Por Rogério Tadeu Romano*
Noticiou o portal do jornal O Globo:
“O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), indicou a líderes partidários que pretende levar ao plenário, na segunda semana de novembro, o projeto que classifica facções criminosas como organizações terroristas. A proposta, de autoria do deputado Danilo Forte (União-CE), ganhou novo impulso após a crise de segurança no Rio de Janeiro e vem sendo tratada como uma das possíveis prioridades da Mesa, em meio à pressão de bancadas da segurança pública e de governadores.”
“Segundo Gonçalvez (2004), as facções criminosas podem ser definidas como grupos organizados que atuam de forma criminosa, estabelecendo normas, hierarquias e objetivos específicos, com o intuito de obter poder, controle territorial e benefícios econômicos através de atividades ilícitas. Essas organizações são caracterizadas por estruturas hierárquicas, regras internas rígidas e uma cultura própria, que estabelecem um sistema de poder e controle dentro do contexto criminal”(ORIENTANDO: GABRIELA MARIANA DE OLIVEIRA ORIENTADORA: PROF.ª MS. ISABEL DUARTE VALVERDE – Facções Criminosas, PUC – Goiás).
O terrorismo é o uso de violência, física ou psicológica, através de ataques localizados a elementos ou instalações de um governo ou da população, destinado a incutir medo, terror, com o objetivo de obter efeitos psicológicos que ultrapassem o círculo das vítimas.
A Lei 13.260, de 16 de março de 2016, define o que é crime de terrorismo:
Art. 2o O terrorismo consiste na prática por um ou mais indivíduos dos atos previstos neste artigo, por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, quando cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública.
- 1o São atos de terrorismo:
usar ou ameaçar usar, transportar, guardar, portar ou trazer consigo explosivos, gases tóxicos, venenos, conteúdos biológicos, químicos, nucleares ou outros meios capazes de causar danos ou promover destruição em massa;
Os atos preparatórios são considerados criminosos para efeito da lei de Terrorismo.
Art. 5o Realizar atos preparatórios de terrorismo com o propósito inequívoco de consumar tal delito:
Pena – a correspondente ao delito consumado, diminuída de um quarto até a metade.
- lo Incorre nas mesmas penas o agente que, com o propósito de praticar atos de terrorismo:
I – recrutar, organizar, transportar ou municiar indivíduos que viajem para país distinto daquele de sua residência ou nacionalidade; ou
II – fornecer ou receber treinamento em país distinto daquele de sua residência ou nacionalidade.
- 2o Nas hipóteses do § 1o, quando a conduta não envolver treinamento ou viagem para país distinto daquele de sua residência ou nacionalidade, a pena será a correspondente ao delito consumado, diminuída de metade a dois terços.
Os atos preparatórios, que o direito penal geralmente não tipifica como crime estão como tal inseridos na lei.
Amigos dos Amigos, Comando Vermelho, Terceiro Comando, Primeiro Comando da Capital, Primeiro Comando Mineiro, Paz, Liberdade e Direito, Comando Norte/Nordeste. São todos nomes de facções criminosas espalhadas de Norte a Sul do país (Rádio Câmara – Câmera dos Deputados -A história das facções criminosas brasileiras).
Pois bem.
No portal da CNN se disse:
“Nos Estados Unidos, a definição é mais ampla e permite classificar como terroristas grupos ligados ao tráfico internacional e à violência organizada. Além disso, o sistema penal é mais rigoroso nesses casos.
A gestão de Trump tem buscado enquadrar grupos criminosos latino-americanos em atividades que podem ser associadas ao terrorismo, segundo a legislação dos EUA. Isso ocorre, por exemplo, com a facção venezuelana Tren de Aragua.”
Assim operações como essas que estão sendo realizadas no Caribe, em afronta ao Direito Internacional, poderiam ser realizadas pelos estadunidenses no Brasil contra essas facções criminosas, consideradas pelos Estados Unidos como terroristas.
Haveria uma verdadeira operação de guerra, uma invasão.
A invasão na guerra é a simples penetração de um beligerante em território inimigo; determina a dominação de uma parte desse território inimigo, mas sem o exercício regular de poderes administrativos. Ela precede a ocupação. Esta é, pois, uma fase ulterior, que consiste no estabelecimento de um poder de fato sobre uma parte ou a totalidade do território inimigo.
Não se trataria, por óbvio, de uma passagem inocente, mas, sim, um ato de guerra
Para tanto, tem-se disciplina no Direito Internacional:
ARTIGO 19
Significado de passagem inocente
- A passagem é inocente desde que não seja prejudicial à paz, à boa ordem ou à segurança do Estado costeiro. A passagem deve efetuar-se de conformidade com a presente Convenção e demais normas de direito internacional.
- A passagem de um navio estrangeiro será considerada prejudicial à paz, à boa ordem ou à segurança do Estado costeiro, se esse navio realizar, no mar territorial, alguma das seguintes atividades:
- a) qualquer ameaça ou uso da força contra a soberania, a integridade territorial ou a independência política do Estado costeiro ou qualquer outra ação em violação dos princípios de direito internacional enunciados na Carta das Nações Unidas;
- b) qualquer exercício ou manobra com armas de qualquer tipo;
- c) qualquer ato destinado a obter informações em prejuízo da defesa ou da segurança do Estado costeiro;
- d) qualquer ato de propaganda destinado a atentar contra a defesa ou a segurança do Estado costeiro;
- e) o lançamento, pouso ou recebimento a bordo de qualquer aeronave;
- f) o lançamento, pouso ou recebimento a bordo de qualquer dispositivo militar;
- g) o embarque ou desembarque de qualquer produto, moeda ou pessoa com violação das leis e regulamentos aduaneiros, fiscais, de imigração ou sanitários do Estado costeiro;
- h) qualquer ato intencional e grave de poluição contrário à presente Convenção;
- i) qualquer atividade de pesca;
- j) a realização de atividades de investigação ou de levantamentos hidrográficos;
- k) qualquer ato destinado a perturbar quaisquer sistemas de comunicação ou quaisquer outros serviços ou instalações do Estado costeiro;
- l) qualquer outra atividade que não esteja diretamente relacionada com a passagem.
Lembre-se, ao final, que os Estados Unidos não ratificaram a Convenção Internacional sobre os Direitos do Mar.
Ademais, como informou o portal 247, o projeto que iguala crime organizado a terrorismo pode punir a economia, como aduziu aquele veículo de imprensa em 6 de novembro de 2025. Assim foi dito:
“Contudo, especialistas chamam atenção para efeitos colaterais: empresas multinacionais e instituições financeiras tendem a adotar critérios mais rigorosos em locais considerados de risco, o que poderia inibir investimentos em cidades como Rio de Janeiro e São Paulo. O coordenador do curso de Relações Internacionais do Ibmec, Renato Galeno, ressalta que “grandes empresas que atuam no mercado de petróleo, por exemplo, tomam o cuidado de destacar um pessoal específico para atuar em áreas conflagradas. Isso poderia ser um problema para esse tipo de investimento em um estado como o Rio”.
“Outro risco indicado refere-se à reputação do Brasil como destino de negócios. O professor do programa de Relações Internacionais da PUC Minas, Jorge Lasmar, observa: “No Rio, onde o CV exerce um tipo de governança criminal territorial, que cobra uma taxa de proteção de condomínios, de pequenos negócios, a lei estabelecerá que esses atores vão estar financiando terrorismo? Isso também afetaria a reputação brasileira, passando a imagem de país dominado por grupos terroristas”.
…
“Além disso, o projeto já inspira comparações com casos internacionais. A francesa Lafarge — que admitiu ter feito pagamentos a entidades ligadas ao Estado Islâmico e fechou acordo de quase US$800 milhões com o governo dos EUA — é citada como alerta. Outro caso é o da americana Chiquita Brands, multada por pagamentos a grupo paramilitar designado terrorista nos EUA. Esse tipo de precedente mostra como a equiparação pode abrir brechas para sanções estrangeiras.”
Assim o projeto criaria risco à presença de multinacionais e fragilizaria moradores de áreas dominadas por grupos armados, como concluiu aquela reportagem citada.
*É procurador da República com atuação no RN aposentado.
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