A governadora Fátima Bezerra (PT) caiu na tarde desta quarta-feira em uma verdadeira emboscada política ao participar de uma audiência de conciliação com o prefeito de Natal Álvaro Dias (PSDB), que nem deveria existir.
Por que audiência não deveria ocorrer? Simples! A jurisprudência imposta pelo Supremo Tribunal Federal (STF) é a de que em caso de decretos conflitantes com medidas de restrição social prevalece o que for mais duro.
Na sexta-feira Fátima assinou decreto ampliando o toque de recolher para o período entre 20h e 6h e sua aplicação integral aos domingos. Ela seguiu, inclusive, orientação do Comitê Científico e dos Ministérios Públicos Estadual, Federal e do Trabalho.
Mais claro impossível de que essa audiência não deveria nem ter acontecido? Não havia o que conciliar.
Mas o caso não para por aí. Durante toda audiência o desembargador Dilermando Mota se alterou e chegou gritar com a governadora Fátima Bezerra (PT) quando ela tentava justificar o próprio decreto.
O magistrado não aceitou que houvesse discussão jurídica sobre os decretos, ignorou argumentos científicos e passou toda audiência tentando forçar a governadora a ceder no que não cabia a ela ceder.
Dilermando chegou a pregar a existência de um decreto de referência para todo o Estado como se o assinado pela governadora não o fosse.
Ele também atentou contra a paridade de armas, regra básica no meio jurídico. Ele não interrompeu o promotor Wendel Beetoven que fez questionamentos jurídicos sobre o toque de recolher.
Quando o procurador-geral do Estado Luiz Antônio Marinho tentou falar com argumentos jurídicos foi interrompido com a alegação de que a audiência não seria para isso. Luiz insistiu e após ouvir uma reprimenda pode falar sobre a jurisprudência que sustenta o toque de recolher no contexto da pandemia.
Aí me pergunto: só um lado poderia usar argumentos jurídicos?
Na proporção em que foi diversas vezes grosseiro com a governadora, ele foi cortês com Álvaro Dias. Nas falas de Dilermando a governadora era intransigente e o tucano o suprassumo da postura democrática.
Nem parece que Álvaro, que provocara a situação ao assinar decreto descumprindo a jurisprudência do STF, boicotou reunião com prefeitos e ignorou contatos telefônicos da governadora.
Álvaro insistiu em manter o fechamento dos estabelecimentos a partir das 21h, cedendo apenas em relação ao toque de recolher.
Dilermando abraçou a tese de Álvaro como se fosse um grande avanço. Chegou a disparar uma frase que coloca em xeque sua imparcialidade para julgar o caso: “A responsabilidade do prefeito EU CONHEÇO. A responsabilidade da governadora ELA conhece melhor do que eu“.
Dilermando em várias falas agiu como poucos deputados estaduais de oposição já agiram em relação a governadora.
No final ficou a sensação de que a audiência que, repito, nem deveria ter ocorrido, foi uma emboscada política para a governadora servindo de palanque para Àlvaro Dias fazer proselitismo de sua gestão e defender o seu decreto sem ser incomodado pelo conciliador.
Tudo num contexto de uma semana em que Álvaro virou chacota nacional pelo seu negacionismo e vinha sendo bastante criticado nas redes sociais, Ficou uma forte sensação de que toda essa história foi desenhada para lhe dar uma saída honrosa porque seu decreto não se sustenta juridicamente.