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Natal, a cidade que foi condenada ao atraso por se render as falsas promessas de futuro

Por Daniel Menezes*

A falsa dicotomia entre leis e planejamento versus empregos é uma constante na história de Natal. Uma constante, não apenas na recente instalação da estátua da Havan na entrada da capital, mas na própria trajetória de imposição do privado sobre o público. A consequência é uma colcha de retalhos de ideias desconexas pautadas por uma visão particularista a respeito dos desafios da principal cidade do RN.

A alcunha cidade do sol não é gratuita e deveria muito mais preocupar do que envaidecer. Não há aqui centro histórico digno de nota, apesar12 de um passado único de participação da ponta do continente na segunda guerra mundial. São Luis, Recife e Salvador criaram atrações em torno dos seus casarões e construções coloniais, respeitando o direito à memória e à cidade.

O abandono das praias urbanas foi um projeto cuidadosamente implementado por ações que iriam nos trazer desenvolvimento. A pá de cal foi a recente liberação de espigões na faixa litorânea. Em percurso distinto João Pessoa soube fortalecer suas orlas urbanas, o que leva natalenses para passear no estado vizinho. Grandes construções foram proibidas na praia e a lei foi posta na constituição paraibana para não parar dúvida.

O meio ambiente, quando aparece na cena pública local, é visto como um estorvo. As ZPAs nunca foram devidamente regularizadas e nossas paisagens são pensadas pela via do desdém. Xiita é o nome mais ameno que ganha quem tenta remar contra a maré.

Perdemos postos de trabalho nos reduzindo ao turismo sol e mar e pedaços inteiros da cidade são ilhados para uma minoria ou simplesmente abandonados por turistas e moradores – Redinha, Praia do Meio e Ponta Negra não impulsionam o turismo, nem são visitadas pelos natalenses. São melancolia de uma promessa nunca realizada.

A narrativa rasa da oposição entre desenvolvimento e respeito ao público como perspectiva de contenção de incursões particularistas de curto prazo nos deixou de herança uma ponte que liga a zona sul à norte mais cara e que não resolveu o problema do trânsito entre as duas regiões. O mesmo discurso foi mobilizado para autorizar a derrubada do Machadão e do Machadinho recém reformados, para erguer uma Arena que nos custará 1,5 bilhão financiados por 25 anos. Quando passar para as mãos do governo, o elefante não será capaz de se pagar. Mais custos virão. É o papo que já em 1991 nos fez construir um papódromo para um único evento. E depois? Depois fica a certeza da enganação – o papódromo não trouxe grandes feiras e eventos como prometido e o Arena das Dunas nem de longe sediou shows internacionais.

A relativização das leis, do interesse público e do planejamento consciencioso nunca trouxe mais empregos. Trata-se na verdade de palavrório para impedir o debate racional, enquadrar os críticos como do contra e manipular um cidadão comum em prol de desejos não devidamente demonstrados de uma minoria.

A instalação da estátua da Havan na entrada de Natal é só mais do que nos mantém paralisados no mito do eterno futuro que nunca chega: ao menos para a maioria. Ela não apenas é feia e descaracteriza a entrada de uma cidade que vive da chamada indústria sem chaminé. É ilegal pela lei do mobiliário urbano em vigor ao contrário do que disse o secretário da semurb, em texto distribuído à imprensa – “no terreno privado a pessoa pode colocar o boneco que quiser se não tiver letreiro”. A estátua é um engenho especial e deve ter licença e estudo específicos, não importando se o terreno é público ou privado. O que, por se negar a mostrar após provocação do portal Saiba Mais, a prefeitura não fez.

E o mais bizarro nessa situação é que a Havan não deixaria Natal. A ameaça local propagada é simplesmente carente de base factual. Aonde se instalou a loja ela se adequou às leis locais sem problema, quer seja diminuindo o tamanho, quer seja inclusive abrindo sem estátua.

O que esse debate ameaça na verdade não é o monumento piegas que sobrepujará o pórtico dos reis magos; é essa concepção que manda no modelo de (sub) desenvolvimento de Natal – o de que sempre a inclinação privada deve imperar e sem qualquer freio pelo poder público. E é justamente esse formato que nos trouxe até aqui. Natal é um não lugar – ou você vai para o shopping e outros espaços de consumo, ou fica em casa. A cidade não serve a maioria que mora nela. E o turista se alimenta de sol e de dunas distantes do urbano a partir de uma relação de tremendo desperdício econômico de todo o resto deixado de lado inexplorado.

Tal concepção vencerá mais uma vez. E, como sempre, andaremos em círculo ingenuamente plenos de que o futuro chegará com o uso de fórmula velha. O desencanto durará até a nova promessa faraônica de crescimento. Afinal, a roda precisa girar e tudo deve mudar para que nada seja alterado.

*É professor da UFRN e editor do blog O Potiguar.

Este texto não representa necessariamente a mesma opinião do blog. Se não concorda faça um rebatendo que publicaremos como uma segunda opinião sobre o tema. Envie para o barreto269@hotmail.com e bruno.269@gmail.com.

 

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Refutando o ataque de Cassiano Arruda Câmara contra a autonomia financeira da UERN

O professor universitário aposentado e jornalista Cassiano Arruda Câmara, um dos mais celebrados pela elite natalense, publicou um artigo na Tribuna do Norte em que critica a disposição da governadora Fátima Bezerra (PT) em enviar para a Assembleia Legislativa a proposta de autonomia financeira da UERN.

No texto, o célebre jornalista trata a UERN como um peso para um Estado pobre como o Rio Grande do Norte que não pode ter uma universidade e que deveria cuidar somente do ensino básico.

Essa fala por si só é problemática e mostra bem o sentimento da elite de Natal em relação à UERN.

A Universidade do Estado do Rio Grande do Norte não é algo supérfluo como insinua o jornalista. A UERN é a instituição de ensino superior mais democrática desse sofrido elefante.

Cassiano talvez não saiba, mas a UERN tem em seus quadros 89% de alunos oriundos de escolas públicas. Só esse papel inclusivo justifica a sua existência em todas as regiões do RN.

Mas ainda tem mais.

Cassiano afirma que o Governo precisa priorizar o ensino básico. Mas para ter isso é necessário professores. Sabe quem forma os professores que dão aulas no interior do Estado? A UERN! Ou seja: a UERN é fundamental para o ensino básico.

O experiente jornalista cometeu um equívoco básico na análise de um fato que é se basear numa informação falsa. Ele cita que o ensino superior é de responsabilidade do Governo Federal.

O artigo 211 da Constituição Federal não sustenta a afirmação do colega.

Eis o que consta na Carta Magna a respeito do tema:

Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino.  Proposições em tramitação

  • 1º A União organizará o sistema federal de ensino e o dos Territórios, financiará as instituições de ensino públicas federais e exercerá, em matéria educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios. (Nova redação dada por Emenda Constitucional nº 14 de 12/09/1996) Proposições em tramitação
  • 2º Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil. (Nova redação dada por Emenda Constitucional nº 14 de 12/09/1996) Proposições em tramitação
  • 3º Os Estados e o Distrito Federal atuarão prioritariamente no ensino fundamental e médio. (Incluído por Emenda Constitucional nº 14 de 12/09/1996) Proposições em tramitação
  • 4º Na organização de seus sistemas de ensino, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios definirão formas de colaboração, de forma a assegurar a universalização, a qualidade e a equidade do ensino obrigatório. (Incluído por Emenda Constitucional nº 14 de 12/09/1996) (Nova redação dada por Emenda Constitucional nº 59 de 11/11/2009) (Nova redação dada por Emenda Constitucional nº 108 de 26/08/2020) Proposições em tramitação
  • 5º A educação básica pública atenderá prioritariamente ao ensino regular. (Incluído por Emenda Constitucional nº 53 de 19/12/2006) Proposições em tramitação
  • 6º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios exercerão ação redistributiva em relação a suas escolas. (Incluído por Emenda Constitucional nº 108 de 26/08/2020) Proposições em tramitação
  • 7º O padrão mínimo de qualidade de que trata o § 1º deste artigo considerará as condições adequadas de oferta e terá como referência o Custo Aluno Qualidade (CAQ), pactuados em regime de colaboração na forma disposta em lei complementar, conforme o parágrafo único do art. 23 desta Constituição. (Incluído por Emenda Constitucional nº 108 de 26/08/2020) Proposições em tramitação.

Como você viu não há uma única linha que trate de responsabilidades dos entes federativos, muito menos que ao Governo Federal cabe o ensino superior. Se não fosse assim a Bahia não teria cinco universidades estaduais, não teríamos USP, Unicamp e UERN. O mais próximo de uma delimitação que temos está no fato que a educação fundamental e infantil deve ser prioridade dos Municípios e o ensino médio prioridade dos Estados.

Prioridade é bem diferente de exclusividade. Tanto que temos escolas municipais com ensino médio e escolas estaduais com ensino fundamental.

Ele fala também que a autonomia financeira da UERN custará R$ 400 milhões anuais. Não sei de onde ele tirou isso. Consultei gente grupo de trabalho da autonomia financeira e a estimativa calculada é de que gire em torno R$ 200 milhões por ano. O cálculo é feito com base na arrecadação e não no orçamento. Os números podem variar para mais ou para menos.

Não tenho nada contra Cassiano Arruda Câmara, mas a elite natalense da qual ele faz parte precisa se libertar desse fetiche de implicar com a UERN tratando-a como se fosse um luxo ou algo supérfluo.

A UERN é necessária para reduzir desigualdades regionais e sociais. É um investimento que dá retorno ao povo do Rio Grande do Norte.

Parem de tratar como problema o que é solução!

Você pode ler o artigo de Cassiano AQUI.