Chile põe o liberalismo em xeque?

Por Hélio Schwartsman

Os protestos no Chile são uma demonstração de que as receitas econômicas liberais não funcionam? A resposta a essa questão depende dos óculos com que a visualizamos.

Para quem porta as lentes do historiador, que valorizam os feitos do passado, é difícil falar em fracasso do liberalismo. Do início dos anos 2000 até os dias de hoje, o PIB per capita chileno saltou de US$ 11,3 mil para US$ 26,3 mil, e a pobreza extrema, que atingia 36% da população, despencou para 8,6%. Na América do Sul, não encontramos outro caso de melhora assim significativa num espaço de tempo tão curto. Revoluções decerto não produzem resultados tão positivos.

O problema da visão do historiador é que as pessoas não vivem no passado. Elas estão no presente e com os olhos voltados para o futuro. E o ser humano, como já ensinava Schopenhauer, é uma máquina de desejar que não pode ser desligada. Quando ele consegue algo que queria, já está desejando o próximo item de uma lista que nunca se esgota.

No Chile, manifestantes vão às ruas contra aumento da passagem de ônibus em Santiago
No Chile, manifestantes vão às ruas contra aumento da passagem de ônibus em Santiago (Foto: Folha de S. Paulo)

Se essa é uma característica da natureza humana que nos torna eternos insatisfeitos, também é um dos motores do progresso material da humanidade. Vez por outra, desemboca em protestos como os do Chile. É preciso cuidado, porém, para não superestimar o poder explicativo da desigualdade. Ela, afinal, como os Andes, domina desde sempre a paisagem chilena. Por que só agora gerou a rebelião? O fenômeno é, no mínimo, mais complexo do que se imagina. Tem mais a ver com a quebra de expectativas do que com os níveis brutos de desigualdade.

A missão do bom político é fazer a ponte entre o passado e o futuro. Ele precisa satisfazer o insaciável apetite da população, alimentando-o com objetivos realistas, sem destruir as estruturas que se mostraram úteis para gerar riqueza, ainda que pouco eficazes para distribuí-la. Vamos descobrir nas próximas semanas se Sebastián Piñera está à altura do desafio.

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Canal Bruno Barreto