Por Rogério Tadeu Romano
A Câmara aprovou por ampla maioria projeto que afrouxa a Lei de Improbidade Administrativa.
Ainda noticiou o Estadão que a primeira versão do texto do relator, apresentada no fim do ano passado, foi criticada por entidades que atuam na área de transparência, agentes de órgãos de investigação e até por integrantes do governo, que enxergam possíveis prejuízos ao combate à corrupção no País. Entre as principais alterações propostas por Zarattini está a exclusão do artigo 11 da lei, que prevê punições a práticas que afrontem os princípios da administração pública, como o nepotismo, a “carteirada” e até a “furada de fila” da vacinação. Segundo a proposta, apenas condutas que gerem enriquecimento ilícito ou prejuízo aos cofres públicos poderiam ser alvo de processos contra prefeitos e demais gestores.
O projeto também limita ao período de 180 dias, prorrogável por apenas uma vez, o prazo para conclusão de inquéritos civis, etapa preliminar à apresentação de ações de improbidade.
Pelo texto aprovado, o agente será punido se agir com vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito, não bastando a voluntariedade do agente. O mero exercício da função ou desempenho de competências públicas ou a intepretação da lei sem comprovação de ato doloso com fim ilícito também afastam a responsabilidade do autor.
Com relação à responsabilização de terceiros por ato de improbidade, o texto determina que serão responsabilizados aqueles que tenham influência na prática ilícita, seja induzindo ou concorrendo dolosamente para sua ocorrência.
Este ponto foi defendido pelo deputado Henrique Fontana (PT-RS). “Quando um gestor público desonesto comete um ato de gestão com intenção e desvia recursos, isso deve ser punido exemplarmente. Mas quando um gestor público, na sua gestão, enfrenta, por exemplo, um erro administrativo, isso não pode ser tratado como um crime de corrupção”, afirmou.
O deputado Kim Kataguiri (DEM-SP), no entanto, criticou a medida. “O texto já começa excluindo todas as hipóteses de culpa grave. O agente pode ser negligente”, criticou.
Segundo o Consultor Jurídico, os pontos mais criticados durante a votação da proposta na Câmara foram a prescrição para as ações e a mudança nas penas. Segundo o texto aprovado, o magistrado terá liberdade para estipular as punições. Já as penas de perda dos direitos políticos foram majoradas, aumentando o prazo máximo; e foi retirada a previsão de pena mínima.
Eliminou-se a imprescritibilidade do direito de ressarcimento ao dano ao patrimônio público. Ao julgar em 2019 o recurso extraordinário RE 852.475 (tema 897), o STF, sob relatoria do Ministro Alexandre de Moraes, decidiu serem imprescritíveis as ações que visam ressarcir dano ao erário fundadas em improbidades dolosas, interpretando o artigo 37 parágrafo 5.o da Constituição Federal. O projeto aprovado, nesse ponto, é inconstitucional. Fixa prazo de 8 anos, o que representa afronta à Constituição e ao STF e, se mantido, será obviamente derrubado no STF.
O projeto isenta de responsabilidade por improbidade administrativa as pessoas que tiverem sido absolvidas criminalmente sob qualquer fundamento, o que é afrontoso a diversos princípios basilares do Direito, já que que a absolvição pode ser eventualmente por insuficiência de provas e as provas podem surgir em seguida. Seria salvo-conduto ilícito.
É mais um avanço para o retrocesso, afrontando uma Constituição democrática que dentre os seus princípios proíbe tal censurável iniciativa.
Já não se pode esperar muito coisa de um Congresso Nacional com alguns de seus membros respondendo a diversas ações penais e ações por improbidade administrativa.
Avançam agora esses parlamentares para afrontar a chamada Lei de Improbidade Administrativa.
O relator do PL 10.887/18, deputado Carlos Zarattini (PT-SP), já publicou a versão final do parecer. Se o texto for aprovado como está, só serão consideradas improbidade condutas com dolo, ou seja, com intenção. Atualmente, não há essa diferenciação na lei e atos culposos (sem intenção), também são enquadrados no tema.
Entre as mudanças feitas por Zarattini na lei, a principal está no artigo 11, que estabelece motivações que definem atos de improbidade contra os princípios da administração pública.
De há muito discute-se sobre o elemento subjetivo na improbidade administrativa em face da leitura da Lei 8.429/92, que pretendem modificar.
Na linha da jurisprudência do STJ, Mauro Campbell Marques ressaltou que, para a configuração dos atos de improbidade que acarretam enriquecimento ilícito (artigo 9º da Lei 8.429/1992), causam prejuízo ao erário (artigo 10) e atentam contra os princípios da administração pública (artigo 11), é indispensável a presença do elemento subjetivo – em regra, conduta dolosa para todos os tipos e, excepcionalmente, culpa grave no caso do artigo 10. Assim, não é admitida a atribuição de responsabilidade objetiva na ação de improbidade.
O julgamento se deu no REsp 1.713.044.
Na matéria já escrevemos.
De início, lembre-se que o artigo 9º da Lei nº 8.429/92 concebe como elemento subjetivo central o dolo do agente, isto porque não se aceita a hipótese de ato de improbidade cometido por agente público ou ainda particular contra a Administração envolvendo enriquecimento ilícito por comportamento culposo.
Dos três dispositivos citados que definem os atos de improbidade, somente o artigo 10 fala em ação ou omissão, dolosa ou culposa. E a mesma ideia de que, nos atos de improbidade causadores de prejuízo ao erário, exige-se dolo ou culpa, repete-se no artigo 5º da chamada Lei de Improbidade Administrativa.
Colocando um fim à inaceitável insegurança jurídica que plasmava o tema, a 2ª Turma, no REsp n. 765.212/AC, relatado pelo Min. Herman Benjamin, julgado em 02/03/2010, publicado no DJe de 23/06/2010, alterou o seu entendimento, aderindo expressamente à posição que já era adotada pela 1ª Turma. Reconheceu-se, pois, a incompatibilidade entre a imputação de responsabilidade objetiva e o regime garantista que deve permear o Direito Punitivo. Além disso, o art. 37, § 6º da CR/88 expressamente exige a presença de culpa ou dolo por parte do servidor público para que seja possível o manejo de ação regressiva pelo ente estatal. Assim sendo, uma vez consagrada a responsabilidade funcional subjetiva para a hipótese de simples ressarcimento ao erário, que não se confunde com a imposição de punição, “maiores e melhores razões existem para fundamentar a culpabilidade como princípio constitucional, limitando todo o Direito Punitivo do Estado”.
Com supedâneo nesses argumentos, desde então, a 1ª Seção do STJ (composta pela 1ª e 2ª Turmas) passou a firmar, solidamente, o entendimento de que a existência da improbidade prevista no art. 11 exige a presença de “dolo genérico”, seja na espécie “dolo direto” (representação e vontade de produção do resultado querido), seja na espécie “dolo eventual” (aceitação do risco de produção do resultado). Desta forma, por meio do “dolo genérico”, dispensou-se a comprovação da intenção específica do agente de violar princípios administrativos, bastando a constatação de que ele haja consentido em atuar em determinado sentido.
Destaque-se que não se pode falar em responsabilidade objetiva, que além de ser admissível somente quando prevista expressamente, destoa do sistema jurídico brasileiro, no que diz respeito à responsabilidade o agente público, do que se lê da norma contida no artigo 37, § 6º, da Constituição, que consagra a responsabilidade objetiva do Estado por danos causados por terceiros, mas preserva a responsabilidade subjetiva do agente causador do dano.
Esse entendimento está presente na obra Improbidade Administrativa (Aspectos Jurídicos da Defesa do Patrimônio Público, da autoria de Marino Pazzaglini Filho, Márcio Fernando Elias Rosa e Waldo Fazzio Júnior. As afirmações feitas pelos mesmos autores são: Ponto que merece atenção diz respeito ao elemento subjetivo necessário à caracterização das condutas elencadas naqueles dispositivos. Nenhuma das modalidades admite a forma culposa: todas são dolosas. É que todas as espécies da atuação suscetíveis de gerar enriquecimento ilícito pressupõem a consciência da antijuridicidade do resultado pretendido. Nenhum agente desconhece a proibição de enriquecer às expensas do exercício de atividade pública, ou de permitir que, por ilegalidade de sua conduta, outro o faça. Não há, pois, enriquecimento ilícito imprudente ou negligente. De culpa é que não se trata”.
De toda sorte, necessário aduzir que sem um mínimo de má-fé, não se pode cogitar da aplicação de penalidades tão severas previstas no ordenamento como a suspensão dos direitos políticos e a perda da função pública.
Leia-se que nos autos do AgRg no AREsp 270.857, o Superior Tribunal de Justiça manteve decisão pela improcedência da ação de improbidade administrativa, “por ausência dos elementos subjetivos e objetivos, porquanto não comprovada a má-fé dos agentes ou dano ao erário”.
Volto-me ao artigo 10 da Lei nº 8.429/92.
Lá estão previstos os atos de improbidade que causem prejuízo ao erário, independentemente de alguém ter obtido vantagem indevida.
Disse Pedro da Silva Dinamarco (Requisitos para a Procedência das Ações por Improbidade Administrativa): “Seu caput trata da ação ou omissão do agente que seja “dolosa ou culposa” ou seja, bastaria somente a ocorrência de imprudência, imperícia ou negligência. Entretanto, a intenção desse dispositivo provavelmente foi evitar que os atos causadores de danos ao erário ficassem impunes sob o escudo da dificuldade de se produzir a prova da intenção subjetiva do agente. Como já dito, a lei visa a alcançar o administrador desonesto, não o inábil”.
De fato, nas hipóteses dos artigos 9º e 11º é indispensável a demonstração de dolo.
Já na hipótese do artigo 10º, em que a culpa é suficiente para a caracterização do tipo, todos aqueles que participaram do ato com poder de decisão, como todos os seus beneficiários, devem estar sujeitos às sanções legais. Não será razoável imputar essa sanção àqueles que provem não ter agido com dolo ou culpa, dentro da leitura da lei.
Impressionam os argumentos lançados por Aristides Junqueira (Reflexões sobre Improbidade Administrativa no Direito Brasileiro) quando disse que pode-se conceituar a improbidade administrativa, como espécie do gênero imoralidade administrativa qualificada pela desonestidade de conduta do agente público, mediante a qual este se enriquece ilicitamente, obtém vantagem indevida, para si ou para outrem ou cause dano ao erário. E conclui: “E essa qualificadora da imoralidade administrativa que aproxima a improbidade administrativa do conceito de crime, não tanto pelo resultado, mas principalmente pela conduta, cuja índole de desonestidade manifesta a devassidão do agente”.
É de José Afonso da Silva (Direito Constitucional Positivo, 21ª edição, 2002, pág. 646) a opinião de que “todo ato lesivo ao patrimônio agride a moralidade administrativa”, mas sempre a lesão ao patrimônio público pode ser caracterizada como ato de improbidade administrativa, por não estar a conduta do agente, causador do lesão, marcada pela desonestidade.
Consideram Márcio Cammarosano e Flávio Unes (Improbidade e Esvaziamento do Dolo) que é inconstitucional a previsão da modalidade culposa do artigo 10 da Lei de Improbidade Administrativa. Dizem eles ao concluir: “Quanto à modalidade culposa, prevista no art. 10, caput, da Lei de Improbidade, verificou-se, a partir do tratamento constitucional autônomo entre legalidade, moralidade e probidade, violação à Constituição. Em outras palavras, a leitura sistemática do texto constitucional revela que a improbidade é forma qualificada de descumprimento da moralidade administrativa, vinculada ao desvio de finalidade, que, por sua vez, é incompatível com a culpa”.
Realmente a Constituição atrelou a improbidade administrativa à imposição de sanções de extrema gravidade: no artigo 15, V, e artigo 37, § 4º, ao prever a suspensão ou perda dos direitos políticos; no artigo 37, § 4º, ao dispor sobre a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário; e, no artigo 85, ao disciplinar o crime de responsabilidade.
Repita-se: a improbidade administrativa é forma qualificada de ilegalidade ou imoralidade. Como tal, a forma qualificada está vinculada à noção de desvio de finalidade, a impossibilitar a modalidade culposa do agente.
Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça destaca a previsão expressa naquele artigo 10 da Lei nº 8.429 da modalidade culposa.
Realmente como falar em grave desvio ético sem que o agente ao qual se imputa ofensa à ordem jurídica tenha se conduzido sem propósito viciado, eivado de má-fé, sem consciência da antijuridicidade do resultado, a que tenha dado causa? Ora, só há grave desvio ético de conduta quando alguém atua, revelando móvel viciado, má intenção, desígnio moralmente reprovável. Esse é o ímprobo.
Não se duvida que na aplicação das sanções expostas no artigo 12 da Lei de Improbidade Administrativa o julgador terá que aplicar o princípio da proporcionalidade.
Juarez Freitas (Princípio Jurídico da Moralidade e a Lei de Improbidade Administrativa), na mesma linha de Gilmar Ferreira Mendes e Arnoldo Wald (Mandado de segurança e ações constitucionais), entende que a improbidade pode ser punida a título de dolo ou de culpa grave, restando impossível apenas a configuração dessa infração ético-funcional nas condutas pautadas por culpa leve e levíssima.
Alias, é Juarez Freitas, que ao defender a posição intermediária (improbidade administrativa caracterizada por dolo ou culpa grave), acaba por cair em insanável contradição, visto que ele expressamente arrola a “inequívoca intenção desonesta” como sendo o precípuo requisito à configuração da improbidade. Entenda-se que é cediço que o dolo é composto por representação e vontade (ou intenção), de modo que, sendo a grave intenção desonesta um requisito inarredável da improbidade, deve-se afastar, pelos fundamentos expostos pelo doutrinador, a possibilidade de improbidade culposa. Assim onde se verifica a inequívoca intenção desonesta há, de forma nítida, dolo, e não simples culpa na conduta funcional.
Na linha de Edilson Pereira Nobre Júnior (Improbidade Administrativa: alguns aspectos controvertidos), dir-se-á que a presença do dolo é um dos principais elementos configuradores do ato improbus. Repita-se que o conceito de improbidade está, de forma inexorável, atrelado à ideia de imoralidade administrativa qualificada, que pressupõe a presença do ânimo desonestidade.
A Corte Especial do STJ já havia se pronunciado no sentido de que a culpa configuradora da improbidade administrativa deveria ser a “culpa grave”. Nesse sentido,
“Conforme pacífico entendimento jurisprudencial desta Corte Superior, improbidade é ilegalidade tipificada e qualificada pelo elemento subjetivo da conduta do agente, sendo “indispensável para a caracterização de improbidade que a conduta do agente seja dolosa para a tipificação das condutas descritas nos artigos 9º e 11 da Lei 8.429/1992, ou, pelo menos, eivada de culpa grave nas do artigo 10“. (AIA 30/AM, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Corte Especial, DJe 28/09/2011).
Entretanto, a jurisprudência das turmas do STJ, especialmente da 2ª Turma, tem se afastado dessa orientação e começou a se firmar no sentido de que a configuração da improbidade administrativa se basta na comprovação da culpa (simples). Veja-se, por todos:
O entendimento do STJ é no sentido de que, para que seja reconhecida a tipificação da conduta do réu como incurso nas previsões da Lei de Improbidade Administrativa, é necessária a demonstração do elemento subjetivo, consubstanciado pelo dolo para os tipos previstos nos artigos 9º e 11 e, ao menos, pela culpa, nas hipóteses do artigo 10. (AgRg no AREsp 654.406/SE, Rel. Ministro Herman Benjamim, Segunda Turma, julgado em 17/11/2015, DJe 04/02/2016.
Do jeito que as coisas andam os parlamentares, ao modificarem a Lei de Improbidade, vão exigir, em todos os casos o dolo e não propriamente a culpa grave na conduta taxada como ímproba.
Outra questão envolve o artigo 11 da Lei 8.429/92.
Ali se diz:
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:
I – praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;
II – retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício;
III – revelar fato ou circunstância de que tem ciência em razão das atribuições e que deva permanecer em segredo;
IV – negar publicidade aos atos oficiais;
V – frustrar a licitude de concurso público;
VI – deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo;
VII – revelar ou permitir que chegue ao conhecimento de terceiro, antes da respectiva divulgação oficial, teor de medida política ou econômica capaz de afetar o preço de mercadoria, bem ou serviço.
VIII – descumprir as normas relativas à celebração, fiscalização e aprovação de contas de parcerias firmadas pela administração pública com entidades privadas. (Vide Medida Provisória nº 2.088-35, de 2000) (Redação dada pela Lei nº 13.019, de 2014) (Vigência)
IX – deixar de cumprir a exigência de requisitos de acessibilidade previstos na legislação. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
X – transferir recurso a entidade privada, em razão da prestação de serviços na área de saúde sem a prévia celebração de contrato, convênio ou instrumento congênere, nos termos do parágrafo único do art. 24 da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. (Incluído pela Lei nº 13.650, de 2018)
Alega-se que tal dispositivo é por demais aberto e baseado em tema abstrato.
Disse bem Marcelo Figueredo (Probidade Administrativa, segunda edição, pág. 59) que “a preocupação do legislador é de ser aplaudida, porquanto coube à doutrina um esforço de décadas para demonstrar a importância dos princípios, sua eficácia e aplicabilidade. Assim, mais do que nunca, atual é a advertência já clássica de Celso Antônio Bandeira de Mello: “violar um princípio é muito mais grave do que violar uma norma isolada, porque as consequências do ataque são, sem dúvida, muito maiores, devido à generalidade e ratio de ação dos princípios”. Esses princípios constitucionais do direito administrativo podem ser expressos e implícitos” O artigo 37, caput, da Constituição os mencionada de forma clara. Outros encontram-se no sistema: supremacia do interesse público sobre o interesse privado, o principio da finalidade, o princípio da motivação, o princípio da razoabilidade, o princípio da responsabilidade do Estado por atos administrativos, etc.
Como dizer que não é ato de improbidade, deixar de prestar contas quando o agente público é obrigado a fazê-lo. A obrigatoriedade de prestar contas é uma exigência da Constituição(artigo 70, par
Ao final, se tudo isso não bastasse, o projeto aprovado pela Câmara dos Deputados trouxe, outrossim, uma possibilidade de benefício a parlamentares que é justamente o fim da perda da função pública a condenados que tenham mudado de cargo ao longo do processo. Atualmente, se um senador é condenado à perda do cargo por atos que praticou no passado, quando era prefeito, por exemplo, ele perde a atual função. Com o novo projeto, essa punição não ocorre. Lembre-se que o atual presidente da Câmara dos Deputados já foi condenado por prática de improbidade administrativa por atos cometidos na Assembleia Legislativa de Alagoas, como deputado estadual.
Pois bem.
Disseram Manoel Murrieta, José Antonio de Freitas Filho, Trajano Sousa de Melo e Edmar Jorge de Almeida, em artigo publicado no Estadão, com razão, que pelo projeto em tramitação, a punição limitar-se-ia ao enriquecimento ilícito e à lesão ao erário. O risco da mudança é gravíssimo.
Não se pode aceitar que o intuito de se criar uma “zona de imunidade à responsabilidade”, que se somará a obstáculos, igualmente evidentes, às investigações, assim como à blindagem das pessoas jurídicas envolvidas, pois se passará a exigir o conhecimento prévio, por seus representantes, dos atos de improbidade.
Com efeito, não há como se ignorar que corruptos costumam não há como se ignorar que corruptos costumam evitar ou ocultar provas, indícios e rastros, como lembraram Manuel Murrieta, José Antonio de Freitas Filho e outros, naquela oportunidade aqui lembrada.
Fala-se que a versão hoje existente no artigo 11 da Lei de Improbidade Administrativa é afronta a segurança jurídica. O argumento da falta de segurança jurídica não passa de disfarce para obter autorização formal a violações aos princípios da legalidade, moralidade e impessoalidade. Esse é o fato.
O projeto, pois, é feito na medida para os interesses de uma elite que tem a corrupção como meio e prática de vida em detrimento do interesse público.
A população tão sofrida, no seu dia a dia, na busca pela sobrevivência e que é tão mal atendida por hospitais públicos com um atendimento sofrível, certamente, está alheia ao que acontece com essas manobras em afronta à democracia. Esses mesmos que vilipendiam princípios magnos da Administração e que estão na busca dessas insensatas mudanças na Lei de Improbidade, procurarão o voto útil de uma população que sofre com a corrupção e a carência desses serviços cujos recursos, ao longo dos últimos anos, foram sugados por esse câncer chamado “corrupção”.
*É procurador da República com atuação no RN aposentado.
Este texto não representa necessariamente a mesma opinião do blog. Se não concorda faça um rebatendo que publicaremos como uma segunda opinião sobre o tema. Envie para o barreto269@hotmail.com e bruno.269@gmail.com.