Categorias
Matéria

Prefeitura informa que não tem mais relação contratual com médicos cubanos que ficaram em Mossoró

O Blog do Barreto checou junto à Prefeitura de Mossoró que os três médicos cubanos que ficaram na cidade não possuem mais vínculos com a administração municipal via programa Mais Médicos.

A assessoria de comunicação informou que “com o encerramento do convênio com o Governo de Cuba, a Prefeitura já começou a receber os novos médicos selecionados via edital lançado pelo Ministério da Saúde”. Também foi explicado que “os médicos começaram a se apresentar e tem até o dia 14 para as vagas dos cubanos serem preenchidas. Com isso, o Município não tem mais responsabilidade direta sobre esses profissionais que decidiram não retornar ao país de origem”.

No último sábado esta página trouxe a angustia sofrida pelos profissionais que escolheram ficar na cidade por terem constituído família em Mossoró. Além de liberados pelo Governo de Cuba eles possuíam contratos até 2020.

Relembre o assunto clicando em Cubano que escolheu ficar em Mossoró relata angústia com futuro do Mais Médicos.

Categorias
Reportagem

Cubano que escolheu ficar em Mossoró relata angústia com futuro do Mais Médicos

Desde que o presidente eleito Jair Bolsonaro declarou que iria mudar as regras do Mais Médicos e o Governo cubano se adiantou e chamou os mais de 8 mil profissionais que atuam no país retomou a força do debate sobre a qualidade (duvidosa) do contrato entre Brasil e Cuba onde 70% dos R$ 10 mil pagos ficam a administração autoritária da ilha caribenha.

Mas enquanto milhares de médicos voltam para casa pelo menos três deles decidiram ficar trocando as belezas do Caribe pelo calorão de Mossoró. Do trio, um é o Dr. Yoanis Infante Rodríguez. Em conversa com o Blog do Barreto ele lamentou que a permanência dos médicos cubanos seja ignorada. “Hoje os jornais em geral só falam dos médicos cubanos que estão indo embora. Mas não se fala dos médicos cubanos que estão ficando aqui no Brasil”, declarou.

Ele segue atendendo os pacientes na Unidade Básica de Saúde (UBS) Raimundo Renê Carlos de Castro no Bairro Boa Vista.

Além dele, outros dois profissionais (Zuzel Ramos Rodríguez e Angel Alfredo Leyva Rodríguez) também escolheram ficar na cidade.

Eram 14 cubanos e do total 11 decidiram voltar.

Dr. Yoanis formou família em Mossoró e está com o contrato renovado com o Mais Médicos até 2020. Por esta condição ele está liberado pelo Ministério da Saúde de Cuba, mas demonstra preocupação com o futuro do projeto. “Somos casados com residência permanente e com contrato renovado até 2020, com famílias formadas. Ninguém se pronuncia com respeito a nós médicos cubanos que vamos ficar e que fomos liberados pelo Ministério da Saúde de Cuba?”, pergunta.

Ele relata um sentimento de angustia com a falta de informações a respeito da situação dos médicos cubanos que escolheram ficar no país. “Agora perguntamos qual é a resposta do Ministério da Saúde do Brasil. A gente vai continuar trabalhando nos postos de saúde onde estamos fazendo um trabalho com a população há mais de 4 anos, um trabalho aceito pela população?”, questiona.

São mais de 1.400 médicos cubanos casados no Brasil que decidiram ficar. Isso representa 17 % do total dos profissionais com residência permanente. “Cadê os direitos de igualdade? Isso é o que estamos esperando uma resposta por parte do Ministério da Saúde se a gente vai continuar trabalhando para poder sustentar a família formada no Brasil”, frisa.

Sobre o exame revalida, Yoanis disse que ele e os colegas que ficaram estão dispostos a fazer o teste, mas há outro ponto que gera mais angustia: “O problema é que só tem o exame em outubro e até lá como vamos nos manter no Brasil?”, questiona mais uma vez.

Por enquanto os médicos cubanos que ficaram estão como ativos no sistema do Ministério da Saúde.

Categorias
Artigo

Chama médico cubano de escravo, mas não se indigna com escravo de verdade

Resgatados da escravidão aguardam pagamento em fazenda no Sul do Pará (Foto Leonardo Sakamoto)

Por Leonardo Sakamoto

Do caso da fazenda Vale do Rio Cristalino, no Sul do Pará, que pertencia à Volkswagen, durante a ditadura militar, até os das grandes marcas de vestuário e da construção civil hoje, respeitáveis corporações já foram envolvidas em denúncias relacionadas ao trabalho análogo ao de escravo. Mais de 53 mil pessoas foram libertadas, desde 1995, em operações de fiscalização do governo federal e um número maior do que isso permaneceu nessas condições porque não conseguiu denunciar sua situação.

Alguns dos que agora erguem a voz contra a ”escravidão” de médicos cubanos nunca abriram a boca para dar um pio sequer de solidariedade nesses casos supracitados. E sabe por quê? Porque não dão e nunca deram a mínima se um trabalhador escravizado vive ou morre, nos campos ou nas cidades. Querem apenas ganhar sua guerra ideológica e política particular usando as ferramentas que têm em mãos, dobrando as definições legais sobre esse crime se necessário.

Uma investigação conduzida pela Procuradoria Regional do Trabalho da 10a Região considerou que o modelo de remuneração do acordo entre Brasil e Cuba para o Mais Médicos representa discriminação de trabalhadores cubanos, pois nossa lei garante isonomia salarial e direitos trabalhistas – o que venho defendendo desde 2013. Contudo, a mesma investigação do Ministério Público do Trabalho afirmou também que, nem de longe, a situação assemelha-se a trabalho escravo. O problema é que, nesta era de pós-verdade, as opiniões calcadas em emoções são mais importantes do que fatos apurados por órgãos competentes.

Ou seja, se for para atacar Cuba e, com isso, constranger o programa Mais Médicos vale a pena batizar qualquer coisa de trabalho escravo, esgarçando seu conceito legal. Criam-se os maiores malabarismos a fim de explicar que aquilo pode se enquadrar nessa forma de exploração – que, de acordo com o artigo 149 do Código Penal, caracteriza-se por trabalho forçado, servidão por dívida, condições de degradantes de trabalho ou jornada exaustiva.

Façamos uma experiência: vamos ampliar o conceito e considerar esses médicos como escravos. Mas com o compromisso de que, assim que o último cubano for ”libertado”, passaremos a resgatar todos os trabalhadores brasileiros em fazendas, indústrias, comércio, serviços, vítimas de irregularidades trabalhistas, que passariam a ser ”escravos” também devido a essa forçação de barra. Ou seja, se fossemos por esse devaneio, o problema sairia da casa de dezenas de milhares para cerca de 17 milhões de pessoas – 8% do país – em estimativas conservadoras de juízes e procuradores ouvidos por este blog.

Libertado da escravidão perdeu o dedo no serviço. Essa era a água que era obrigado a beber (Foto Leonardo Sakamoto)

Uma luta tem sido travada junto aos Três Poderes, nos últimos anos, envolvendo políticos, organizações sociais, juízes, procuradores, defensores públicos, empresários, servidores públicos, entre outros, para evitar que a definição legal de escravidão contemporânea seja desidratada. Em outubro do ano passado, por exemplo, o governo Michel Temer publicou uma portaria do Ministério do Trabalho mudando as regras da fiscalização e tornando irrelevantes as condições em que os trabalhadores se encontram para a caracterização de escravidão. A partir dela, escravo seria apenas quem estivesse preso sob vigilância armada. Após intensa pressão da sociedade e da imprensa, as mudanças foram suspensas pelo Supremo Tribunal Federal. E, com isso, o governo voltou atrás.

Mas o oposto também tem sido feito: há uma luta para evitar que tudo seja chamado de trabalho escravo. Porque se tudo é escravo, nada é de fato. Durante a campanha, Jair Bolsonaro criticou o enfrentamento à escravidão contemporênea, citando dados equivocados sobre a fiscalização. Falou do caso de uma mulher grávida que teria sido considerada como submetida à escravidão porque foi exposta à aplicação de agrotóxico. O que não procede. De acordo com a área de fiscalização do Ministério do Trabalho, uma irregularidade como essa não configura o crime. Esse tipo de declaração do presidente eleito, ao tentar ampliar o escopo do que é trabalho escravo para ajudar sua argumentação, é um desserviço ao setor empresarial brasileiro por levar à insegurança jurídica.

Quando o Mais Médicos foi anunciado há cinco anos, afirmei que uma coisa é a política pública em si, de levar médicos estrangeiros ao interior do Brasil em áreas carentes, que – a meu ver – está correta. Outra, muito ruim, foi a ideia equivocada de não pagar a totalidade do salário diretamente ao trabalhador.

Como já expliquei aqui, o acordo com a instituição cubana responsável pelos profissionais, firmado via Organização Panamericana de Saúde (Opas), prevê que um ”imposto” seja cobrado dos médicos que estiverem em missão no Brasil. O valor líquido repassado é de R$ 3 mil, enquanto o governo cubano fica com R$ 8,8 mil, pagos mensalmente – menos uma taxa operacional que fica com a Opas. Além desse valor, os médicos também recebem auxílio-moradia e auxílio-alimentação das prefeituras.

De um lado, defensores desse modelo apontam que ele é correto por ser o pagamento por uma missão médica contratada de outro país e que o valor da dedução não é tão maior que os impostos sobre renda cobrados em alguns países. De outro, críticos afirmam que o ideal seria que os médicos recebessem o mesmo que profissionais de outras nacionalidades e, caso necessário, o Brasil pagaria, à parte, pelo serviço da empresa cubana de saúde.

Como já dito acima, a Procuradoria Regional do Trabalho da 10a Região considerou que há discriminação de trabalhadores cubanos, pois nossa lei garante isonomia salarial. Mas que isso, nem de longe, assemelha-se a trabalho escravo.

Trabalhadores produzindo peças para oficina responsabilizada por trabalho escravo. Foto: MPT/Divulgação

Entrevistei dois médicos cubanos que faziam parte do programa e atuavam em um município na Grande São Paulo, como expliquei aqui no texto de ontem. Bem quistos pelos moradores no posto de saúde, rechaçaram as denúncias de que estariam submetidos a esse tipo de exploração. ”Escravos não têm esses privilégios”, afirmou um deles, Mario. Ele disse que como sua família tem à disposição um sistema educacional e de saúde gratuitos em Cuba, que funcionam, e que fez faculdade de medicina, residência e mestrado sem ter que pagar pelos cursos, livros ou materiais, acha justo colaborar para que esse sistema continue funcionando.

Nem todos acham justo, contudo. E, por conta disso, o mais correto à luz da nossa legislação é a isonomia salarial com os brasileiros e pessoas de outras nacionalidades.

Alguém duvida que, quando todo esse furdúnculo desaparecer, se auditores fiscais passarem a libertar trabalhadores considerando como escravidão toda e qualquer irregularidade trabalhista do nível de gravidade da verificada pelo MPT junto aos médicos cubanos, iremos ouvir reclamações daqueles que chamarão os auditores fiscais de ”comunistas”?

Seria ótimo que esses que agora se preocupam com  escravização de pessoas cobrassem do presidente eleito a garantia de que a área de fiscalização do trabalho seja protegida de influência política e econômica, de preferência em um Ministério do Trabalho que não seja rebaixado, desmembrado ou enfraquecido, e com recursos para que possa verificar toda e qualquer denúncia de escravidão contemporânea que chegue até ele. Ou exigissem que políticos parem de receber doações eleitorais de pessoas físicas que se beneficiaram desse tipo de crime. Quando defendi meu doutorado sobre trabalho escravo contemporâneo, em 2007, fiz um extenso levantamento envolvendo várias eleições e doadores, o que apontava uma esbórnia. Os cruzamentos da ”lista suja” do trabalho escravo com os doadores de campanha mostram que ela continua ainda hoje.

Em tempo: há quem fale da importância da defesa da democracia ao reclamar do relacionamento com o autoritarismo cubano, mas não se importa nem um pouco ao fazer um bom negócio com o autoritarismo chinês.

Categorias
Matéria

RN ficará com 67 cidades desassistidas com saída de médicos cubanos

Wagner Guerra

Agora RN

A saída de Cuba do programa Mais Médicos do Brasil, anunciada nesta quarta-feira pelo governo do país caribenho, deixará 67 municípios do Rio Grande do Norte desassistidos, de acordo com a Secretaria Estadual de Saúde Pública (Sesap).

O Rio Grande do Norte tem, atualmente, 142 médicos cubanos distribuídos em 101 dos 167 municípios. Segundo a coordenadora da Comissão do Mais Médicos no Estado, Ivana Maria Queiroz, a saída dos profissionais caribenhos elevará de forma significativa o déficit de médicos existente.

As cidades mais afastadas da capital, Natal, devem sofrer as maiores consequências. Ivana Queiroz assinala que o Estado tem dificuldade de contratar médicos, sobretudo para atuar em localidades distantes.

Os municípios de maior porte também enfrentam problemas para fixar esses profissionais da saúde, já que a maioria opta em diluir a carga horária em regime de plantões nos serviços de urgência e emergência ou que não exijam o cumprimento de 40 horas semanais.

“Com a saída dos médicos cubanos, a Sesap vai se articular com o Conselho de Secretarias Municipais de Saúde do RN para discutir que estratégias serão criadas para cobrir esses vazios, justamente agora em que o Estado começa a entrar no período de mudanças climáticas, colocando os municípios potiguares em risco sanitário, diante do surgimento de doenças sazonais como dengue, gripe e outras que fragilizam a saúde das pessoas”, afirma a coordenadora potiguar do Mais Médicos.

Segundo a técnica da Atenção Básica e também membro da Comissão do Mais Médicos no RN Uiacy Nascimento de Alencar, os médicos intercambistas cooperados (dos quais 142 são cubanos) que atuam na atenção básica exercem a medicina de Saúde da Família e da Comunidade, desenvolvendo processos de trabalho nas áreas de promoção da saúde e prevenção de doenças e agravos sensíveis à atenção básica, bem como cuidados em saúde mental e reabilitação com apoio dos Núcleos de Apoio ao Saúde da Família.

“Eles procuram atuar no manejo das doenças e condições crônicas, em práticas que valorizam mudanças de estilos de vida e outras situações que demandam a produção de vínculos e apoio a autonomia dos usuários do SUS para práticas orientados de autocuidado”, observou.

Resultado de imagem para bolsonaro

DESISTÊNCIA

O governo de Cuba anunciou, na manhã desta quarta-feira, que deixará de participar do programa Mais Médicos. A decisão vem após o presidente eleito, Jair Bolsonaro, afirmar que pretende modificar os termos de colaboração com o país caribenho.

Em vigor há cinco anos, o programa – criado na gestão da então presidente Dilma Rousseff – traz médicos de outros países para atuarem em regiões em que há déficit de profissionais de saúde. A maioria dos médicos do programa (51%) vem de Cuba, após acordo do Ministério da Saúde do Brasil com a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas).

Quando são abertos chamamentos de médicos para o programa, a seleção segue uma ordem de preferência: médicos com registro no Brasil (formados em território nacional ou no exterior, com revalidação do diploma no País); médicos brasileiros formados no exterior; e médicos estrangeiros formados fora do Brasil. Após as primeiras chamadas, caso sobrem vagas, os médicos cubanos são convocados.

Após Cuba anunciar a saída do programa, Bolsonaro disse via Twitter que condicionou a continuidade do programa “à aplicação de teste de capacidade, salário integral aos profissionais cubanos, hoje maior parte destinados à ditadura, e a liberdade para trazerem suas famílias” e que, “infelizmente, Cuba não aceitou”.

De acordo com o governo cubano, em cinco anos de trabalho no programa brasileiro, cerca de 20 mil médicos atenderam a 113.539 milhões de pacientes em mais de 3,6 mil municípios. “Mais de 700 municípios tiveram um médico pela primeira vez na história”, disse o governo.

Em nota, a Opas informou que Cuba comunicou ao órgão a decisão de não continuar participando do Mais Médicos. A Opas, por sua vez, comunicou a decisão ao Ministério da Saúde do Brasil. “Devemos ter mais detalhes nos próximos dias. Assim que os tivermos, divulgaremos”, informou o órgão internacional.