Erros nas pesquisas eleitorais como estratégias de marketing para indução de votos

Imagem: autoria não identificada

Por Gláucio Tavares Costa e José Herval Sampaio Júnior*

Iniciamos esse pequeno texto chamando atenção a expressão “erros” utilizada de propósito como elemento midiático, pois, na realidade, falar em erros em pesquisas, cientificamente tratando, somente estaticamente dentro dos limites, que são previsíveis e objetivamente levados em consideração, contudo tal expressão foi dita para chamar atenção da patente manipulação feita por alguns institutos a pedido ou mediante pagamento de candidatos, com intuito de manipular o eleitorado, burlando a própria democracia.

Em momento algum desse texto, vamos nos referir a qualquer possível prática dessa em concreto, pois não dispomos de qualquer elemento nesse sentido e os exemplos são trazidos tão somente para facilitar o raciocínio do texto em si.

Na pesquisa eleitoral realizada na cidade de Natal/RN pela AtlasIntel, entre os dias 18 e 23 de setembro, foram ouvidos 1.200 eleitores. O referido estudo estatístico, com registro na RN-04289/2024 na Justiça Eleitoral, foi divulgado no dia 24/09/2024, no qual os candidatos a prefeito da capital potiguar pontuaram proporcionalmente na preferência do eleitorado natalense: Natália Bonavides tem 28,4%; Paulinho Freire 27,9%, e Carlos Eduardo 27,6%.

Quase que simultaneamente, no dia 25/09/2024, foi anunciada uma pesquisa feita pela Consult/TN, na qual foram ouvidos 1.000 eleitores entre os dias 20 e 23 de setembro. Desta feita, o estudo estatístico, com registro na RN-07479/2024 na Justiça Eleitoral, apontou que os candidatos a prefeitura de Natal marcaram: Paulinho Freire 32,6%; Carlos Eduardo 31,5%; e Natália 17%.

A discrepância entre o resultado das mencionadas pesquisas, especialmente entre a coleta de dados do eleitorado da candidata Natália Bonavides, que variou de 28,4% a 16,4%, sinalizou possíveis falhas nos estudos estatísticos em retratar quantitativamente a intenção de votos dos eleitores natalenses.

Num cenário de resultados de pesquisas eleitorais tão distintos, é natural que a propaganda eleitoral seja significantemente afetada, com a máxima difusão possível da pesquisa em que dado candidato teve uma boa pontuação na preferência do eleitorado e, por outro lado, omissão do estudo com resultado adverso.

Dessa forma, acentuadas divergências de dados das pesquisas eleitorais impactam de maneira enérgica a propaganda eleitoral, ensejando certa desconfiança se eventuais erros nas pesquisas eleitorais são meras estratégias de marketing para indução de votos, o que é vedado em nosso ordenamento jurídico, inclusive previsto com tipo penal, consoante disposições da Lei n° 9.504/1997, in verbis:

“Art. 33. As entidades e empresas que realizarem pesquisas de opinião pública relativas às eleições ou aos candidatos, para conhecimento público, são obrigadas, para cada pesquisa, a registrar, junto à Justiça Eleitoral, até cinco dias antes da divulgação, as seguintes informações:

I – quem contratou a pesquisa;

II – valor e origem dos recursos despendidos no trabalho;

III – metodologia e período de realização da pesquisa;

IV – plano amostral e ponderação quanto a sexo, idade, grau de instrução, nível econômico e área física de realização do trabalho a ser executado, intervalo de confiança e margem de erro; (Redação dada pela Lei nº 12.891, de 2013)

V – sistema interno de controle e verificação, conferência e fiscalização da coleta de dados e do trabalho de campo;

VI – questionário completo aplicado ou a ser aplicado;

VII – nome de quem pagou pela realização do trabalho e cópia da respectiva nota fiscal. (Redação dada pela Lei nº 12.891, de 2013)

  • 1º As informações relativas às pesquisas serão registradas nos órgãos da Justiça Eleitoral aos quais compete fazer o registro dos candidatos.
  • 2o A Justiça Eleitoral afixará no prazo de vinte e quatro horas, no local de costume, bem como divulgará em seu sítio na internet, aviso comunicando o registro das informações a que se refere este artigo, colocando-as à disposição dos partidos ou coligações com candidatos ao pleito, os quais a elas terão livre acesso pelo prazo de 30 (trinta) dias. (Redação dada pela Lei nº 12.034, de 2009)
  • 3º A divulgação de pesquisa sem o prévio registro das informações de que trata este artigo sujeita os responsáveis a multa no valor de cinquenta mil a cem mil UFIR.
  • 4º A divulgação de pesquisa fraudulenta constitui crime, punível com detenção de seis meses a um ano e multa no valor de cinquenta mil a cem mil UFIR.
  • 5o É vedada, no período de campanha eleitoral, a realização de enquetes relacionadas ao processo eleitoral. (Incluído pela Lei nº 12.891, de 2013)

Art. 34. (VETADO)

  • 1º Mediante requerimento à Justiça Eleitoral, os partidos poderão ter acesso ao sistema interno de controle, verificação e fiscalização da coleta de dados das entidades que divulgaram pesquisas de opinião relativas às eleições, incluídos os referentes à identificação dos entrevistadores e, por meio de escolha livre e aleatória de planilhas individuais, mapas ou equivalentes, confrontar e conferir os dados publicados, preservada a identidade dos respondentes.
  • 2º O não-cumprimento do disposto neste artigo ou qualquer ato que vise a retardar, impedir ou dificultar a ação fiscalizadora dos partidos constitui crime, punível com detenção, de seis meses a um ano, com a alternativa de prestação de serviços à comunidade pelo mesmo prazo, e multa no valor de dez mil a vinte mil UFIR.
  • 3º A comprovação de irregularidade nos dados publicados sujeita os responsáveis às penas mencionadas no parágrafo anterior, sem prejuízo da obrigatoriedade da veiculação dos dados corretos no mesmo espaço, local, horário, página, caracteres e outros elementos de destaque, de acordo com o veículo usado…”

Calha lembrarmos que, como assinalamos no artigo: “A imperiosa necessidade de revisão normativa das pesquisas eleitorais!” (COSTA e SAMPAIO JR., 2022) (https://www.jusbrasil.com.br/artigos/a-imperiosa-necessidade-de-revisao-normativa-das-pesquisas-eleitorais/1663039602), segundo a regulamentação do Tribunal Superior Eleitoral, por meio da Resolução n° 23.727, de 27/02/2024, os partidos, candidatas e candidatos, coligações, federações partidárias e o Ministério Público são partes legítimas para impugnarem o registro ou a divulgação de pesquisas eleitorais, quando detectarem eventual descumprimento das regras sobre o assunto. Contudo, na prática, os legitimados não costumam questionar as pesquisas, justamente porque como não há nenhum controle substancial por parte de qualquer órgão e eventuais desacordos ou até mesmo má-fé acabam ficando por isso mesmo pelo interesse de uso das pesquisas como estratégia de marketing eleitoral, o que é pernicioso para a higidez do processo eleitoral.

É mister afirmar, consoante alinhado em nosso artigo acima mencionado, que o ordenamento eleitoral não se mostra suficiente para afastar a possibilidade da utilização das pesquisas eleitorais como verdadeiras peças publicitárias em prol de dadas candidaturas, sendo necessário o empenho do Poder Legislativo no aperfeiçoamento das regras atinentes a tal matéria, criando além de limitação da quantidade de institutos que possam nacionalmente e regionalmente realizar pesquisas eleitorais, uma forma mínima de controle substancial, de modo que as demais pesquisas continuem servindo tão somente para consumo interno e as que realmente forem publicadas, sejam dentro dos critérios rígidos que a estatística delimita, o que com toda certeza não se terá doravante erros além da margem do aceitável pela própria ciência estatística, o que na realidade se constitui em dolo específico de manipulação de um instituto que bem utilizado serve a democracia e não pode ser desconsiderado, contudo, não podemos continuar aceitando o uso enviesado e criminoso que infelizmente se pratica nas eleições brasileiras.

Não é escopo deste artigo evidentemente debater metodologia de estudos estatísticos. Entretanto, pensamos comportar uma reflexão de como evitar o emprego exagerado das pesquisas eleitorais como instrumento de persuasão de votos, principalmente quando estudam o mesmo eleitorado praticamente no mesmo período e trazem resultado tão diferentes, como no exemplo das últimas pesquisas eleitorais realizados na capital potiguar, logo claramente se verifica em alguns casos que longe de serem erros dentro dos limites aceitáveis, se trata de verdadeira manipulação, o que não pode ser tolerado por um país que se diz democrático por excelência.

Referências:

  1. Costa, Gláucio Tavares e Sampaio Júnior, José Herval (2022). A imperiosa necessidade de revisão normativa das pesquisas eleitorais! Jusbrasil. Recuperado de https://www.jusbrasil.com.br/artigos/a-imperiosa-necessidade-de-revisao-normativa-das-pesquisas-eleitorais/1663039602
  2. Exame (2024). Natália Bonavides tem 28,4%; Freire, 27,9%, e Eduardo 27,6%, em Natal, aponta pesquisa AtlasIntel. Recuperado de https://exame.com/brasil/natalia-bonavides-tem-284-freire-279-e-eduardo-276-em-natal-aponta-pesquisa-atlasintel/
  3. Tribuna do Norte (2024). TN e Consult divulgam nova pesquisa para Prefeitura de Natal nesta quarta. Recuperado de https://tribunadonorte.com.br/eleicoes-2024/tn-consult-com-326-paulinho-freire-passa-carlos-que-tem-315/

*Autores:

Gláucio Tavares Costa é analista judiciário do TJRN, mestrando em Direito pela Universidad Europea del Atlántico e graduado em Farmácia pela UFRN.

José Herval Sampaio Júnior é Juiz de Direito TJRN, Mestre e Doutor em Direito Constitucional e Professor da UERN.

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