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A mentira e o direito

 

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Por Daniel Victor Ferreira

Sempre disse que há dois profissionais aos quais não se pode mentir de maneira alguma, o médico e o advogado, pois estão em jogo a sua saúde e a sua liberdade.

Uma sociedade baseada na mentira nunca será civilizada. O crime de perjúrio ilustra bem essa afirmação. Perjurar significar mentir sob juramento, ou seja, alguém que perante uma autoridade se compromete em dizer a verdade e acaba por mentir. A diferença existe entre os países nos quais o crime existe ou não em relação a parte de um processo judicial.

Enquanto no Brasil o réu pode mentir em juízo, nos Estados Unidos, por exemplo, o depoimento da parte é tomado como o de qualquer outra testemunha, inclusive com a obrigação de dizer a verdade. O caso mais comentado é o de Bill Clinton, que sob juízo negou ter mantido qualquer relacionamento com sua estagiária Monica Lewinski, o que depois comprovou-se mentiroso quando analisada cientificamente uma roupa de sua amante. O ex-presidente foi alvo de um processo de impeachment, sendo posteriormente absolvido.

No Brasil, entretanto, existe o crime de falso testemunho, disposto no art. 342 do Código Penal, aplicável àqueles que prestam compromisso de falar a verdade perante o juiz (testemunhas) e não o fazem. Ora, qualquer acusado em nosso sistema judicial (como em todos os outros derivados da Bill of Rights) já tem o direito de ficar calado, porque ainda assim teriam o direito de mentir?

Acredito que o Brasil apenas poderá crescer como país ao adotar o crime de perjúrio também para as partes. Quem não tem o compromisso de dizer a verdade numa audiência judicial dificilmente o fará fora dos fóruns judiciais. Essa ausência no direito local advém ainda do processo inquisitorial, do qual não deveríamos deter qualquer resquício.

Entretanto, tal qual como na história do “ovo ou da galinha”, não há como saber se uma sociedade cuja mentira é usual será aperfeiçoada com o crime de perjúrio ou apenas nas sociedades nas quais a verdade é preservada, como a americana, essa infração penal poderia ser utilizada. Afinal, não é incomum um advogado observar uma testemunha mentindo ao juiz, mesmo advertida por esse e diante de estar cometendo um crime. Porque a parte, que tem interesse direto na causa, não mentiria?

O fato é que dizer a verdade ou se esforçar para dizer a verdade faz parte da verdadeira revolução que esse país precisa para avançar rumo ao desenvolvimento: a ética.

*É advogado e ex-conselheiro federal da OAB.