Por Fernando Alves*
Quem acreditava há um mês atrás em um cenário morno, com poucas novidades na política potiguar e do Nordeste, deve ter se surpreendido com o resultado das eleições de ontem, no primeiro turno, para prefeito em Natal.
Na verdade, a passagem para o segundo turno de Paulinho Freire, da União Brasil e da candidata do PT, Natália Bonavides, não é tão novidade em relação às tendências ou à curva de ascendência que já se comprovava nas pesquisas anteriores, realizadas por diversos institutos.
Como era de se esperar, com juventude e muito carisma, a candidata do PT transformou uma brisa em furacão ao ascender nas pesquisas na semana anterior ao pleito e ter figurado, até mesmo, em primeiro lugar em uma delas.
Porém, o que mais surpreende é a derrota fragorosa de um franco favorito no começo de todas as sondagens: o ex-prefeito Carlos Eduardo, que, representando a oligarquia e mesmo tentando esconder o sobrenome, marca com a sua derrota no primeiro turno, mais um revés e talvez o último suspiro para as famílias tradicionais da política, que, durante décadas ou quase meio século, dominaram o RN.
Não foram suficientes três mandatos de prefeito, nem mesmo o apoio dos meios de comunicação, uma vez que o candidato do PSD é sócio e proprietário de um dos maiores veículos de comunicação do Estado e do Jornal Tribuna do Norte. Parecia que Carlos Eduardo estava a nadar de braçada de volta ao Palácio Felipe Camarão, após ter sido derrotado para o Senado, com o apoio da governadora Fátima Bezerra, por Rogério Marinho, nas eleições de 2022.
Mas não foi isso que aconteceu. O autointitulado “Cabeção”, acabou perdendo a eleição no primeiro turno para uma deputada e ex-vereadora em franca ascensão na política (nacional, não apenas potiguar), e que vem marcando uma sucessão de sucessos em suas empreitadas políticas, seja por ter se elegido uma das mais votadas para a vereadora em 2016, como uma das mais votadas para a deputada, tanto em 2018 como em 2022, e agora chegando ao difícil segundo turno da eleição na capital potiguar.
Tido outrora, como alguém que tinha um teto de votos imbatível, na verdade Carlos Eduardo mostrou que o seu teto era de vidro. Teto esse que anteriormente calculado em 30% acabou não se sustentando entre os 20 a 21%, que garantiram assim a subida da deputada federal do PT e também a ascensão do candidato hoje da nova direita, chamado Paulinho Freire.
Paulinho é velho conhecido da política potiguar, uma vez que foi sucessivamente, na década de 1990, vereador e presidente da Câmara Municipal. É também um dos proprietários da produtora Destaque, empresa que praticamente criou o Carnatal, uma das maiores micaretas do país. Mas Paulinho surge como novidade este ano, apesar de não ser nada novo, pela sua guinada ideológica, uma vez que um candidato que outrora se mantinha em cima do muro e procurava ter uma postura mais moderada, parece ter abraçado de vez o bolsonarismo, com sua retórica extremamente reacionária, sobretudo manifestando racismo religioso denunciado em sua propaganda eleitoral, uma vez que um de seus vídeo de campanha chegou a debochar com canções de religiões de matriz africana. O candidato mais votado do primeiro turno agora se consolida como a real opção da extrema-direita na capital potiguar.
É importante recordar que Paulinho também já foi vice-prefeito de Natal, na desastrosa gestão da ex-prefeita do Partido Verde, Micarla de Souza, revelada uma das piores da história da capital, em termos de má gestão, de descalabro administrativo e financeiro.
Paulinho sabe que lucra com a polarização, polarização essa que se foi rasa no primeiro turno será proeminente em todo o Brasil no segundo turno, uma vez que tanto Lula quanto Bolsonaro apostam suas fichas na polarização das eleições municipais, especialmente nas capitais no segundo turno. Nesse sentido, Paulinho soa como a opção para o voto bolsonarista, radicalizando cada vez mais o seu discurso, falando cada vez mais em Deus, família e tradição, bem como em pátria e pautas moralizadoras. Paulinho parece desenvolver, calculadamente, cada vez mais um discurso que parece música para os ouvidos reacionários do eleitorado do capitão inelegível.
Paulinho Freire surge, portanto, como a alternativa do eleitorado conservador quer o mais do mesmo, pois parte da população quer, lucra ou se acomoda com a manutenção das desigualdades. Ora, para um segmento elitista e provinciano que não está nem aí para o desenvolvimento, a modernidade ou transformação social, defender uma mudança real de gestão na cidade seria tão somente “papo de comunista”.
A deputada federal e candidata, Natália Bonavides, tem então um desafio colossal, imenso, que não foi sequer obtido pela atual governadora Fátima, quando, em 1996, por uma pequena diferença de votos, quase conseguiu-se eleger prefeita de Natal. Dessa vez, Natália, uma política jovem, experiente e carismática, representando uma nova geração de políticos, habituados com as redes sociais, terá dificuldade grande de conseguir obter o fato histórico de fazer com que o Partido dos Trabalhadores consiga, pela primeira vez em sua história, ganhar a eleição na capital.
São pouquíssimos dias para a eleição e a conclusão de uma campanha no segundo turno sempre tem sobressaltos, uma vez que a data já se aproxima no último domingo de outubro. Mas serão, sim, dias eletrizantes, com muita militância, muita panfletagem, muitas carreatas, muita mobilização nas ruas e também muito conflito ideológico e talvez até mesmo conflito de classes que deve se estabelecer em Natal nos próximos dias, em um cenário imprevisível, que somente irá se definir no final do mês.
Que o final desse processo eleitoral na terra de Câmara Cascudo e Newton Navarro possa, finalmente, no Rio Grande do Norte, e em especial, em Natal, saber quem será a grande novidade na prefeitura ao final do mês: se com a esquerda renovada de Natália ou com a direita recauchutada de Paulinho Freire.
*É delegado e já disputou vaga de deputado federal pelo PT.
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