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Mercado e humanidade: quem deve ter prioridade se fosse escolhido?

Por Tales Augusto*

Só existe economia com pessoas, a humanidade precedeu a economia, isto desde a pré-História, fora que para a sobrevivência, havia a divisão entre os grupos.

Passados mais de 3.000.000 anos e pouco mais de 100.000 anos quando do surgimento do homo sapiens sapiens, tivemos a transição da Pré-História para a História e com isto, surgiu o Estado. A canção Luta de Classes do Cidade Negra nos diz que “do antigo Egito à Grécia e Roma, da Europa feudal, do mundo colonial, do mundo industrial, na Rússia stanilista e Wall Street, em Cuba comunista, E no Brasil? E no Brasil, hein?”. Ou seja, desde o surgimento do Estado, este teve uma peculiaridade, a exploração humana na maioria das vezes e até a busca de sua extinção de certa forma.

A Quebra da Bolsa de New York e o pós-Segunda Guerra fizeram emergir o Estado do Bem Estar Social em muitas nações, até nos EUA a ideia do intervencionismo a partir de Keynes fora adotado.

Eric Hobsbawn escrevera as Eras, livros maravilhosos e o último, a Era dos Extremos é encerrado pelo fim da URSS. E a análise da Lilia Schwarcz acerca do coronavírus é primorosa do fim do século passado e início do século XXI, ela afirma que “essa nossa pandemia marca o final do século 20, que foi o século da tecnologia. Nós tivemos um grande desenvolvimento tecnológico, mas agora a pandemia mostra esses limites. É impressionante como um uma coisinha tão pequena, minúscula, invisível, tenha capacidade de paralisar o planeta. É uma experiência impressionante de assistir. Eu estava dando aula em Princeton [universidade nos EUA], e foi muito impressionante ver como as instituições foram fechando. É uma coisa que só se conhecia do passado, ou de distopias, era mais uma fantasia”.

Passado mais de setenta anos do fim da maior guerra e encerrando a segunda década do século XXI, assim como numa guerra, temos dilemas e dentre eles no brasil está a defesa de alguns do retorno e a abertura de muitas áreas, há quem defenda a abertura do comércio. Onde as “buchas de canhão” vão para o front caso haja a abertura do comércio.

Sabemos que os pequenos e principalmente os micro empresários podem quebrar, a ajuda dos 600 reais é ridícula. Todo Estado que preza pelo seu maior, seu povo, deve ACIMA DE TUDO o valorizar e dar suporte para que possa até ficar mal, porém que não morra. O ente maior da federação é o governo federal, que arque com o peso e este não será perpétuo, há tempos que precisamos de um novo pacto federativo, tivemos parlamentares/políticos que há décadas estão no exercício de cargos eletivos e nunca propuseram que municípios, estados, distrito federal e governo federal tivessem melhores condições. Com exceção do governo federal, os demais sofrerão para não quebrarem e uma rede ligada a estados e municípios mensalmente sobrevivem com pires nas mãos através dos fundos de participação dos estados e municípios.

A Alemanha, a França, o Reino Unido e até os EUA (o país mais capitalista do mundo) estão agindo a favor da massa dos cidadãos, das grandes, pequenas, médias e micro empresas. Um governo jamais deve abandonar seu povo! Podem até dizer, é fácil você falar, está em casa, sem aulas, servidor público. Mas se engana que eu e tantos que estão em casa não sofram por mortes, desemprego, fome, não vivemos isolados, somos holísticos, a dor do outro nos dói, ajudamos como podemos. De acordo com o DIEESE, o salário mínimo em dezembro deveria ter o valor de R$ 4.342,57, muitos irão dizer que seria impossível. Na verdade não é, achamos que juízes ganham muito, na verdade nós que ganhamos pouco, quase nada. Na Dinamarca por exemplo, um pedreiro ganha cerca de 18 mil euros e um deputado 23 mil euros, aas disparidades são menores.

Quando do anúncio dos 600 até 1.200 reais por família, pensei, “não seria a hora de temos um governo mais atuante a favor dos que mais precisam? Além de calar todos aqueles que criticam o presidente Bolsonaro, este agindo com certeza seria alçado ao panteão que o mundo hoje valoriza dos estadistas que encaram a pandemia e escolheram o povo sem abandonar a economia?”. Infelizmente não é isso que vemos e mais, há por parte dele por vezes culpar os outros governantes no país, o judiciário e ainda todos que adotam a racionalidade da ciência.

Não condeno o pequeno comerciante que abre seu estabelecimento, vai a rua, pois só estão indo devido à ineficiência dum Estado que parece ter escolhido a economia ao invés dos seus cidadãos. Países arrasados por guerras como Alemanha e Japão se refizeram e se reerguerão, a Ângela Merkel é um exemplo de estadista nesta pandemia.

Que nestas crises da COVID-19 e econômica nos reinventemos enquanto Estado e a própria forma de governo e o tratamento para com seus cidadãos. Sem estes não haverá nada, menos ainda economia.

*É professor e historiador.

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Pandemia e isolamento social: para além da dualidade neoliberal

Antes de jantar, Trump elogia Bolsonaro mas não se compromete ...
Trump recuou no desdém ao coronavírus. Bolsonaro não (Foto: JIM WATSON / AFP)

Por Rosivaldo Toscano Jr.*

Para quem pensa preso ao paradigma neoliberal, só existem dois caminhos no momento: a) ficar em quarentena e sem dinheiro; b) abrir as lojas e ir trabalhar. Resta muito claro que a “mão invisível” do mercado não vai reverter os efeitos – que são globais – dessa pandemia. Mas poderá muito bem agravá-los porque sem o isolamento social teremos aqui uma Itália múltiplas vezes aumentada. Vai morrer gente de todas as idades e não só de coronavírus, como na Itália e na Espanha. Basta ter uma apendicite, uma fratura que exija cirurgia ou qualquer procedimento que necessite de respiração mecânica.
Talvez devêssemos olhar o exemplo dos Estados Unidos, meca do discurso neoliberal: pacote de injeção na economia da ordem de dois trilhões de dólares! O governo dos EUA pagará renda mensal às pessoas para que não passem fome e/ou se desesperem e para que consumam, e empréstimos a fundo perdido para as empresas não falirem. No mais, determinação de isolamento social enquanto necessário. Donald Trump é pragmático: rasgou sem cerimônia os postulados neoliberais nesse momento porque não lhe são convenientes. Milton Friedman, descanse em paz.
Espero estar muito errado na minha avaliação, mas acho que o problema aqui é mais grave porque o atual ministro da economia parece ser monocular. Para usar um linguajar de economia política, é um Chicago Boy. Ele repete o mantra neoliberal há décadas e acho que dificilmente terá um novo olhar – um que contrarie frontalmente tudo que apreendeu e repetiu. As medidas paliativas apresentadas até o momento são sintomáticas disso. Mas ainda torço que mude de opinião, que apresente um pacote de intervenção direta na renda das pessoas e na solidez das empresas. Meta fiscal? Trump já chutou o pau da barraca. Merkel fará o mesmo. Macron etc., todos irão a reboque.
O discurso de superávit fiscal vai cair por todo o mundo porque será impossível qualquer país, após essa pandemia, não ter gastos exorbitantes para evitar uma catástrofe interna. Essa pandemia vai mudar o paradigma econômico. Aliás, como como falei acima, já está mudando.
Se pensarmos somente dentro da ótica neoliberal, teremos uma convulsão social de todo jeito. É hora de (re)abrir os livros de John Maynard Keynes. Foi assim que se superou a grande depressão dos anos 1930. Trump, que não é bobo, já o fez.