“Relógio que atrasa não adianta”. Esse despretensioso jogo de palavras pode traduzir precisamente um dos maiores problemas atualmente do serviço de assessoria de imprensa: o gerenciamento de tempo inadequado dos clientes na divulgação dos press releases para a imprensa.
Para um executivo de gestão, comunicação ou de marketing muitas vezes é difícil entender o quanto o tempo é uma questão central no jornalismo. No filme Noivo em Fuga, um personagem resumiu muito bem o assunto, definindo que “o jornalismo é a literatura que tem pressa”. Por isso, o processo decisório nesse espaço é quase sempre muito acelerado e não volta atrás. Uma vez perdido um prazo ou um fechamento de edição dificilmente alguma coisa poderá ser recuperada e refeita.
Os jornalistas, queiram ou não, são escravos do momento. Por sinal, jornalismo e imprensa nasceram regidos pelo tempo. Recorrendo à etimologia, o jornalismo vem do francês “journal”, que corresponde à relação diária (jour=dia) ou publicação periódica. Daí também surgirem outros termos que têm essa ligação intrínseca como periódico, que em espanhol significa jornal, e giorno, palavra que em italiano é dia e seu derivado para jornal é gionarle. Um jornal diário, que foi durante séculos a mídia básica da humanidade, sai todos os dias e não pode cabular edição. Isso é sagrado. Houve tempos também que alguns diários produziam três edições por dia: Matutina, vespertina e noturna. Em situações emergenciais há também a famosa edição extra.
Para um decisor em comunicação corporativa é essencial que entenda que não é seu tempo que importa para a opinião pública, mas na prática é o tempo dela que conta realmente. Por exemplo, se uma fábrica foi inaugurada e a diretoria só decidiu que deveria divulgar isso três meses depois do acontecimento por uma razão particular, o fato deixa de ter relevância para a imprensa e passa a ser apenas história da empresa. Para uma publicação, a informação só é importante se ela irá influir no universo dos seus receptores ou se pode ser transformada em conhecimento ou alguém usá-la para algum fim relevante.
A informação em jornalismo tem urgência e há quase uma obsessão da busca para publicação de notícias em primeira-mão, o chamado ‘furo jornalístico’. “Quando não é possível conseguir sair na frente, então, que se saia junto com os outros veículos”, é o pensamento dominante da indústria jornalística.
O jornalismo, em verdade, tenta ser a fotografia imediata do fato e a publicação da notícia dependerá também da periodicidade de cada veículo. Há meios de comunicação em ‘tempo real’ como as agências de notícias, aqueles que podem transmitir ‘ao vivo’ como rádios e TVs, como também os diários, os semanários (hebdomadários), quinzenários, mensários, veículos bimestrais, trimestrais, quadrimestrais, semestrais e até anuais. A partir das publicações bimestrais fica mais comum encontrá-las apenas na mídia especializada e científica. A dita ‘grande imprensa’ ou mainstream press (MSM) é quase sempre instantânea, no máximo mensal. Mas qualquer que seja a periodicidade, todos os veículos têm compromisso rigoroso com seu receptor, seus anunciantes e por consequência com seus rígidos fechamentos de edição (deadline ou linha da morte).
Uma notícia ou reportagem velha não serve para muita coisa na mídia, e ainda mais, hoje em dia, quando as redes sociais, mesmo que não sejam jornalismo ou imprensa, costumam despejar informes à população antes da imprensa, por causa da proximidade e autonomia do emissor com esses canais. No entanto, as redes sociais não têm um protocolo da divulgação formal, nem uma técnica discursiva própria, nem um código de conduta, que imponha limites aos seus produtos midiáticos.
Quase tudo é permitido nos posts/publicações e tuítes. Encontram-se facilmente nesses espaços mensagens múltiplas, fotos, fofocas, fakenews, áudios, streamings, comentários, reclamações, alertas, avisos, piadas, estórias, recados, etc.etc.etc. E como afirmou o escritor e jornalista Ignácio de Loyola Brandão, “quem escreve, escreve o que quer”. Mas na técnica jornalística, além do texto claro, objetivo, preciso e conciso é necessário que seja ágil. Os bons jornalistas são verdadeiros ‘Lewis Hamilton’ do relato, da narrativa, de como contar um acontecimento com velocidade.
Os profissionais dos jornais impressos, possivelmente a mídia mais profunda, todo dia têm um bom espaço em branco para ser preenchido. Se por acaso uma matéria chegar após o fechamento de nada adiantará. Tudo tem seu tempo e especialmente no jornalismo porque a notícia velha não tem nada de novo, portanto deixa de ser notícia.
Nos telejornais o duelo contra o tempo também é uma luta de samurais. Aqui os repórteres, produtores e editores também enfrentarão o ‘inimigo tempo’ com galhardia. Os jornalistas trazem as imagens de campo, entrevistas (sonoras) e às vezes a narração gravada da matéria (off). A seguir os editores de VT montam na ilha de edição a reportagem de acordo com as diretrizes dos editores de texto e tudo supervisionado pelos editores de jornalismo. O projeto da edição do telejornal ou ‘espelho’ precisa ser concebido com rapidez no decorrer do dia até o fechamento da edição.
Em geral, o telejornal de uma cabeça de rede tem meia hora de duração, mas leva o dia inteiro para ser produzido. E quando ele vai ao ar, acontece impreterivelmente a X horas, nem mais, nem menos. Trata-se de um encontro marcado preciso, matemático e impiedoso. Algumas vezes, a matéria pode cair, mas com certeza haverá outra muito em breve com o mesmo número de segundos que a anterior para substituí-la. Se o material bruto não for editado a tempo, finalizado até seu horário limite, de nada valerá o esforço desprendido. Jornalistas que falham em suas entregas não têm muito tempo ou vida longa na profissão.
De todas as periodicidades jornalísticas a de ‘tempo real’ possivelmente seja a mais desafiadora no que diz respeito ao fechamento, porque os segundos reinam absolutos, soberanos como aqueles imperadores que cortam as cabeças dos inimigos. Nas redações das agências de notícias, repórteres, redatores e editores correm contra os ponteiros do relógio para noticiarem o acontecimento o mais próximo do fato, que é a filosofia do “tempo real’. Por isso, as notas e notícias são ‘flashes’, que reduzem ao absolutamente essencial para serem levadas aos leitores e internautas quase que instantemente. Gritos às vezes também fazem parte do tempero editorial nas suas redações. E o resultado é comemorado em muitos momentos. Houve uma vez em que a agência Reuters se vangloriou, porque deu a notícia dois minutos depois que o líder da União Soviética de então, Mikhail Gorbachev, deixou seu cargo.
No rádio, como as matérias são transmitidas muitas vezes ‘ao vivo’ pelo celular, não há muitos entraves de prazos e com frequência nem é preciso redigir o texto, o que levaria mais algum tempo. A situação radiofônica pode ser narrada prontamente, sendo muito parecida com os ‘vivos’ das televisões. Mas vale deixar claro, que a maior parte de um telejornal ou radiojornal é produzida com diversas matérias previamente gravadas, que são inseridas no seu roteiro final.
Então, é de total importância, que porta-vozes, fontes informativas e gestores de releases fiquem mais conscientes de que “o tempo não para”, como cantava Cazuza, e convém destacar ainda que nesse ambiente comunicacional isso é para todos indistintamente, até para os geradores da informação.
Um anônimo definiu certa vez que “o tempo tem duas caras, se bem aproveitado será um grande aliado, senão será seu pior inimigo”. Na mídia é assim e isso é dogmático. Há também outros pensamentos sobre essa questão como o da atriz, escritora e cineasta Liv Ullmann, que indagou num dia filosófico: “Por que o tempo é tão implacável, roubando-nos as oportunidades se não formos suficientemente rápidos para agarrá-las imediatamente? Pois bem, esse artigo termina por aqui, porque o tempo acabou.
*É gerente de atendimento da Vervi Assessoria e Comunicações, jornalista, publicitário e professor de Comunicação. É pós-graduado/especialista e mestre em Comunicação pela USP, onde foi pesquisador-bolsista.