UM OLHO NO GATO E OUTRO NO PEIXE

Por Francisco Carlos

Embora rejeite rótulos e patrulhamento ideológico, me declaro defensor da liberal democracia, do livre mercado e do meio-ambiente. Repudio a xenofobia, o racismo, a homofobia, a tortura, o preconceito religioso e de classe. Denuncio o maniqueísmo ideológico e condeno a forma majoritária de fazer campanha político-eleitoral. Defendo a liberdade política, científica e religiosa, como princípios para garantir igualdade de direitos e de oportunidades.

Em relação à eleição neste ano de 2018, rechaço as estratégias político-eleitorais dos dois principais candidatos à presidência da república e seus seguidores, que buscam demonizar adversários e construir cenários de medo, tensão e divisão entre os brasileiros. Com isso, esperam garantir plateia e eleitores. Apesar disso, o Brasil não está na iminência de uma guerra civil, nem se tornará o que cada candidato afirma, caso seu oponente seja eleito.

Partidos constroem discursos para representar e garantir espaços de apoio na sociedade, um pedaço (partido) da sociedade, que lhe garanta sustentação para alcançar o poder e mantê-lo. Para isso, esperam que o resultado da sua pregação seja expresso na forma de votos favoráveis.

Os partidos, por meio dos candidatos e da fé dos seus seguidores, procuram convencer os eleitores pela negação e desconstrução do oponente, em detrimento da valorização de ideias e propostas. Os candidatos buscam obter apoio social projetando características negativas no adversário, em detrimento da valorização da qualidade e viabilidade da sua agenda política, econômica, social e ambiental.

O candidato Jair Bolsonaro e seus seguidores propagam que, caso Fernando Haddad seja eleito, ocorreria uma fragilização da família e dos bons costumes cristãos, com disseminação da ideologia de gênero e do aborto, aconteceria uma ruína da economia devido ao viés estatizante e o crescente déficit público, ocorreria o avanço da violência, consequência da liberação do consumo de drogas, leniência com a bandidagem e a declarada libertação de 350 mil condenados a pequenas penas. Além disso, o Brasil passaria a ser governado por dirigentes corruptos, que levariam o país a uma ditadura socialista e ao caos social semelhante ao que ocorre na Venezuela.

O candidato Haddad e seus seguidores, por sua vez, propagam que uma eventual eleição de Bolsonaro, submeteria o país a uma ditadura fascista, na qual gays e negros seriam perseguidos e discriminados. Os pobres perderiam seus direitos, os trabalhadores seriam espoliados e as mulheres sofreriam ainda mais sob o jugo machista, diminuindo seu status humano e social. Além disso, a violência social cresceria porque o candidato defende a liberalização do porte de armas e apresenta um viés belicoso, propenso a soluções não democráticas.

De algum modo, os dois candidatos oferecem elementos que facilitam a adoção desses discursos. Contudo, afirmo que essa retórica está substancialmente equivocada e maculada pelo objetivo de poder ou, no mínimo, pela necessidade de garantir a fidelização de militantes políticos. As campanhas eleitorais não deveriam ser pautadas pela propaganda negativa e a rotulação dos adversários com adjetivos depreciativos.

Infelizmente, milhões de brasileiros reproduzem discursos construídos para servir a estratégias de poder, como verdades a qual todos devem se converter. Neologismos pejorativos são construídos para rotular e depreciar as qualidades do oponente: Eleitor de Haddad é petralha ou esquerdoparta, ou seja: esquerdista doentio, ativista gay, corrupto e/ou defensor de corruptos. Eleitor de Bolsonaro é bolsomínio ou facista, a saber: misógino, homofóbico e racista com tendências ditatoriais. Quem não assimila a propaganda politica automaticamente perde o respeito, sem direito a um cordial cumprimento.

Refuto esse maniqueísmo. Denuncio a insensatez e não aceito incentivar ou fazer parte desse tipo de política e alerto: minha posição é apenas uma entre outras possíveis. Acredito ser a melhor postura, mas não a defendo como uma verdade universal.

Acredito que não há santos ou demônios em nosso escopo político-partidário. Observando de perto, o mais santo guarda um tridente debaixo da túnica e o demônio projetado no outro, tem uma auréola. A política não é a luta do bem contra o mal, é um embate ideológico de verdades relativas, dinâmicas e passageiras. O que se quer, é alcançar e manter posições sociais.

A política sempre expressa verdades limitadas e provisórias, razão pela qual não é prudente assumir fervorosa e irremovível defesa de posições político-partidárias. Como não é um dogma, a política é fluída, sujeita a lentas alterações ou radicais mudanças de posição. Em condições democráticas, é um ambiente no qual se expressa o antagonismo de ideias e visões conflitantes sobre o mundo ideal.

A cada eleição, as imagens projetadas sofrem alterações, se invertem ou se misturam. Neste ano, partidos e candidatos rotulados de golpistas devido ao impeachment de Dilma Rousseff, apoiam ou são prazerosamente apoiados pelos golpeados, em nome de convenientes arranjos de curto prazo para obtenção de poder político. Com isso, o adversário que personifica o mal, recebe uma benção redentora.

Neste enredo, há os ideólogos e os propagadores de discursos e plataformas políticas. Os ideólogos elaboram estratégias e discursos, sempre sabem o que fazem e o que querem. Os propagadores estão divididos entre os disseminadores conscientes e os ignorantes. Alguns conhecem os equívocos e limitações do discurso, enquanto outros, movidos pela boa fé, não conseguem perceber o maniqueísmo ao qual estão sujeitados.

O Brasil não está dividido entre fascistas e comunistas, ou mesmo entre maquiavélicos ideólogos e alienada massa de manobra. Há outras divisões e alternativas. Embora o tema não esteja esgotado, está lançado o apelo em favor da moderação, da parcimônia e do equilíbrio e fica uma exortação: defenda firmemente suas crenças, sempre considerando a possibilidade do erro e o que pode aprender com seus oponentes. Escolha seu candidato, com um olho no gato e outro no peixe.

*É professor da UERN e vereador pelo PP em Mossoró/RN.

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Reportagem especial

Canal Bruno Barreto