Por Reinaldo Azevedo
Sim, a Câmara dos Deputados tem de cassar o mandato de Eduardo Bolsonaro porque:
1: ele quebrou o decoro parlamentar. A previsão está na Constituição, e o detalhamento está no Código de Ética e Decoro Parlamentar;
2: para mandar um recado a Jair Bolsonaro. É preciso dizer a ele: “Esta Casa não tem medo de seus arreganhos autoritários”.
Não há nenhuma razão objetiva, de resto, para inferir que o jogo de radicalização estrelado pelos irmãos Carlos e Eduardo não seja combinado com o pai.
Dados os respectivos conteúdos, especular sobre um novo AI-5 é muito mais grave do que proibir a compra, por órgão federal, de um jornal em particular — a Folha — ou de ameaçar seus anunciantes privados, como fez Bolsonaro.
É mais grave porque, viesse o tal ato, a perseguição à imprensa independente seria ainda pior e mais ampla. Ocorre que, além do conteúdo, é preciso ver a estatura do cargo.
Eduardo é deputado. Em tese, ao menos, a sua interferência no governo, como líder do partido do PSL na Câmara, se dá na esfera da pressão político-partidária.
Já o pai é presidente da República e demonstra, mais uma vez, que pode usar o cargo para, na sua intenção original ao menos, punir desafetos, adversários, oponentes e, não poderia ser diferente, a imprensa livre.
Notem: Eduardo fez uma especulação, que agrediu, sim, um valor constitucional e o Código de Ética da Casa. Jair foi além: ele agiu. E pôs a força do seu cargo para tentar pressionar anunciantes.
Ora, a perseguição sistemática à imprensa livre é um dos elementos do AI-5 sonhado por Eduardo, não é mesmo?
Custa muito a um presidente que atua com esse desassombro tirânico fazer uma dobradinha com os porras-loucas da família para intimidar as instituições — a começar do próprio Congresso?
Da mesma sorte, não acredito na inocência — nem nas desculpas — do presidente no episódio doas leões machos que se acariciam depois de vencer as hienas. E, entre elas, está o Supremo.
Trata-se de uma escolha.
Fica-se com a impressão de que a família decidiu atacar para se defender. A reportagem levada ao ar na terça pelo Jorna Nacional é mera desculpa. Como resta claro, Bolsonaro já sabia que seu nome havia aparecido na investigação do caso Marielle.
A virulência da reação, no entanto, pode apontar para outros temores, ainda desconhecidos do distinto público.
A Câmara dos Deputados tem de cassar o mandato de Eduardo porque a quebra do decoro é evidente, escancarada, arreganhada. Mas também tem de fazê-lo para mandar um recado ao Palácio do Planalto: “Não ouse ir além das suas sandálias”.
É mentira! Os Bolsonaros não temem um “chilaço” no Brasil — até porque não há o menor indício de que algo parecido possa acontecer.
Tudo indica que a escalda da radicalização busca criar uma bolha para proteger a família daquilo que a deputada Joice Hassemann (PSL-SP), que é um deles, chamou de “o que fizeram no Verão passado”.
Não se trata apenas de pôr limites a Eduardo e a Carlos. É preciso pôr limites em Jair. Os limites da Constituição.
Uma das formas eloquentes de fazê-lo é cassando Eduardo, sim! Até porque ele quebrou o decoro. A punição terá um caráter didático.