O impacto da Covid-19 nas decisões dos gestores públicos

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Por Gutemberg Dias*

Não vejo muitos gestores públicos preparados para conviver com tomadas de decisões que possam sacrificar seu prestígio político com certas comadas da sociedade em detrimento de ações mais duras de combate a Covid-19. São vários exemplos pelo Brasil, começando pelo presidente Jair Bolsonaro, obviamente esse último foge a qualquer racionalidade e, até compará-lo com alguns gestores estaduais e municipais é uma tarefa difícil.

Mas, vamos lá. Os políticos tradicionais e até mesmo alguns que aparentemente se vendem como paladinos da nova política, não tem estrutura psicológica para tomar decisões em crises que possam impactar sua imagem perante certos grupos, como por exemplo, evangélicos e empresários.

Se olharmos para a grande maioria dos políticos do nosso sofrido Rio Grande do Norte, a partir da análise de suas redes sociais, não vemos palavras mais enfáticas sobre temas como a manutenção do fechamento dos templos religiosos e o comércio. Na maioria das vezes, suas falas são em tom superficial, apenas para não ficarem à margem da problemática discutida, por vezes, pelos seus próprios eleitores. É bom frisar que essa visão vai de chefes de executivos, a parlamentares de todos os níveis.

Se observarmos as decisões tomadas por alguns prefeitos, em especial a prefeita de Mossoró e, também, a governadora do estado, ambas mulheres de fibra e garra, mas que ante a pressão empresarial tomaram medidas de afrouxamento do isolamento social que já causam aglomerações nos principais núcleos urbanos. Sei que ambas dizem que tomaram a decisão de acordo com assessoramento de equipes técnicas. Não tenho dúvida dessa verdade, mas não deixa de ser uma forma de tomar decisões se escondendo por trás de um véu.

As escolhas para quem é gestor nunca é fácil. Administrei diretamente uma empresa durante 18 anos e sei que muitas vezes tive que tomar decisões que contrariavam meus ideários políticos. Não nego que algumas vezes tergiversei, mas sabia que estava fazendo algo que seria prejudicial a minha organização. Vocês podem dizer, no privado é tudo mais fácil. E certamente é, mas os modelos de gestão são aplicados ao privado e público, obviamente, em escalas diferentes.

Quando tratamos do público e, sobretudo, do cuidado com as pessoas, a decisão de um gestor tem sua importância quintuplicada. Estamos falando, muitas das vezes, de salvar vidas, ou dito de outra forma, impedir que pessoas morram. AÍ é que entra a coragem do político, pois para garantir o direito a vida, e a Covid-19 está mostrando, o gestor terá que decidir entre cuidar efetivamente do ser humano ou agradar a grupos organizados da sociedade.

Talvez, seja mais fácil para mim, que estou despido de um cargo na gestão pública, dizer que o certo é enfrentar as adversidades e trabalhar para salvar vidas. Talvez se estivesse no lugar deles até pudesse ver de forma diferente, mas tenho a convicção que não se negocia vida com seu ninguém, principalmente, com o capital.

A maioria dos gestores resolveram liberar as atividades econômicas no momento que se observa o aumento dos casos e óbitos. Já temos mais de 500 pessoas morrendo oficialmente por Covid-19 no Brasil e estudos dizem que a subnotificação é mais de 10x os casos já diagnosticados. Trazendo para Mossoró, já temos 15 óbitos e mais de 170 casos confirmados com taxa de letalidade maior que a média do Brasil.

Diante dos números os gestores precisarão rever seus decretos? Eu acredito que sim. Haja vista que as ruas estão cheias e as determinações para uso de máscaras não são acatadas por todos. O resultado certamente virá após 12 ou 15 dias e aí, a decisão que poderia ser tomada hoje terá que ser inexoravelmente tomada nos próximos dias. Porém, com um agravante, muitos já terão sucumbido a Covid-19.

Temos que usar como exemplos cidades como o Manaus, São Paulo, Rio de Janeiro e São Luiz que já enfrentam colapso na rede atendimento a saúde. Aqui não será diferente se as medidas se mantiverem no campo das amenidades. Para mim ou é ou não é! Um outro exemplo, só que positivo, a ser seguido é o da Bélgica, que trata todos os casos de morte por insuficiência respiratória como casos de Covid-19, assim eles conseguem trabalhar mais próximos da realidade do acometimento da doença e estruturar ações em saúde com maior eficácia.

É isso, minha gente. Esse momento é muito complicado para todos nós. Por enquanto não existe outro remédio ou tratamento que não seja se manter longe de aglomerações e em isolamento social no que for possível. Que nossos gestores tomem as melhores decisões para resguardar o povo dessa terrível pandemia.

*É professor do Departamento de Geografia da UERN, empresário e ex-candidato a prefeito de Mossoró.

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Reportagem especial

Canal Bruno Barreto