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Os efeitos perniciosos dos jogos de azar

Por Rogério Tadeu Romano*

Os gastos com apostas esportivas online dos brasileiros vêm repercutindo negativamente na economia e no orçamento familiar. O desvio do dinheiro para apostas já supera outras despesas como lazer, cultura e produtos pessoais, entre públicos de classes socioeconômicas de menor poder aquisitivo.

Levantamento da PwC Strategy& do Brasil Consultoria Empresarial Ltda mostra que entre 2018 e 2023, as apostas representavam 0,27% do orçamento familiar da classe D. Em 2023, passaram a representar 1,98%, quase quatro vezes mais, como noticiou o portal de notícias da Tribuna do Norte.

Segundo o que disse André Lourenti Magalhães, “um estudo conduzido pela Strategy&, do grupo PWC, revelou que o gasto médio do brasileiro com apostas esportivas pode chegar a 5,5% do valor destinado à alimentação nas classes D e E (com renda familiar de até 3 salários mínimos). A pesquisa constatou que a adesão às “bets” é mais comum em classes mais baixas e o gasto afeta o orçamento familiar.

O certo é como falou Álvaro Costa e Silva, “o Brasil virou um gigantesco cassino”

Para o então ministro da Justiça, Carlos Luz, durante o governo Dutra, um ex-delegado de polícia, o jogo era um câncer moral.

Com os smartphones de alta velocidade, joga-se em tempo real e a partir de qualquer lugar. Os gastos com apostas, sobretudo entre as classes econômicas de menor poder aquisitivo, aumentaram mais de 400% nos últimos anos, impactando até no orçamento da alimentação. Bet, bet, bet. Jogue, jogue, jogue, como ainda lembrou Álvaro Costa e Silva, em artigo para a Folha, em 16.8.24.

Há o PL 2234, que dispõe sobre a exploração de jogos e apostas em todo o território nacional; altera a Lei nº 7.291, de 19 de dezembro de 1984; e revoga o Decreto-Lei nº 9.215, de 30 de abril de 1946, e dispositivos do Decreto-Lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941 (Lei das Contravenções Penais), e da Lei nº 10.406, de 19 de janeiro de 2002 (Código Civil).

O relator atual do projeto de lei é o Senador Irajá.

Os jogos de azar no Brasil são proibidos desde 30 de abril de 1946, por força do decreto-lei 9.215, sob o argumento de que o jogo é degradante para o ser humano.

Há um projeto que determina que entre 60% e 70% do arrecadado vá para a premiação, 7% para os Estados, 3% para os municípios, e o restante, para a empresa autorizada a explorar a atividade do jogo. Segundo se apurou, a proposta geraria uma arrecadação aproximada de R$ 20 bilhões ao ano. Caso o governo encampe a ideia, a tendência é que altere o texto reservando parte da tributação para a União.

A legalização do jogo geraria cerca de 200.000 empregos no país, segundo o senador Irajá Abreu (PSD-TO), dono de um dos projetos que tramitam no Senado. Além de se perder o norte da ética, a volúpia arrecadatória leva a um triste consórcio da tributação com os jogos de azar e a lavagem de dinheiro.

Atualmente, alguns setores da sociedade brasileira defendem a legalização dos jogos de azar, levantando três argumentos: que a invocação aos “bons costumes” utilizada na proibição dos jogos de azar não tem mais valor na atual ordem jurídica brasileira, que os jogos de azar gerariam empregos e que a lavagem de dinheiro ocorre em qualquer atividade econômica, não apenas nos jogos de azar. Existe um projeto de lei denominado PL 2 826/2008, que foi levado à processo de tramitação na Câmara dos Deputados, que trata da legalização dos jogos de azar no Brasil.

O que mais caracteriza o jogo de azar está no § 3º, letra a, do art. 50 da Lei de Contravenções Penais. Assim, segundo aquela norma, consideram-se jogos de azar: “a) o jogo em que o ganho e a perda dependem exclusiva ou principalmente da sorte; b) as apostas sobre corrida de cavalos fora do hipódromo ou de local onde sejam autorizadas; c) as apostas sobre qualquer outra competição esportiva”.

Com a nova sistemática, o crime de lavagem de dinheiro pode ter como delito antecedente os chamados ¨jogos de azar¨.

Tem-se a lição de Pontes de Miranda (Tratado de Direito Privado, tomo VI, 1ª edição, Campinas/SP, Bookseller, 2000, pág. 75), na linha de B. Windscheid(Lehbuch, 9ª edição, II, 885 s), para quem, na aposta há certeza ou incerteza das afirmações, que os contrapõem, e cada um se submete à pena, se não tinha razão; no jogo, o que está em causa é o êxito de atividade empreendida pelos contraentes, o ser ou não ser, o dar-se ou não se dar algum fato, de que depende ganhar um, ou o outro ganhar.

O artigo 50 da Lei de Contravencoes penais fala em jogo de azar, que é estabelecer ou explorar jogo de azar em lugar público ou acessível ao público, mediante o pagamento de entrada ou sem ele. É o que se vê nas atividades de ¨jogos de bingo¨.

O argumento de que a medida trará maior arrecadação para os cofres públicos é “falacioso”. A volta dos jogos de azar poderá deixar as “portas escancaradas” para os crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.

O produto direto do crime de lavagem de dinheiro é o resultado imediato da delinquência, que, a partir da lei, vem de forma aberta e não mais fechada. Podem ser objeto de lavagem de bens, produto ou proveito de infrações anteriores. O proveito é o resultado útil mediato da operação, ganho, lucro

Basta o nexo de causalidade entre o crime antecedente e os bens, objeto material da lavagem, adotando-se os pressupostos teóricos da teoria da equivalência de condições.

Será a rendição para o crime organizado.

Junta-se a atividade do jogo ilegal aos tipos já conhecidos como tráfico de drogas e contrabando de armas, tráfico de influência, crimes previstos contra o sistema financeiro nacional (Lei 7.492/86 de competência da Justiça Federal), crimes contra a Administração da Justiça, Crimes contra a Lei de Licitações (Lei 8.666/93), os crimes praticados pelo funcionário público contra a Administração (peculato, etc), entre outros, na categoria de delito antecedente.

Assim como álcool ou cocaína, jogo pode causar dependência. A inclusão oficial do vício em jogatina no rol das patologias foi em 1992, quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) colocou o jogo compulsivo no Código Internacional de Doenças.

*É procurador da República com atuação no RN.

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