O Ministério Público Federal (MPF) apresentou denúncia contra quatro envolvidos em um esquema de compra de voto no Tribunal Regional Eleitoral (TRE/RN) em 2014: o advogado Erick Wilson Pereira, os ex-juízes Carlo Virgílio Fernandes de Paiva e Verlano de Queiroz Medeiros, além do ex-prefeito do município de Francisco Dantas, Gilson Dias Gonçalves, que firmou um acordo de colaboração premiada.
A denúncia é resultado da Operação Balcão (deflagrada em maio de 2019) e inclui os crimes de corrupção passiva (art. 317 do Código Penal, contra Verlano Medeiros e Carlo Virgílio), corrupção ativa (art. 333 do Código Penal. Erick Pereira e Gilson Dias) e lavagem de ativos (art. 1º, Lei 9.613/98, em relação a Carlo Virgilio e Verlano Medeiros). Eles negociaram, em troca de propina, voto favorável à candidatura da então companheira de Gilson Dias, Maria Aparecida de Araújo.
Ela era candidata na eleição suplementar realizada em maio de 2014 na cidade de Francisco Dantas (localizada a 400 km de Natal), após Gilson Dias ter tido seu mandato de prefeito cassado por compra de votos e abuso de poder econômico. A Justiça Eleitoral, contudo, indeferiu a chapa de Maria Aparecida, que recorreu ao TRE/RN. Carlo Virgílio se tornou relator e determinou que a chapa adversária (que venceu as eleições suplementares) não tomasse posse, suspendendo a diplomação.
Um dia antes do julgamento do recurso principal pelo Plenário do TRE, Anaxímenes Nunes – irmão do candidato a vice-prefeito na chapa de Maria Aparecida – divulgou um vídeo nas redes sociais em que relatava uma suposta compra da decisão judicial, com pagamento a integrantes do tribunal. Após a divulgação do vídeo, o processo foi retirado de pauta e Carlo Virgílio se declarou suspeito, afastando-se do caso. Posteriormente, o TRE/RN decidiu por manter a cassação do registro da chapa de Maria Aparecida.
Balcão – Em sua colaboração premiada, Gilson Dias confessou que em reunião realizada no escritório de Erick Pereira recebeu uma proposta do advogado de obter uma decisão favorável à candidatura de sua companheira, em troca de uma propina de R$ 150 mil. O encontro foi confirmado por registros de ligações telefônicas e identificação de localização, por meio da triangulação das antenas de telefonia utilizadas.
Movimentações financeiras atípicas, como o saque em espécie de dezenas de milhares de reais em contas de parentes de Gilson Dias, comprovam toda movimentação para obter os recursos da propina. À época, Verlano Medeiros era juiz do TRE/RN, advogava no mesmo escritório de Erick Pereira e teria agido como intermediário junto a Carlo Virgílio, que assim como ele integrava o tribunal nas vagas destinadas aos juristas, profissionais que podem continuar advogando mesmo durante o período em que são magistrados na Justiça Eleitoral.
Para o MPF, havia uma “intensa e deliberada atuação de referidos advogados (Erick e Verlano) nos bastidores da política, como verdadeiros lobistas de interesses próprios e alheios. (…) Verlano Medeiros prestava auxílio a Erick Pereira no escritório e inclusive se utilizava de sua condição de juiz do TRE/RN para atender a interesses do primeiro”.
Operação – A Balcão, deflagrada em 8 de maio de 2019, foi resultado de um trabalho conjunto do MPF, Polícia Federal e Receita Federal e cumpriu sete mandados de busca e apreensão em Natal, Parnamirim e Brasília. Durante as investigações, o Ministério Público Federal obteve judicialmente o afastamento do sigilo bancário, fiscal, telefônico e de mensagens dos envolvidos, bem como requisitou documentos, colheu depoimentos e realizou diligência no tribunal.
A Receita Federal concluiu (após o afastamento do sigilo fiscal e bancário) que os investigados tiveram movimentação financeira incompatível com as rendas declaradas em 2014. O relatório indicou, por exemplo, que Carlo Virgílio, no final de maio daquele ano – dez dias após conceder a liminar sob suspeita – adquiriu à vista um veículo Amarok, por R$ 123 mil. Uma semana depois, estranhamente, ele devolveu a nota fiscal do veículo que estava em seu nome e pediu a emissão de uma nova, em nome de uma empresa administrada pela esposa.
Pressão – O autor do vídeo que deu origem às suspeitas chegou a procurar o TRE/RN para mudar a sua versão dos fatos e passou a negar a veracidade das acusações iniciais. Porém, as investigações não só comprovaram que o esquema ilegal de corrupção realmente ocorreu, como também apontaram que os quatro denunciados estiveram pessoalmente envolvidos na “armação” que levou Anaxímenes Nunes a retirar as acusações.
“Os fatos apontam de forma sólida para a conclusão de que houve um arranjo de condutas para dissuadir Anaxímenes Nunes a manter suas declarações iniciais, o que foi efetivamente conseguido. No entanto, repita-se, já havia descortinamento de todas as demais provas que corroboraram as declarações dele”, enfatiza a denúncia.
Texto: Assessoria de Imprensa MPF.