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Editorial: não é hora para neutralidade

Neutralidade na política e no jornalismo nunca foram virtudes, no máximo um escudo dos covardes para ficar ao lado dos mais fortes e dos que detém o poder econômico. O certo é ser justo e a justiça deve estar do lado de quem tem razão.

O no contexto atual a razão é preservar a democracia liberal, que é o melhor modelo que existe para se fazer uma nação mais justa. A democracia liberal consolidada no Brasil a partir da Constituição de 1988 permitiu aos brasileiros a estabilidade econômica com o Plano Real, avanços na saúde com o SUS, acesso a educação universalizada, programas sociais que tiraram o país do mapa da fome e a condição de pleno emprego.

O Brasil nunca foi um mar de rosas, nem muito menos politicamente pacífico. Nosso país desde a sua fundação é marcado pela violência política que ora avança, ora recua. A nossa democracia liberal é imperfeita e precisa estar em constante aperfeiçoamento, mas com ela é bem melhor do que nas ditaduras do passado.

Na nossa cultura política há uma falsa sensação de superioridade dos que se julgam neutros e imparciais, sobretudo entre os que militam na imprensa.

Mentem para si.

Não existe imparcialidade na imprensa. Não neutralidade existe na política. Existe um centro que pendula entre os lados na democracia, que escolhe um lado a depender das circunstâncias e isso é legítimo. Essas pessoas votam no que é melhor para si assim como os que são mais engajados politicamente agem.

No Brasil de outubro de 2022 o que está em jogo é muito maior do que nossas vaidades. Temos em risco a democracia. Quem já leu “Como as Democracias Morrem”, “Como as Democracias Chegam ao Fim” e “O Povo Contra a Democracia” sabe que, infelizmente, os valores democráticos não são consensuais na sociedade.

No Brasil pós-2013, o bolsonarismo emergiu como força política que aglutinou o que há de pior em termos de visão de mundo e sociedade. É uma corrente de pensamento (se é que podemos chamar assim) que combate a ciência, os valores civilizatórios e a democracia.

A polarização que já foi liberais x conservadores, PTB x UDN e PT x PSDB agora voltou a um estágio primitivo entre civilização x barbárie. Não é mais esquerda x direita, mas o direito de amar quem quiser, de comer, vestir, ter lazer, trabalhar… respirar o ar puro da liberdade.

Muita gente duvidou e segue duvidando das intenções autoritárias de Bolsonaro por mais que ele deixe tudo bem claro. Ao longo de quatro anos ele minou as instituições. Ignorou a lista tríplice da Procuradoria-Geral da República, colocando Augusto Aras que mais serve como um advogado de defesa quando deveria fiscalizar o presidente. Colocou dois ministros subservientes no STF. Ele nem disfarça ao dizer que tem 20% da corte. Com o orçamento secreto, que simplesmente institucionalizou a corrupção no país, ele controlou o Congresso Nacional.

Bolsonaro conseguiu acuar o STF aprovando PECs ilegais para reduzir artificialmente a alta dos combustíveis e pagar auxílios escancaradamente eleitoreiros. O judiciário, em outros tempos, teria aplicado a lei. Mas hoje se vê intimidado.

Nada disso é por acaso.

Em 2023, o presidente escolhido no dia 30 vai indicar mais dois ministros. Bolsonaro ainda não terá maioria na corte. A solução autoritária será aumentar para 15 a quantidade de ministros e antes mesmo da eleição ele e seus aliados falam abertamente sobre o assunto.

Com maioria no STF qualquer absurdo será considerado constitucional e será a ruína da nossa democracia.

Foi assim que Hugo Chávez acabou com a democracia na Venezuela. Foi assim que Viktor Orbán acabou com a democracia na Hungria. A receita da destruição democracia está sendo aplicada e não há como fingir que nada de grave ocorre no país.

Escolher assistir tudo isso posando de neutro ou imparcial para alimentar o próprio ego (como se isso fosse virtude) é fazer o jogo de quem quer minar as liberdades individuais no país. É hora de tomar posição, deixar o ódio ao PT de lado por um tempo e na solidão da cabine eleitoral votar em Lula que é a única alternativa para em 2026 ter a certeza de que se tudo der errado nos próximos quatro anos teremos uma nova oportunidade para mudar novamente.

Não existe imparcialidade e neutralidade ainda mais quando é a democracia que está em jogo.

A escolha nunca foi tão fácil!