Um grupo formado por 15 professores da Universidade Federal Rural do Semiárido (Ufersa) assinaram o manifesto “Grupo de professores assinam manifesto “O eu acima de todos: a Ufersa antidemocrática” em que denunciam desmando da reitora Ludimilla Oliveira.
Confira o manifesto:
“O eu acima de todos: a Ufersa antidemocrática”
Não é nova a discussão sobre a forma pela qual as instituições democráticas são corrompidas e, seja por meio de golpes violentos ou por atos sutis com aparência de legalidade, o governo Bolsonaro quase sempre protagoniza grandes e grotescos episódios de erosão democrática.
Seu mais recente e, aparentemente, predileto cenário tem sido as Universidades Públicas Federais, autarquias que, segundo a Constituição, gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira/patrimonial. Quebrando uma regra democrática não escrita, enrijecida na experiência constitucional e administrativa brasileira no pós-1988, o Presidente da República criou o hábito, desde 2019, de nomear para o cargo de Reitor/Reitora, docentes que não foram os mais bem votados nas listas tríplices elaboradas pelas comunidades acadêmicas. Esse foi o caso da Universidade Federal Rural do Semi-Árido (Ufersa), em seu mais recente processo sucessório, ocorrido em 2020.
Quando se permite e naturaliza a corrosão das normas democráticas, geralmente as peças escondidas na caixa de ferramentas dos protagonistas destes atos são responsáveis por erodir cada vez mais as regras de convivência comunitária. Isso ocorreu muitas vezes nos últimos meses na Ufersa, em que ficaram comuns episódios de divergência entre a gestão universitária, capitaneada pela docente que ficou na última colocação da lista tríplice formada pelos votos dos três segmentos da Universidade (Professora Ludimilla Oliveira), e estudantes. O mais recente caso está em desenvolvimento desde a semana passada até o momento em que escrevemos este texto: a colação de grau do semestre letivo 2020.1.
O contexto do conflito dá-se no entorno da Portaria UFERSA/Gab. n. 008, de 8 de janeiro de 2021, que, no afã de regulamentar o procedimento virtual de colação de grau enquanto perdurar o estado de suspensão das atividades presenciais causado pela pandemia do novo coronavírus, violou o direito à liberdade de expressão dos três segmentos da comunidade acadêmica ao determinar que a transmissão da cerimônia pelo canal do YouTube da Ufersa se daria com o chat desabilitado e incluir um dispositivo que, por antecipação, cerceia a possibilidade de manifestação dos estudantes e familiares participantes do ato.
Ao tomar conhecimento da situação, a Defensoria Pública da União ingressou com a Ação Civil Pública n. 0800020-61.2021.4.05.8401 e conseguiu uma ordem liminar, proferida pela Justiça Federal do Rio Grande do Norte, determinando a suspensão dos efeitos dos artigos citados. É necessário destacar que a decisão judicial manteve, na íntegra, todos os demais dispositivos da Portaria. A mensagem transmitida pela gestão universitária, no entanto, foi em sentido contrário. Em nota veiculada no dia 11/01/2021, a Ufersa informou que revogou a totalidade da normativa em decorrência da ordem judicial e que, por isso, a colação de grau seria transferida para o dia 15/01/2021.
Ao transferir a colação de grau do dia 11/01/2021 para 15/01/2021, a gestão universitária, além de adiar por quase uma semana o momento tão esperado, de forma sub-reptícia, colocou “na conta” dos estudantes a derrota judicial sofrida. Entretanto, a responsabilidade pela emissão de uma Portaria com regras que contrariam a liberdade de expressão/manifestação protegida constitucionalmente e referendada pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal não é da classe estudantil, mas dos elaboradores do documento. Caso não houvesse inconstitucionalidade patente nos dispositivos mencionados, certamente a Justiça Federal não teria deferido a medida liminar solicitada pela Defensoria Pública da União.
Não bastasse toda a celeuma criada, no início da noite de 13/01/2021, a Pró-Reitoria de Graduação fez circular no e-mail dos formandos uma comunicação no sentido de que todo o procedimento de colação de grau do semestre letivo 2020.1 ocorrerá remotamente, sem solenidade ou transmissão via YouTube, apenas com coleta de assinaturas e juramentos, atos a serem realizados via formulário online. O resultado prático disso é: os 492 estudantes que terminaram os seus Cursos de Graduação no atual semestre letivo não terão a oportunidade/possibilidade de compartilhar este momento tão especial com os seus familiares e amigos, algo tão importante em suas vidas.
A atuação da gestão universitária neste episódio, mais uma vez, demonstra a sua inabilidade para lidar com o dissenso dentro do ambiente acadêmico. Certamente sem argumentos para enfrentar eventuais manifestações de protesto no âmbito virtual, as autoridades responsáveis pela colação de grau resolveram privar os estudantes da oportunidade de celebrar o momento com as pessoas próximas e terem a sensação de encerramento de mais um ciclo em seus percursos educacionais. A postura é um desprezo ao direito social à educação constitucionalmente previsto. Não se pode deixar de salientar que este é mais um passo na erosão das nossas regras democráticas construídas ao longo dos anos.
Não dá para justificar a não realização da sessão solene de colação de grau por conta da pandemia do novo coronavírus, como se fez na comunicação aos discentes, uma vez que diversas Escolas e Universidades Brasil afora estão usando a modalidade virtual para proceder com tais atos. O que a gestão universitária fez, na verdade, foi reagir à ordem judicial com truculência ao cancelar a solenidade de colação de grau. Pelo visto, o slogan “Uma só Ufersa” consiste numa tentativa de calar eventuais discordâncias com a atuação administrativa pelo não acolhimento de críticas. Se esta omissão virar regra e perpetuar-se na Ufersa, a comunidade acadêmica verá perder-se mais um importante momento que marca significativamente a vida de todos os envolvidos.
Cabe agora aos Órgãos Colegiados Superiores da instituição buscar meios de contornar esse grave problema. As solenidades de colação de grau na Ufersa são Assembléias Universitárias cujas datas são fixadas previamente por ato do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (calendário acadêmico 2020.1). A alteração do padrão de realização das solenidades de colação de grau (ou a sua inexistência) deve ser debatida junto ao órgão colegiado competente. Se não for possível resolver o problema para 2020.1, que ele ao menos não perdure indefinidamente. Afinal, como disse um juiz em uma das muitas judicializações de atos autoritários da gestão que não foi escolhida nem acolhida pela comunidade universitária, uma reitora pode muito, mas não pode tudo.
Ana Tereza de Abreu Lima – Professora da Ufersa
Antônio Carlos Cavalcante Correia – Professor da Ufersa
Daniel Alves Pessoa – Professor da Ufersa
Felipe Araújo Castro – Professor da Ufersa
Jean Berg Alves da Silva – Professor da Ufersa
Jeferson Santos Teixeira da Silva – Técnico Administrativo da Ufersa
Liebert de Abreu Muniz – Professor da Ufersa
Mackson Matheus França Nepomuceno – Professor da Ufersa
Marcelo Barbosa Bezerra – Professor da Ufersa
Mário Gleisse das Chagas Martins – Professor da Ufersa
Rafael Luz Espindola – Professor da Ufersa
Rodrigo Silva da Costa – Professor da Ufersa
Sidnei Miyoshi Sakamoto – Professor da Ufersa
Subênia Karine de Medeiros – Professora da Ufersa
Ulisses Levy Silvério dos Reis – Professor da Ufersa
Álvaro Daniel Teles Pinheiro – Professor Ufersa
Ana Cláudia Araújo Fernandes – Professora da Ufersa
Ana Maria Bezerra Lucas – Professora da Ufersa
Ana Tereza de Abreu Lima – Professora da Ufersa
Angélica Félix de Castro – Professora da Ufersa
Ângelo Magalhães Silva – Professor da Ufersa
Antônio Carlos Cavalcante Correia – Professor da Ufersa
Claudio de Souza Rocha – Professor da Ufersa
Cristina Baldauf – Professora da Ufersa
Daniel Alves Pessoa – Professor da Ufersa
Daniel Araújo Valença – Professor da Ufersa
Danielle de Araújo Bispo – Professora da Ufersa
Daniel Valadão Silva – Professor da Ufersa
David Custódio de Sena – Professor da Ufersa
Eldio Pinto da Silva – Professor da Ufersa
Elisabete Stradiotto Siqueira – Professor da Ufersa
Felipe Araújo Castro – Professor da Ufersa
Flávia Coelho – Professora da Ufersa
Francisco Franciné Maia Júnior – Professor da Ufersa
Geovani Ferreira Barbosa – Professor da Ufersa
Inês Xavier Martins – Professora da Ufersa
Ivanilson de Souza Maia – Professor da Ufersa
Izabelly Larissa Lucena – Professora da Ufersa
Jean Berg Alves da Silva – Professor da Ufersa
Jeferson Santos Teixeira da Silva – Técnico Administrativo da Ufersa
Jesane Alves de Lucena – Professora da Ufersa
José Domingues Fontenele Neto – Professor da Ufersa
Katia Cilene da Silva Santos – Professor da Ufersa
Kyara Maria de Almeida Vieira – Professora da Ufersa
Lázaro Fabrício de França Souza – Professor da Ufersa
Leonardo Querido Cárdenas – Professor da Ufersa
Liebert de Abreu Muniz – Professor da Ufersa
Lizziane Souza Queiroz Franco de Oliveira – Professora da Ufersa
Luiz Eduardo da Silva Andrade – Professor da Ufersa
Mackson Matheus França Nepomuceno – Professor da Ufersa
Manoel Reginaldo Fernandes – Professor da Ufersa
Marcelo Barbosa Bezerra – Professor da Ufersa
Maria Joseane Felipe Guedes Macedo – Professora da Ufersa
Mário Gleisse das Chagas Martins – Professor da Ufersa
Melquisedeque de Oliveira Fernandes – Professor da Ufersa
Napiê Galvê Araújo Silva – Professor da Ufersa
Oona de Oliveira Caju – Professora da Ufersa
Patricia de Oliveira Lima – Professora da Ufersa
Rafael Luz Espindola – Professor da Ufersa
Ramsés Otto Cunha Lima – Professor da Ufersa
Rodrigo Silva da Costa – Professor da Ufersa
Rodrigo Soares Semente – Professor da Ufersa
Rudson de Souza Lima – Professor da Ufersa
Sidnei Miyoshi Sakamoto – Professor da Ufersa
Sileide de Oliveira Ramos – Professora da Ufersa
Sílvio Roberto Fernandes de Araújo – Professor da Ufersa
Subênia Karine de Medeiros – Professora da Ufersa
Taciano Amaral Sorrentino – Professor da Ufersa
Teresinha Silva de Brito – Professora da Ufersa
Thiago Arruda Queiroz Lima – Professor da Ufersa
Ulisses Levy Silvério dos Reis – Professor da Ufersa
Valdemar Siqueira Filho – Professor da Ufersa
Vicente de Lima Neto – Professor da Ufersa
Vinicius Gomes de Castro – Professor da Ufersa