Por Rodrigo Casarin
A notícia: a Secretaria de Educação de Rondônia preparou um documento apontando mais de 40 livros que deveriam ser retirados das bibliotecas de escolas púbicas da cidade porque seriam impróprias para os jovens. No índex, títulos como “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, de Machado de Assis”, “Poemas Escolhidos”, de Ferreira Gullar, e “O Castelo”, de Franz Kafka. O governo estadual negou. Professores disseram que já tinham sim recolhido alguns volumes. A caça aos autores existiu. Deu-se o imbróglio e, aparentemente, os censores voltaram atrás. O governador de Rondônia é Marcos Rocha, do PSL, adorador de Bolsonaro.
Escrever o quê? Que a arte está sendo perseguida? Bato nessa tecla há três anos. Que a censura já encontrou seu caminho para vigorar no país? Também não é novidade por aqui. Que é um absurdo tudo isso que está acontecendo? E quem se importa, além de um milhão ou outro num país com mais de 200 milhões? É tanto descalabro para tudo que é lado que anda difícil ser minimamente original.
Mas fui dormir com a seguinte pergunta: o que leva alguém a se sentir à vontade para censurar até os clássicos? O que leva um governante a achar razoável dizer para os colegas: “Vamos banir uns livros aí? Um nome ou outro só. Mário de Andrade, Ferreira Gullar, Carlos Heitor Cony, Rubem Fonseca – este é bem perigoso, tem que dar fim em quase tudo que encontrar dele -, Euclides da Cunha… Tem também uns nomes estranhos, Kafta, Kafka, sei lá, Allan Poe… Vamos banir. Ah, e o Machado. Tira o Machado das estantes, parece que ele era comunista”. Daí o outro tosco retruca: “Pô, que boa ideia. Vamos fazer isso sim, talquei?”
Bem, andam se sentido confortável principalmente porque a imensa maioria das pessoas não está nem aí para nada que vá além do próprio umbigo. E o próprio umbigo é: “Isso vai mudar meu dia? Não? Então dane-se. E daí que não pode mais estudante ler livro de defunto autor? Nem sabia que morto escrevia”. No boteco da esquina, ninguém dá a menor bola para o que está acontecendo. Há inúmeras razões para isso, claro, mas a consequência está aí: o povo paralisado enquanto o Brasil toma um caminho assustador. E mesmo os que se importam, os que de alguma forma reagem, dificilmente levantam a bunda para tal: é resistência pela internet ou nada.
Dessa vez voltaram atrás. Na próxima – que virá –, talvez não voltem. Vamos tuitar que tudo é um grande absurdo, que o Brasil está perdido. Até que alguém proponha, e talvez emplaque, algo ainda mais estúpido.