público municipal que, de modo preventivo, poderia tutelar e organizar esse tipo de evento, evitando tragédias desta natureza, causadas por grandes aglomerações desorganizadas e em local físico impróprio.”

O que dá às observações do doutor a aparência de bala perdida é o fato de que ele ecoa um comentário feito pelo governador João Doria na primeira entrevista que concedeu sobre o massacre. Nela, Doria declarou que o baile de Paraisópolis “não deveria sequer ter ocorrido”, porque “é ilegal, fere a legislação municipal.”

O pancadão que embala a segunda maior favela de São Paulo ocorre há sete anos. O baile já existia, portanto, quando Doria foi prefeito da capital paulista, entre 2017 e 2018. E não há vestígio de providência que o então prefeito tenha adotado para corrigir a “ausência de fiscalização do poder público municipal.”

E quanto aos PMs? Bem, em relação aos seus clientes, Fernando Capano diz que não fizeram, senão evitar o pior. Como assim? “…A conduta dos policiais –cujas imagens que estão sendo veiculadas, em sua grande maioria, não dizem respeito ao dia do episódio–, serviu em grande medida para acautelar a ocorrência e evitar tragédia maior”.

Como se vê, os policiais militares continuam, por ora, indefesos. Apontar culpas alheias não produz inocência.

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A Exclusão e o Pancadão

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Paraisópolis é símbolo de nossa exclusão social (Foto: autor não identificado)

Por Fernando Rizzolo*

Uns anos atrás, escrevi um artigo sobre a repressão praticada pelos seguranças dentro dos shoppings centers em São Paulo, uma vez que não permitiam que grupos de jovens da periferia, que marcavam encontros chamados de “rolezinhos”, frequentassem os espaços dos shoppings.

O caso da invasão policial a um baile funk, do qual, segundo informações, participavam mais de 5.000 jovens, em virtude de uma perseguição dentro da comunidade de Paraisópolis, uma das maiores de São Paulo, com mais de 100.000 moradores, e que culminou com nove mortes numa verdadeira invasão policial tumultuada, denota o horror a que chegamos em termos de despreparo e impetuosidade policial em relação à população pobre deste país.

A grande verdade é que temos que olhar toda a situação de um ponto de vista que vai além do que realmente aconteceu, até porque ações policiais são necessárias em determinadas situações, mas é muito importante refletir não somente sobre o fato em si, que é, sim, de grande desproporcionalidade entre a atuação da polícia e o comportamento dos jovens pobres da periferia. O que vivenciamos hoje é a política do abandono total, na qual se nega qualquer chance de um futuro promissor aos jovens da periferia deste país, estigmatizados por viverem em uma comunidade, por serem negros, por serem pardos.

As vozes do planalto enaltecem a atuação militar, o desprezo pela desigualdade de oportunidades, o desemprego, a miséria e o superencarceramento em massa exatamente daqueles que são vítimas da falta do Estado no provimento do desenvolvimento do tecido social já tão desvalorizado, com 12,8 milhões de desempregados, 13,5 milhões de brasileiros ganhando menos que 145 reais e 12 milhões vivendo na extrema pobreza.

Para um jovem sem esperança, filho da miséria e do desemprego, viver numa comunidade é a única possibilidade, sendo que a grande maioria são famílias constituídas apenas pelas mães solteiras e seus filhos.

Nessa vertente desesperadora de exclusão, incluindo exemplos como os dos “rolezinhos” em shopping centers, já ficou provado que a única diversão para esses jovens são os chamados “pancadões”, embalados pelo funk.

A política do “ajuste fiscal”, da priorização do capital, da exclusão social que se agrava a cada dia, numa jangada perdida e sem rumo nos mares macroeconômicos, nos faz refletir sobre a deletéria influência das políticas socioeconômicas que passam pela liberalização de componente repressivo, como prisões abarrotadas e inspirações de cunho “excludentes de ilicitude”, levando ao excesso das ações policiais, reflexo puro e simples de uma política econômica inspirada na promoção da violência do Estado.

Para finalizar, poucos daqueles que apregoam a prisão em segunda instância se manifestam quando o problema é com o pobre, ou a periferia, estão, sim, cegos de vingança e sem emoção. Enquanto isso, jovens pobres morrem no chamado “pancadão”, sua única opção de diversão..

*É Advogado, Jornalista, mestre em Direitos Fundamentais.