Por Gláucio Tavares Costa*
Em uma data indefinida de janeiro de 2023, vovó acordou um tanto mau humorada, como de costume, vestiu uma camisa verde-amarela e resolveu ir rezar na Esplanada dos Ministérios em Brasília. Até aí, tudo bem!
Não é que ela teve sorte. Por coincidência, um deputado federal local colocou à disposição de outras vovozinhas ônibus para a peregrinação na capital federal, com lanche durante todo o percurso. Por obra desse religioso e bondoso político, vovó não teve que pagar passagem para ir a Brasília, nem custear despesas outras. Até aí, tudo bem!
Vovó chegou a Praça dos Três Poderes e começou sua oração, quando então chegaram furtivamente homens maus e começaram a tumultuar a celebração religiosa. Eles invadiram e depredaram os prédios públicos. Depois de muito tempo e de muita destruição, finalmente a polícia chegou e prendeu a vovó que estava por acaso no meio dos malfeitores, que se encontravam casualmente vestidos de camisa verde-amarela tal qual vovó.
Por isso, o deputado federal Major Victor Hugo (PL-GO) apresentou o Projeto de Lei 2858/22 que prevê que serão anistiados todos os que participaram de atos com motivação política ou eleitoral, ou que os apoiaram com doações, apoio logístico, prestação de serviços ou publicações em mídias sociais entre 8 de janeiro de 2023 e a data de vigência da futura lei. Tal projeto de lei visa: ao perdão de criminosos envolvidos nos atos antidemocráticos; ao cancelamento de multas aplicadas pela Justiça; à manutenção dos direitos políticos dos criminosos, além da revogação de medidas cautelares impostas aos envolvidos como a limitação de se expressarem nas redes sociais.
O deputado proponente do PL da anistia, Major Victor Hugo (PL-GO), justifica o projeto de lei, argumentando que: “A busca de uma solução pacificadora para as controvérsias decorrentes desse processo nos impele a apresentar esse projeto de lei que visa construir pontes de maneira que possamos enfrentar os desafios da fase que virá com serenidade e desassombro.”
A anistia é uma forma de extinção da punibilidade de quem praticou um crime. O termo anistia é derivado da palavra amnestia, do idioma grego, que significa “esquecimento.” É o perdão ao agente que cometeu um delito.
Entretanto, tal instituto não deve ser promotor de impunidade, nem pode ser conferido aos agentes de crimes de homicídio, tráfico de crianças, estupro, genocídio, tortura, tráfico de drogas e terrorismo, consoante preconiza a Constituição Federal.
Nesse sentido, não se deve conceder anistia a criminosos que almejavam a implantação de uma ditadura militar, com abolição do Estado Democrático de Direito. Eventual anistia, seria o recado de que podem tentar outras vezes dar golpes de Estado, pois sempre se dará um jeitinho brasileiro de se garantir a impunidade dos malfeitores e das vovozinhas.
O perdão eventualmente conferido às patrióticas e religiosas senhoras terminariam por alcançar, por exemplo, a garantia de impunidade ao deputado general Elieser Girão (PL-RN), processado pelo Ministério Público Federal por ter estimulado reiteradamente as condutas antidemocráticas, fomentando “o crime de animosidade das Forças Armadas contra os poderes constituídos e o delito de golpe de Estado, como se constata a partir da análise de diversas de suas postagens em redes sociais, efetivadas nos meses que antecederam à tentativa de golpe de Estado em 08/01/2023.”
Em tempo: em sua oração, vovó clamava pelo assassinato dos Ministros do STF, pela tortura e extermínio de pessoas intituladas subversivas e comunistas, o que não tem nada a ver com a Bíblia. Vovó merece perdão?
* É mestrando em Direito pela Universidad Europea del Atlántico, graduado em Farmácia pela UFRN e cronista.
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