Por Ney Lopes*
O radicalismo dificulta a análise isenta da emenda constitucional, que tramita no Congresso, acerca da impressão de cédulas em papel na votação e na apuração de eleições, plebiscitos e referendos no Brasil.
Mesmo assim, seguem algumas reflexões.
A polêmica acentua-se, pelo enfático apoio dado à proposta pelo presidente Bolsonaro.
O ministro Luís Roberto Barroso, presidente do TSE, é contrário.
O principal argumento seria a falta de provas concretas, que justifiquem a revisão do atual voto eletrônico.
Causou surpresa, o PDT pronunciar-se a favor da impressão do voto.
A justificativa, certamente está no fato do líder histórico do partido, Leonel Brizola, candidato a governador do Rio de Janeiro, ter sido vítima em 1982 de manipulação de dados no sistema de “computadores” da empresa Proconsult, contratada à época pelo TRE-RJ para totalizar as votações das zonas eleitorais.
A falsificação na contagem foi descoberta pela imprensa.
No resultado final, Brizola se elegeu.
Do ponto de vista global, somente o Brasil, Bangladesh e Butão usam urna eletrônica, sem comprovante do voto impresso.
Em alguns países, o eleitor confere o voto através de um visor e depois cai automaticamente em uma urna, sem nenhuma intervenção humana.
É o caso da Índia, cujo sistema era igual ao brasileiro, mas mudou, a partir de 2019.
Nos Estados Unidos, na grande maioria dos distritos, o eleitor vota em formulário próprio, preenchendo círculos ou setas, com caneta preta.
Ao ser depositado, o voto é lido por um scanner óptico, que digitaliza.
Em certos estados americanos são usadas urnas eletrônicas, que imprimem a cédula, depositada automaticamente em uma urna, sem contato do eleitor.
No Brasil, as dúvidas sobre a segurança nascem a partir do software (programa rodado no computador).
A hipótese é que, caso adulterado, o software comprometeria todas as checagens.
O TSE argumenta, que as urnas não estando ligadas à internet é uma garantia, de que não podem ser “hackeadas”.
Técnicos discordam e admitem que o atacante vai tentar adulterar o software, antes de instalado nas urnas, ou seja, durante a gravação dos cartões de memória, ou após eles serem gravados.
Teoricamente, alguém que carrega os cartões de memória (com o software) pode fazer isso.
Ao que se saiba, nunca aconteceu, mas é possível.
A proposta em debate prevê que o eleitor, ainda dentro da cabine de votação, possa auditar o registro do seu voto.
Não haveria identificação do eleitor incluída no registro, que grava cada voto, seja digital, ou impresso.
Hoje, essa auditagem é feita de forma eletrônica, sem comprovante físico, independente do software.
Os especialistas reconhecem que nenhum sistema eletrônico é considerado totalmente seguro.
Nem o Pentágono, NASA, ou FBI são invioláveis.
O argumento contrário a mudança, também apoiado por técnicos de informática, é que durante a auditagem, ou emissão de boletim impresso da urna, poderia ser desvendada a identidade do eleitor e servir como “recibo” de compra de voto, ferindo o princípio do voto secreto.
Na discussão, de prós e contra, ponderam-se os custos do módulo impressor, urna plástica descartável para armazenamento dos votos impressos, bobinas de papel, lacres de segurança, transporte e armazenamento.
Estima-se despesa de R$ 2 bilhões de reais.
Na verdade, não se negam exemplos de erros de programação e fraudes em computadores.
Por mais que existam proteções, sempre escapa algo despercebido, que favorece os criminosos burlarem todos os bloqueios.
Porém, a opinião sobre esse polêmico tema, não poderá vincular-se ao pêndulo da radicalização entre Bolsonaro e Lula.
Uns e outros pecam por excessos, ou falsos argumentos.
Conclui-se, que não seria demasia aperfeiçoar o sistema de votação eletrônica brasileiro.
Todavia, é desproporcional considerá-lo fraudulento, ao ponto de viciar as eleições de 2022.
Até hoje funcionou regularmente, sob a fiscalização da justiça eleitoral.
Em tais condições, o aperfeiçoamento do voto eletrônico, dependerá do Congresso Nacional.
Qualquer que seja a decisão, em nada comprometerá o resultado das eleições gerais.
A arte política será capaz de construir alternativas de implantação gradual, rejeitando os anúncios apocalípticos, de que o atual voto eletrônico fraudará os resultados em 2022.
Inexistem razões para pânico.
Cabe ao internauta do artigo formar o seu juízo.
*E jornalista, ex-deputado federal, professor de direito constitucional da UFRN e advogado.
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