Categorias
Matéria

Brasil: esquerda, direita e terceira via

Por Ney Lopes*

A cada dia que se aproxima a eleição geral de 2022 desenha-se o confronto dos extremistas de direita e de esquerda.

O filósofo Norberto Bobbio assemelha esquerda e direita a uma ferradura, em cuja curvatura de ferro as pontas se juntam.

Nos confrontos políticos, os “extremos ideológicos” aproximam-se e defendem ideias comuns, como autoritarismo, culto ao Estado, protecionismo e isolacionismo

A polarização entre direita e esquerda vem do final da II Guerra Mundial.

A “terceira via” teve origem com o primeiro-ministro britânico Tony Blair ao reunir em Dublin (1980) personalidades políticas para discutir esse novo modelo, com o propósito de transformar-se em opção entre esquerda e direita.

Entretanto, teve vida curta e perdeu força.

Em meados da década de 90, com o advento da globalização, o neoliberalismo tornou­-se a doutrina ideológica hegemônica, através do Consenso de Washington, patrocinado pelas principais agências econômicas mundiais.

Nos últimos 20 anos ocorreram acontecimentos globais, como fracasso das reformas neoliberais, o 11 de setembro, a crise financeira internacional de 2008, a pandemia e o crescimento dos extremismos políticos em diversos continentes.

No Brasil, vivemos cerca de duas décadas de polarização entre o PT e o PSDB, sem jamais ter ocorrido a intensidade do confronto atual, com Bolsonaro e Lula se digladiando, em céu aberto.

Inegavelmente, os dois são os mais fortes candidatos no momento e já se escolheram como adversários, por acharem que radicalizar é a melhor forma de ganhar a eleição.

Enquanto isso, o futuro traz o desafio da reconstrução do país, no após pandemia, com sinais de grandes mudanças nas funções prioritárias do Estado,

Quando se fala em terceira via, argumenta-se não existir mais tempo.

Lembro a máxima de Marco Maciel: “havendo prazo, há tempo”.

A dificuldade é a pulverização de nomes, que viabilize uma candidatura única, deixando de lado o estilo belicoso dos insultos e ataques pessoais e convocando à Nação ao “diálogo”, onde todos se sentem à mesa, a exemplo do que fizeram no passado Espanha, Chile, Portugal, Colômbia, Polônia e outros países.

A tarefa de punir os desvios e crimes porventura praticados é competência do STF, MP e PF.

O que interessa para 2022 resume-se na reconstrução do país na urna. Se alguma penalidade política tiver de ser aplicada, será dever do cidadão, na hora da escolha livre.

Hoje, Lula e Bolsonaro dizem o que o povo quer ouvir.

A terceira via, para tornar-se competitiva, teria que colocar em debate “projeto nacional”, em linguagem acessível à população, capaz de transmitir credibilidade e fazer com que o Brasil volte a acreditar em si próprio.

A visão política do nome indicado é pré-requisito para o sucesso, independente da atvidade, ou profissão que exerça.

Sem a política, não haverá solução e a consequência serão as portas abertas para populistas, oportunistas e pregações autoritárias.

A história brasileira tem precedente, que encoraja a hipótese da Terceira Via.

Em 1994, as eleições tinham como objetivo consolidar o processo de renovação institucional, com base na democracia representativa.

O candidato favorito era Luís Inácio da Silva, que vinha fortalecido com o segundo lugar nas eleições de 1989.

Surgiu na reta final, o senador FHC, que viera de derrota para prefeito de SP. Ele trouxe consigo o “projeto nacional” do Plano real, como alternativa de recuperar a economia. Ganhou no primeiro turno.

O exemplo mostra, que ideias consistentes e nome competitivo, derrotam extremismos.

Não se pode negar as diferenças políticas entre 1994 e 2022.

Hoje, o país está dividido em grupos fanatizados, que não raciocinam e agem por impulso.

Antes, era o favoritismo de Lula.

Hoje, há descrença com a classe política.

Antes, o desejo era volta à democracia.

Hoje, verifica-se deserto de líderes.

Antes, a disputa envolveu nomes expressivos de Leonel Brizola, o ex-governador de SP, Orestes Quércia e o senador, Espiridião Amim.

Encontrar em 2022 o caminho da terceira via não será fácil.

Mas, não é impossível.

Em tempo:  arrisco palpite: Tasso Jereissati, Rodrigo Pacheco ou Sérgio Moro.

O critério teria que ser a competência de governar o Brasil e acreditar no julgamento direto do eleitor.

A “cabeça do eleitor” está mudando e a credibilidade do candidato vale mais do que a sua tradição de liderança, ou peso político-eleitoral.

Bom relembrar que FHC elegeu-se Presidente em 1994, sem nunca ter ganho uma eleição, exerceu o Senado como suplente e perdeu para prefeito de SP.

Caso não se concretize a tentativa de nova alternativa para 2022,  a solução será optar por nomes indicados pelas coligações.

Fatalmente, na liderança estarão Bolsonaro e Lula.

*É jornalista, ex-deputado federal, professor de direito constitucional da UFRN e advogado.

Este texto não representa necessariamente a mesma opinião do blog. Se não concorda faça um rebatendo que publicaremos como uma segunda opinião sobre o tema. Envie para o barreto269@hotmail.com e bruno.269@gmail.com.

*É procurador da República com atuação no RN aposentado.

Categorias
Artigo

Mutualismo Político, fator sobrevivência para Lula e Bolsonaro

Lula e Bolsonaro se retroalimentam politicamente (Foto: reprodução/web)

Por Thiago Medeiros*

Numa passagem de 18 Brumário de Luís Bonaparte, Marx mostra como é frequente os atores de uma determinada época buscarem inspiração nos acontecimentos de outra. Cuidado que este texto não tem um viés de esquerda, mas acredito que sim, podemos utilizar diversos autores que estudaram e expressaram teorias sobre diversos acontecimentos. Mas você deve estar se perguntando, o que Marx tem a ver com o momento atual da nossa política? Então eu vou fazer um breve paralelo, associando as principais inspirações para projetos de poder, e prometo que ao final deste artigo você vai entender.

Após uma decisão do STF colocar Luiz Inácio Lula da Silva novamente no jogo político, o cenário eleitoral para 2022 começou a ser jogado de forma diferente. A entrada do petista mudou as narrativas e trouxe uma nova dinâmica. O lulismo é carregado de simbolismo, que desperta em uma parte da população uma inspiração para um futuro melhor e para outra representa tempos tenebrosos da nossa nação. O lulismo e o antipetismo deram vida, em 2018, ao bolsonarismo, movimento encabeçado por Bolsonaro que se aproveitou do momento da opinião pública que clamava por uma mudança em nossa política.

Durante sua campanha e também seu governo, o bolsonarismo se vale de uma volta a este passado para resgatar suas bases morais e também seu ideal de governo. Isso mantém de forma coesa uma clientela eleitoral que, faça chuva ou sol, sustenta as intenções de voto de Bolsonaro o suficiente para levá-lo ao segundo turno.

Bolsonaro deu vida ao lulismo antes mesmo da decisão do STF. A sobrevida que hoje Lula ganhou e ganha é lastreada por palavras e ações de Bolsonaro e seu governo. Colocados em polos opostos, esses dois modelos – lulismo e bolsonarismo – têm uma relação ecológica de sobrevivência.

Na natureza, existem diversos tipos de relações entre os seres vivos. Algumas inspiram competição e outras uma espécie de cooperação, o mutualismo é uma dessas, onde há benefício para ambos. O mutualismo é uma associação imprescindível, pois ela garante que os dois animais envolvidos sejam beneficiados e sobrevivam.

Vamos descrever então essa relação de mutualismo entre o lulismo e o bolsonarismo. Sim, primeiramente começo com a afirmação que um precisa do outro para sobreviver. Eles representam visões de um Brasil que tem sido apresentada de modo antagônica, claro que cada um deles ressalta as suas qualidades e aponta os defeitos do seu oponente. Voltando a Marx, citado no início desse texto, o lulismo volta ao passada numa narrativa do resgate de uma época de ouro, onde para eles a redução da desigualdade social, liderança para enfrentar os desafios, crescimento econômico, dentre outros são as virtudes necessárias para levar o País para um futuro melhor, diante dos desafios de um Brasil pós-pandemia.

Assim, o lulismo, numa comparação ao momento atual do Bolsonarismo, se apresenta como um tipo de espécie mais preparada, uma alternativa positiva. Do outro lado do polo, esse mesmo passado é usado para o bolsonarismo ficar raízes e florescer na mente das pessoas. Para ele, o passado petista representa negatividade, voltar a ele significa um retrocesso dentro daquilo que tem sido conquista, principalmente referente aos valores morais e também na luta contra o comunismo e corrupção. Dessa leitura do passado são resgatadas as lembranças que nutrem o bolsonarismo e enfraquece o lulismo.

Sendo assim, ter um Bolsonaro com monopólio da direita e um Lula apoiado por grande parte da esquerda pode indicar uma eleição polarizada, mas também é bom para chacoalhar a turma da terceira via. Não será fácil, um caminho possível seria buscar um público mais cansado com essa polarização, da esquerda com o lulismo e à direita com o bolsonarismo. Mas até agora nenhuma das figuras apresentadas como alternativa para comandar essa tentativa – Mandetta, Ciro Gomes, Tarso Gereissati, Luciano Hulck, Eduardo Leite, João Dória e até o Danilo Gentili – demonstrou capacidade de emplacar uma viabilidade.

Você muito ouvirá sobre antibolsonarismo e antilulismo (antipetismo). Eles serão como índices na bolsa de valores. O aumento de um significa o avanço do outro polo sobre a mente das pessoas. Porém aqui faço uma ressalva, durante este processo podemos ter diante do jogo os dois lados jogando cada vez mais para os extremos, e isso pode aumentar em mesma proporção as duas rejeições, favorecendo assim uma outra via. Mas caso tenhamos uma polarização, esses dois entes precisam manter uma estabilidade de sobrevivência para essas rejeições. Elas serão fundamentais para criar um clima possível de triunfo de sua espécie.

Ambos jogam num campo que satisfaz suas bases eleitorais, e esperam a aderência das demais classes com o passar do tempo, e também na sua viabilidade diante do possível fracasso o oponente. O mutualismo aqui não significa que não haverá competição, porém quero demonstrar que as duas visões de mundo, os dois projetos precisam um do outro para chegarem competitivos em 2022. Até o final do primeiro turno, Bolsonaro será o maior cabo eleitoral de Lula e vice-versa.

Se atacando e não deixando espaços para uma nova narrativa se estabelecer. Cada um dominando a sua faixa do campo, bolsonarismo e lulismo precisam de um ambiente “hostil” de disputa para garantir que suas agendas sigam despertando interesse. Para quem não se encontra satisfeito com essa posição, resta esperar e tentar encontrar uma melhor solução.

Pode ser que uma hora ela apareça. Pode ser que não.

*É Publicitário e Sociólogo.  thiagocamara@hotmail.com

Este artigo não representa necessariamente a mesma opinião do blog. Se não concorda faça um rebatendo que publicaremos como uma segunda opinião sobre o tema.