Por Rogério Tadeu Romano*
Trago o que disse o jornal Estado de São Paulo, em seu editorial, em 9.12.25:
“A revelação de que o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), viajou em jatinho privado com Augusto de Arruda Botelho – advogado de um dos implicados na suspeita de fraude envolvendo o Banco Master – para assistir à final da Libertadores, em Lima, não é menos escandalosa pelo fato de, no momento do embarque, o ministro, em tese, não saber que seria sorteado relator do caso no STF. Mesmo antes do sorteio, a prudência já impunha a Toffoli a compostura esperada de um ministro da mais alta Corte do País, evitando situações que pudessem suscitar dúvidas sobre sua independência.
É legítimo questionar, portanto, por que Toffoli não custeou com recursos próprios uma viagem de caráter pessoal para assistir a um jogo de futebol, optando por aceitar carona num avião de um empresário junto com um advogado diretamente interessado no desfecho de um processo que poderia ficar sob sua alçada – como ficou. Ao se deixar envolver nessa mixórdia, Toffoli sinaliza, em primeiro lugar, que não se importa com o escrutínio público. Ademais, autoriza que a sociedade veja com suspeita quaisquer decisões que ele tome envolvendo o Banco Master, seu controlador, Daniel Vorcaro, e Luiz Antonio Bull, executivo do banco representado pelo sr. Botelho.”
A matéria merece reflexão sob o aspecto ético, diante do que disciplinam o Código de Ética da Magistratura Nacional, a Lei Orgânica da Magistratura e, acima de tudo, a Constituição.
Haveria um ferimento a uma norma ética para o caso?
Ensinou-nos Paulino Ignácio Jacques (Curso de Introdução à Ciência do Direito, 2ª edição, pág. 73) que norma é sinônimo de regra, preceito, dispositivo, em suma, de lei.
Há dois tipos de normas – a ética e a técnica. A primeira regula a conduta do homem no convívio, e a segunda, a sua atividade criadora. A norma ética compreende a norma moral e a jurídica. Aquela regula o mundo interior, e esta o mundo exterior, com relação às ações humanas.
A norma ética constitui, como nos disse Paulino Jacques, um “imperativo categórico” Kantiano, porque a sua violação acarreta penalidade. A sanção moral nos leva ao arrependimento, o remorso.
A ética é a racionalização da moral.
O Código de Ética da Magistratura Nacional, aprovado na 68ª Seção do Conselho Nacional de Justiça determina:
Art. 15. A integridade de conduta do magistrado fora do âmbito estrito da atividade jurisdicional contribui para uma fundada confiança dos cidadãos na judicatura. Art. 16. O magistrado deve comportar-se na vida privada de modo a dignificar a função, cônscio de que o exercício da atividade jurisdicional impõe restrições e exigências pessoais distintas das acometidas aos cidadãos em geral. Art. 17.É dever do magistrado recusar benefícios ou vantagens de ente público, de empresa privada ou de pessoa física que possam comprometer sua independência funcional. Art. 18. Ao magistrado é vedado usar para fins privados, sem autorização, os bens públicos ou os meios disponibilizados para o exercício de suas funções. Art. 19. Cumpre ao magistrado adotar as medidas necessárias para evitar que possa surgir qualquer dúvida razoável sobre a legitimidade de suas receitas e de sua situação econômico-patrimonial.
Por sua vez, a Lei Orgânica da Magistratura (LOMAN) determina:
Art. 107. São deveres do magistrado: I – manter conduta ilibada na vida pública e particular; II – zelar pelo prestígio da Justiça e pela dignidade da função; III – praticar os atos de ofício, cumprir e fazer cumprir as disposições legais, com independência, serenidade e exatidão; IV – comparecer pontualmente à hora de iniciar-se a audiência ou sessão e não se ausentar injustificadamente antes de seu término; V – não exceder, sem justo motivo, os prazos para decidir ou despachar, a fim de assegurar a razoável duração dos processos; VI – determinar as providências necessárias para que os atos processuais se realizem nos prazos legais, observada a estrutura judiciária e os recursos humanos e materiais disponíveis; VII – não manifestar opinião ou juízo depreciativo sobre processos em curso, votos ou decisões de órgãos judiciais, bem assim quanto à atuação dos demais Poderes de Estado ou de partidos políticos, inclusive de seus integrantes, ressalvadas a crítica científica e a relativa ao exercício do magistério; VIII – exercer permanente fiscalização sobre os servidores subordinados; IX – tratar com urbanidade as partes, os membros do Ministério Público, os advogados, as testemunhas, os funcionários e auxiliares da Justiça, bem como atender aos que o procurarem, mediante prévio agendamento, ressalvadas as situações de urgência; X – residir na sede de sua jurisdição, na mesma zona metropolitana ou em localidade contígua, salvo autorização do respectivo tribunal; XI – cuidar para que as nomeações de peritos e de outros auxiliares não servidores do Poder Judiciário recaiam em profissionais idôneos, com boa qualificação técnica, sem vínculo de parentesco sanguíneo, por afinidade ou civil, inclusive por união estável ou concubinato, com o próprio juiz ou outra pessoa de qualquer modo ligada à causa, até o terceiro grau, observadas, ainda, as regras expedidas pela Corregedoria Geral, pelo tribunal ou pelo Conselho Nacional de Justiça; XII – coibir o abuso de direito processual e a litigância de má-fé; XIII – exercer fiscalização sobre cobrança de custas, emolumentos e despesas processuais; XIV – dedicar-se à Magistratura, sendo-lhe vedada a participação na direção de sociedades com fins lucrativos e associações, salvo daquelas conexas à atividade da carreira, e facultado o exercício do magistério.
A Constituição Federal estabelece vedações aos juízes com o fim de garantir sua imparcialidade, afastando-o de situações que poderiam caracterizar causas de impedimento ou de suspeição (artigo 95, parágrafo único, incisos I a V, CF), tal como, (i) exercer, ainda que em disponibilidade, outro cargo ou função; (ii) receber, a qualquer título ou pretexto, custas ou participação em processo; (iii) dedicar-se à atividade político-partidária; (iv) receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas; e (v) exercer a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos três anos do afastamento do cargo por aposentadoria ou exoneração.
Todas essas reflexões nos levam a apoiar e louvar a iniciativa do ministro Fachin, na presidência do STF, com relação a um Código de Ética para ministros da Corte Superior do país. Ele quer implementar um código de conduta para definir regras para os tribunais superiores. Os estudos estão sendo feitos desde a posse de Fachin e antecedem a recente polêmica do voo do ministro Dias Toffoli com advogado do Banco Master, como bem acentuou o portal G1 POLÍTICA, em 8.12.25.
*É procurador da República com atuação no RN aposentado.
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