Por Josias de Souza
Lula desprezou várias oportunidades para colocar Fernando Haddad no pedestal de candidato oficial do PT ao Planalto. Acabou virando uma oportunidade que os outros candidatos aproveitam nos debates presidenciais. Na Rede TV!, a ausência de Lula tornou-se uma espécie de escada multiuso.
Bolsonaro chegou a produzir uma “cola”, para não esquecer de escalar seu cabo eleitoral invisível. Escreveu na mão: “pesquisas”, “armas” e “Lula”. Sobre Lula, disse que havia um púlpito reservado para ele no estúdio. Que teria sido retirado a seu pedido, pois lugar de bandido é na cadeia. Em verdade, a peça saiu de cena por vontade da maioria dos candidatos.
Alvaro Dias (Podemos), cuja plataforma é a refundação da República, com a “institucionalização da Lava Jato”, tachou a candidatura de Lula de “encenação” e “vergonha nacional”. Apenas Guilherme Boulos, do PSOL, votou contra a retirada do púlpito de Lula do estúdio.
Sem a concorrência do PT, Boulos monopolizou o discurso de contestação. A exemplo do que ocorrera no primeiro debate, entoou uma pregação que fez lembrar o velho Lula da fase sindical, na década de 80. Seus ataques à “esculhambação” e aos “privilégios” do sistema político não levarão o PSOL ao Planalto. Mas o partido, nascido de uma costela do PT mensaleiro, abocanhará um pedaço do eleitorado que se sente órfão de Lula.
Um telespectador que se deixasse trair pelo sono imaginaria que o candidato de Lula na sucessão de 2018 é Henrique Meirelles, do MDB. O ex-ministro da Fazenda de Michel Temer repetiu à exaustão que não é político. Trocou a iniciativa privada pela presidência do Banco Central porque “o Lula chamou”.
Apropriando-se de uma obra coletiva, Meirelles jactou-se: “Criei 10 milhões de empregos” sob Lula. Sem mencionar o nome radioativo de Temer, o ex-ministro disse ter assumido a pasta da Fazenda para “consertar a bagunça da Dilma”. E produziu “mais dois milhões de empregos”.
Um brasileiro que integre a estatística em que o IBGE aponta a existência de 27 milhões de desempregados, desalentados e sub-remunerados no país, deve ter imaginado que Meirelles é candidato a presidente do Mundo da Lua. Com o hipotético apoio de Lula.
Boulos voltou a realçar os “50 tons de Temer” que coloriam a bancada de candidatos. Lembrou a entrevista em que Temer insinuou que o apoio dos partidos governistas do centrão fez de Alckmin o candidato do seu governo.
Meirelles sorriu amarelo. E Alckmin devolveu a provocação. Declarou que “os tons de Temer” são, na verdade, “avermelhados”. Lembrou que foram os companheiros petistas de Boulos que acomodaram Michel Temer na vice-presidência da República –“Duas vezes”, realçou.
Lula também compôs o pano de fundo de uma troca de amabilidades entre seus ex-ministros Ciro Gomes (PDT) e Marina Silva (Rede). Ex-ministra do Meio Ambiente, Marina perguntou a Ciro o que faria para resolver os conflitos em terras indígenas. Ex-titular da pasta da Integração Nacional, Ciro recordou que atuara junto com Marina para atenuar o problema no governo de Lula.
Para o bem ou para o mal, Lula foi utilizado como escada por quem quis. Só não foi aproveitado pelo petismo, que arrasta a candidatura-fantasma do seu líder como uma bola de ferro, longe das sabatinas e dos debates.