Por Raphael Di Cunto e Carolina Linhares
Folhapress
O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), decidiu pautar nesta terça-feira (9) a proposta que reduz as penas das pessoas condenadas pelo Supremo Tribunal Federal pela participação nos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023. A versão apresentada pelo relator, deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), diminui os anos de prisão dos condenados, mas não extingue penas nem anula condenações.
A decisão foi negociada com deputados do Centrão e bolsonaristas, e pegou o governo e a base governista de surpresa.
“A Proposta de Lei da Dosimetria rompe com todo o processo de afirmação da democracia, que já havia sido duramente ameaçada pela tentativa de golpe de Estado”, escreveu em postagem no X o líder do governo na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE). “O Brasil defende o pleno Estado Democrático de Direito, e a pesquisa Quaest de 06 de janeiro de 2025 deixa evidente que 86% dos brasileiros reprovam a tentativa de golpe. No dia 8 de janeiro de 2023, os chefes dos três poderes da República desceram a rampa do Planalto unidos na defesa da democracia. Colocar a dosimetria em pauta é um erro histórico que atenta contra o Estado Democrático de Direito”.
Lindbergh Farias, líder do PT na Casa, classificou de “escândalo” a decisão do presidente da Câmara.
“Motta cede à chantagem de Flávio Bolsonaro e acena com uma mudança penal sob medida justamente no momento em que o Brasil, pela primeira vez, responsabiliza generais, golpistas e um ex-presidente que atentou contra a democracia. A proposta é inconstitucional porque a lei penal não pode ser produzida para beneficiar um indivíduo ou um grupo determinado, sob pena de violar seu caráter geral e abstrato. Além disso, representa grave afronta à separação dos poderes, por interferir de forma indevida em julgamentos ainda em curso no STF”.
A ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, foi otra que reclamou.
“É muito grave este retrocesso na sequência de um julgamento histórico, que pela primeira vez condenou os chefes de um atentado contra a democracia, incluindo um ex-presidende e oficiais generais. O projeto contraria uma decisão em que o STF e o Brasil mostraram independência e soberania, além de fragilizar a legislação que protege a democracia contra tentativas futuras de golpe”, publicou no X.
O deputado federal Chico Alencar (PSOL-RJ) também criticou a decisão. “Motta diz que ‘não foi pressão de ninguém, mas uma decisão dele próprio’. Alguém acredita nisso? Os golpistas que ocuparam a cadeira da presidência ganharam mais esse presentão de Natal! Não passarão!”, escreveu, em postagem no X.
O texto concede tratamento mais benéfico aos participantes que não tiveram poder de mando nem participaram do financiamento dos atos antidemocráticos.
O projeto original concedia anistia a todos os envolvidos direta ou indiretamente em manifestações ocorridas desde o segundo turno das eleições de 2022.
Para tentar fazer de conta que está tratando governo e oposição com igualdade, Motta informou que se reuniu com a equipe econômica do governo, entre eles o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para organizar as matérias de interesse do Poder Executivo para fechar o Orçamento do próximo ano.
O Projeto de Lei Complementar (PLP) 125/22, que cria o Código de Defesa do Contribuinte, deve ser votado ainda hoje. Um dos principais focos do texto está nos chamados devedores contumazes — empresas que usam a inadimplência fiscal como estratégia de negócio e deixam de pagar tributos de forma reiterada e sem justificativa. O texto já foi votado no Senado e está em análise na Câmara.
O presidente também anunciou que pretende votar ainda hoje o texto que regulamenta o comitê gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (PLP 108/24).
Outra proposta que pode ser votada ainda esta semana ou na próxima é o que revisa os benefícios fiscais concedidos pelo governo federal. “É uma matéria também que interessa muito. Essa é a matéria, acredito eu, que mais interessa à equipe econômica para fechar o Orçamento – trata dessa redução desses benefícios fiscais, que é uma matéria que nós também devemos apreciar, quem sabe, nesta semana ou até o início da próxima semana”, afirmou.
