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A coroa da mãe será a bússola do filho

Por Ney Lopes*

Morreu aos 96 anos, Elizabeth II do Reino Unido. A monarca britânica governou por 70 anos.

A atual primeira-ministra britânica Liz Truss ainda não havia nascido, quando ela chegou ao trono. A sua dinastia governa desde o século XVIII.

Habitada por povos celtas a partir do século X a.C., a Inglaterra foi colonizada pelos Romanos (43 d.C). O funeral da Rainha será no próximo dia 18.

A coroação de Charles ainda não tem data marcada, mas pode levar “alguns meses”. Quando a Rainha Elizabeth II nasceu em 21 de abril de 1926, seu avô, o rei George V, governava um quarto da população da terra.

Ao morrer neste 8 de setembro, não só o lugar da Grã-Bretanha no mundo se transformou, mas o próprio mundo sofreu mudanças radicais.

A rainha foi ao longo do seu reinado elo de ligação a um passado nacional desaparecido e, simultanamente,  um símbolo de continuidade das tradições do Império.

Transformou-se em pilar de estabilidade, considerando as dificuldades que enfrentou decorrentes do estigma do colonialismo inglês.

Churchill serviu seu pai, Jorge VI, durante os anos de guerra, e  foi primeiro ministro de Elizabeth.

Frequentemente trocavam cartas de admiração, de acordo com o biógrafo de Churchill Martin Gilbert.

Os fatos históricos demonstram a Inglaterra liderando o tráfico de escravos no Atlântico, dominação,  supressão de línguas e prisão dos revolucionários que lutavam contra o colonialismo.

Quênia, Iêmen, Irlanda do Norte, Índia, Egito e África do Sul são alguns exemplos.

Na África do Sul, o governo inglês apoiou e financiou o regime do Apartheid, que discriminava e tentava subjugar a população negra.

No Quênia, durante a guerra de independência nos anos 60, pessoas eram mutiladas e torturadas com machados, por se levantarem contra os britânicos.

Ao contrário dos monarcas do século XX, que se envolveram em intervenções políticas desastrosas, Elizabeth reinou, mas nunca tentou governar.

Claramente uma fórmula vencedora.

Elizabeth II alcançou elevado índice de aprovação pessoal.

Nos últimos anos de seu reinado permaneceu solidamente em torno de 70% de popularidade, índices muito mais altos do que qualquer político eleito no mundo ocidental.

Ela teve estilo de imparcialidade, sendo escrupulosa em questões políticas.

No caso do Brexit, por exemplo, era contra, mas não se manifestou.

A indagação é se o Príncipe Charles III, o herdeiro do trono, conseguirá mudar o seu perfil excêntrico.

O estilo dele é muito diferente do da mãe.

Recentemente, uma pesquisa revelou que 42% dos britânicos preferiam que Carlos cedesse a vez ao filho William, enquanto 24% defendia o direito à sucessão.

Outro dado importante, 29% dos inquiridos não se mostraram interessados no assunto.

Ainda assim, quase metade (48%) acreditava que Carlos iria desempenhar bem as funções de Rei.

Quando a princesa Diana foi morta em um acidente de carro em Paris, em 31 de agosto de 1997, juntamente com seu amante, Dodi Al Fayed, filho de um bilionário egípcio de alto perfil, uma impressão começou a tomar conta da rainha Elizabeth II como  figura sem coração, isolada das preocupações do público.

Diana era muito querida da população, que exigiu posição pública de luto da Rainha, a qual se negou, em princípio, a hastear bandeira a meio palmo no Palácio de Buckingham.

A rainha finalmente retornou a Londres cinco dias após a morte da princesa, e fez um discurso televisionado.

Ela descreveu Diana como “um ser humano excepcional e talentoso” que “fez muitas, muitas pessoas felizes”, embora ela não tenha expressado afeto pessoal por sua falecida nora.

A relação da rainha com Margaret Thatcher, que se tornou primeira-ministra conservadora em maio de 1979, foi descrita na imprensa como legal, embora Thatcher negou isso em seu livro de memórias.

De agora por diante, caberá ao novo Rei prosseguir os desafios enfrentados por sua mãe.

Nenhum outro líder de uma nação presenciou como Elizabet II  acontecimentos tão marcantes, quanto a segunda guerra mundial, a guerra fria, a formação da União Europeia e até a saída do reino Unido dessa comunidade.

O momento atual é dificil para o Império Britânico, que enfrenta seríssima crise econômica e sofre pressões dos anseios separatistas na Escócia e Irlanda do Norte.

A missão de Charles III será conduzir com habilidade a Casa de Windson, no tumultuado século XXI.

A coroa da mãe será a bússola do filho.

*É advogado, jornalista e ex-deputado federal – nl@neylopes.com.br.

Este texto não representa necessariamente a mesma opinião do blog. Se não concorda faça um rebatendo que publicaremos como uma segunda opinião sobre o tema. Envie para o barreto269@hotmail.com e bruno.269@gmail.com.

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Freios ao capitão

Jair Bolsonaro e Dias Toffoli em solenidade no Planalto
Jair Bolsonaro e Dias Toffoli em solenidade no Planalto (Pablo Jacob)

O isolamento político de Jair Bolsonaro não se reflete apenas em derrotas no Congresso. O presidente também tem apanhado no Supremo, cada vez mais acionado para conter seus desatinos na pandemia.

O capitão ameaçava derrubar medidas de governadores e prefeitos para restringir a circulação de pessoas. Antes que ele assinasse o decreto, o Supremo tirou a tinta da caneta. Na quarta-feira, o ministro Alexandre de Moraes proibiu Bolsonaro de atropelar estados e municípios. Ele ainda anotou que as divergências entre autoridades federais têm causado “insegurança, intranquilidade e justificado receio” na sociedade.

Não foi a primeira derrota relevante do Planalto. Na semana passada, o ministro Luís Roberto Barroso proibiu a Secom de torrar dinheiro público numa propaganda com o slogan “O Brasil não pode parar”. Ele escreveu que a campanha era “desinformativa”; não obedecia ao interesse público, deseducava a população e poderia favorecer a propagação do vírus.

Fora dos autos, o Supremo também tem dado recados de que o governo não pode tudo. O ministro Dias Toffoli, que às vezes parece um auxiliar de Bolsonaro, fez questão de declarar apoio ao titular da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. O ministro Gilmar Mendes foi mais direto. “A Constituição não permite que o presidente adote políticas genocidas”, afirmou.
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Para debochar do enfraquecimento de Bolsonaro, políticos da oposição passaram a chamá-lo de rainha da Inglaterra. É uma injustiça com Elizabeth II, que respeita a liturgia do cargo e não aluga os ouvidos dos súditos.

No domingo, a rainha interrompeu a programação da TV pela quinta vez em 68 anos de reinado. Ela fez um agradecimento aos profissionais da saúde, defendeu o isolamento social e pediu que os britânicos permaneçam em casa para se proteger do coronavírus.

Bolsonaro acaba de fazer o quinto pronunciamento televisivo em menos de um mês. Ele moderou o tom, mas insistiu em distorcer uma fala da Organização Mundial da Saúde para torpedear a quarentena.