Por Marcelo Alves Dias de Souza*
Fazia algum tempo que não recebia uma mensagem do Goodreads. Para quem não conhece o dito cujo, criado em 2007, ele se intitula “o maior site do mundo para leitores e recomendações de livros”, com a missão específica de “ajudar as pessoas a encontrar e compartilhar os livros que amam”. Segundo seu fundador, o Goodreads “é um lugar onde você pode ver o que seus amigos estão lendo e vice-versa. Você pode criar ‘estantes’ para organizar o que leu (ou quer ler). Você pode reciprocamente comentar as avaliações dos demais usuários. Você pode encontrar seu próximo livro favorito. E nessa jornada com seus amigos você pode explorar novos territórios, reunir informações e expandir sua mente”. Um pouco autoajuda esse final, mas tá joia.
Fiquei felicíssimo com a mensagem, sobretudo porque ela trazia consigo uma lista de 80 recentes “romances de mistério”, com as devidas recomendações, para que o usuário/leitor possa se enfronhar em novas aventuras do tipo: “você está procurando os romances de mistério mais populares dos últimos três anos? Oitenta deles? Em ordem? Temos uma coincidência extraordinária a relatar. Reunimos abaixo os novos mistérios e thrillers mais populares em circulação recente, conforme determinado pelo que seus colegas Goodreads recomendaram e adicionaram às suas prateleiras. Os livros aqui são classificados como os mais populares e cada um tem uma classificação média geral de 3,5 estrelas ou melhor. Normalmente melhor”.
Realmente, a proposta era/é instigante. E caí para dentro da lista.
Todavia, qual foi a minha surpresa ao descobrir que, dessa lista de mistérios do Goodreads, tidos como os mais badalados dos últimos três anos, pouquíssimos eu conhecia ou mesmo tinha ouvido falar. E olhem que a lista era/é bem diversificada: os tradicionais whodunits, cozy mysteries da moda, thrillers, cold cases, com títulos de escritores do momento e dos famosos ases da turma (tipo Stephen King, James Patterson, Harlan Coben). Conhecia talvez uma meia dúzia: “The Thursday Murder Club” (por Richard Osman), “The Cartographers” (Peng Shepherd), “The Guest List” (Lucy Foley), “The Woman in the Library” (Sulari Gentill), “The Boy from the Woods” (Harlan Coben) e “State of Terror” (Louise Penny e Hillary Rodham Clinton, a outrora primeira-dama e Secretária de Estado dos EUA). Dois deles porque tinham me chamado a atenção título e enredo, que associei à minha amiga Agatha Christie, um deles em razão da autora estadista famosa e os outros porque havia topado com eles (até nas traduções em português) em livrarias daqui e d’alhures.
Por falar em Agatha Christie, devo reconhecer, resignado, que a minha praia são mesmo os clássicos – além da minha amiga, Conan Doyle, C.K. Chesterton, Ian Fleming, Georges Simenon, Raymond Chandler, Dashiell Hammett e por aí vai –, que, graças às venturas da vida, já tive a oportunidade de ler e apreciar.
Fiquei decepcionado comigo mesmo por essa falta de familiaridade com “contemporâneos”. Quase triste. Até que me lembrei de um “slide” do nosso Américo de Oliveira Costa no seu maravilhoso “A biblioteca e seus habitantes” (Achiamé/Fundação José Augusto, 1982): “‘Homem feliz que ainda tem alguma coisa de Eça para ler’, disse, um dia, Afonso Arinos a Tristão de Athayde, ante a informação negativa deste à pergunta se lera certo volume do autor de Os Maias. Carta de Claudel a Gide (1910): ‘Você é feliz por não haver ainda lido as Mémoires d’Outre-Tombe, tendo por isso, em reserva, uma grande satisfação’. O que é uma paralela à pergunta de Eduardo Prado a Batista Pereira: ‘Já leu as Mémoires d’Outre-Tombe?’. E como a resposta não fosse afirmativa, Prado exclamaria como Arinos e Claudel: ‘Que homem feliz! Ainda pode ter esse prazer de ler pela primeira vez!’”.
Pensando bem, tudo sorte minha. Ainda tenho todos esses mistérios para desvendar, todas essas aventuras para sonhar.
*É Procurador Regional da República e Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL.
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