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Diante desse cenário de catástrofe, o que pode ser feito pela economia?

Por Pollyana Rodrigues Gondin

O atual cenário econômico brasileiro reflete medidas e caminhos tomados pelo governo desde meados do ano de 2014, em que o Brasil começou a sentir os efeitos de uma crise econômica e política. Diante dessa recessão, houve aumento do desemprego e, em consonância, aumentou o número de trabalhadores informais, para garantir renda e conseguir fazer frente às suas necessidades diárias. Dados mostram que no ano de 2019, a taxa média de desemprego foi de 11,9% — pouco abaixo da taxa de 2018, que foi de 12,3%. Apesar disso, como dito, aumentou-se o número de trabalhadores informais (que atingiu em 2019 a marca de 41,1%).

Se esse cenário já não era positivo, agora, com a pandemia do Covid-19, tende a se agravar, pois haverá impactos negativos sobre a indústria, o comércio e a construção civil.

No Brasil, atualmente, são centenas de casos confirmados, milhares de casos suspeitos e dezenas de mortes em decorrência dessa pandemia. Mas um fato importante nas estatísticas até o momento divulgadas é que elas não refletem a realidade, pois não há testes suficientes para a população com sintomas, o que pode produzir dados subestimados. Além disso, é preciso considerar que somos um país com uma grande desigualdade de renda, no qual, segundo dados do IBGE (2019), 13,5 milhões de pessoas sobrevivem com até R$ 145 mensais.

Mas diante de um cenário tão alarmante, o que pode ser feito?

O que pode e deve ser feito é uma maior atuação do governo brasileiro fornecendo condições mínimas para que a população possa enfrentar este momento e, ao mesmo tempo, tenha garantias de que, apesar da situação pessimista, terá condições mínimas de vida, incluindo no aspecto econômico, de saúde e de bem-estar.

O governo tem então proposto algumas medidas que, ao meu ver, são insuficientes e não resolvem um dos grandes problemas: a condição de subemprego e os trabalhadores informais, aqueles que não possuem respaldo legal que garanta seus direitos. Um dos pronunciamentos do governo anunciou a liberação de R$ 200 aos trabalhadores informais. A ideia é diminuir a recessão econômica, uma vez que grande parte da população encontra-se em isolamento social, o que impacta diretamente comércios e trabalhadores informais.

Desse modo, esperamos que novas medidas sejam anunciadas pelo governo para garantir apoio ao combate à pandemia e, ao mesmo tempo, permitir o funcionamento da economia — mesmo que em níveis mais baixos. Soma-se a isso a necessidade de atuação dos governantes fornecendo subsídios aos trabalhadores e aos empresários para que estes tenham consciência e consigam manter seus empregados, sem causar o desemprego em massa.

Enquanto isso, devemos nos conscientizar a gastar nossa renda da melhor forma, evitando desperdícios e contribuindo com os comerciantes locais e informais, que se veem em um momento assustador e tentam driblar as dificuldades por meio de, por exemplo, anúncios de seus produtos nas redes sociais e entregas em domicílio. Assim, governo, empresários e trabalhadores podem se unir para evitar um colapso, resguardando inclusive, o psicológico da população mais vulnerável.

*É economista e professora da Escola Superior de Gestão, Comunicação e Negócios do Centro Universitário Internacional Uninter.

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Guerras e pandemias. Brasil, COVID-19 e guerra comercial sino-americana

Conflito EUA X China vive pior fase, segundo economistas — o que ...
Por Francisco Carlos Carvalho de Melo*

A pandemia de COVID-19 acontece no momento em que Estados Unidos da América e China travam uma guerra comercial pela hegemonia política e econômica mundial, o que permite afirmar que esses dois episódios definirão um momento histórico que influenciará fortemente a história da primeira metade do século XXI, quiçá, de todo ele. O futuro do Brasil depende das consequências das suas posições em relação à guerra comercial entre EUA e das suas escolhas em relação à pandemia de COVID-19, atualmente a maior preocupação da humanidade, que impõe sofrimento, perdas de vidas e sérias perturbações nas cadeias de produção.

A atual guerra sino-americana e a pandemia da COVID-19 foram precedidas por outros dois momentos históricos, caracterizados por guerras entre as principais nações do mundo, seguidos por pandemias e profundas transformações políticas, econômicas e sociais. Cerca de 100 anos separam as Guerras Napoleônicas e a primeira pandemia de cólera (1º e 2º décadas do século XIX), da Primeira Grande Guerra Mundial e a Gripe Espanhola (2º década do século XX) e esta da guerra sino-americana e a pandemia de COVID-19 (2º e 3º décadas do século XXI). São duzentos anos de histórica.

Enquanto as guerras dos dois primeiros momentos históricos foram de natureza bélica e redesenharam o mapa geopolítico nos séculos XIX e XX, respectivamente, a guerra deste terceiro momento é de natureza comercial, científica e tecnológica. Embora não seja tão perceptível como o estrondo dos canhões, certamente marcará profundamente o comércio no século XXI, com influências sobre a cultura, valores e modos de vida. Em qualquer guerra, independente da sua natureza, os mais prejudicados são as populações socialmente mais vulneráveis, devido às perdas humanas e escassez de insumos e serviços básicos.

A primeira pandemia de cólera, entre os anos de 1816 à 1826 ceifou a vida de centenas de milhares de vidas na Ásia e Europa, enquanto a Gripe Espanhola, entre 1918 e 1920 também alcançou as Américas e outras partes do mundo. A pandemia da COVID-19 (2020), por sua vez, mesmo que não seja letal para cerca de 50 milhões de pessoas, como a Gripe Espanhola, poderá ser letal para centenas de milhares ou até de milhões de pessoas, atingindo todos os países do mundo, em questão de meses. Certamente, com as perdas humanas e profundos impactos sobre governos e setores produtivos, tudo transmitido e discutido em tempo real pela internet ou canais de televisão, podemos afirmar: o mundo não será o mesmo depois da COVID-19.

A luta contra a pandemia da COVID-19 acontece no momento em que as duas maiores potências econômicas deste início de século estão se digladiando na arena global. A pandemia impôs uma trégua não declarada, logo as duas potencias retornarão às batalhas no campo comercial, tecnológico e científico, influenciados pelos sistemas políticos e ideológicos. Guerra continuara nessas espaços, afinal, o confronto bélico ficou inviável, as armas estão potentes demais.

Capacidade tecnológica, produtividade, competitividade, competência na comunicação e sucesso na influência cultural, são as armas usadas para assegurar o domínio dos mercados. Ao mesmo tempo, os interesses econômicos envolvidos na guerra sino-americana, afetam a capacidade de reação dos países dos países à pandemia de CONVID-19. Países poderão fazer opções erradas em termos de declarações e ações efetivas para o controle da pandemia, submissos ou influenciados pelos interesses dos EUA e da CHINA. Os reflexos no campo econômico virão na sequencia do controle da pandemia.

Durante os últimos setenta anos, os EUA, frequentemente acusados de imperialismo, usaram seu aparelho militar, econômico, científico e cultural a favor dos seus interesses. É razoável imaginar que a segunda maior economia do mundo, com trilhões de dólares para investir, embora não parecendo disposta a provocar confrontos militares, tentará usar as táticas comuns entre os americanos: expansão do comércio bilateral, instalação ou aquisição de empresas locais, empréstimos e financiamentos, como ponta de lança para os instrumentos de influência política e ideológica (televisão, cinema, música, moda etc) e até apoiar partidos políticos e financiar candidaturas. Se os americanos o fazem, porque não imaginarmos que a China pode e quer fazer o mesmo? Essa guerra é um jogo de dominação e hegemonia. Como em todas as guerras, não há inocentes.

O Brasil, muito mais imbricado com a economia, cultura, valores e estilo de vida dos americanos, encontra na China o seu principal parceiro comercial. Compartilhamos os mesmos valores e estilo de vida, pautado pela democracia e liberdade de expressão característica dos EUA. Contudo, devemos ter a certeza de que o comercio, compartilhamento de tecnologias e financiamento chinês é necessário e indispensável para o desenvolvimento brasileiro.

O Brasil está comprimido entre os interesses dessas duas superpotências. Certamente será, ou já está sendo, pressionado pelos dois titãs econômicos, que desejam manter e ampliar sua esfera de influência, assegurando mercado para seus produtos. O principal e mais notável deles parece ser a tecnologia 5G. Os chineses saíram na frente com a Huawei e os americanos correm atrás para não perder o estratégico espaço tecnológico. Quem oferecerá mais vantagens, até que o Brasil defina qual tecnologia adotará? Além das tecnologias de armazenamento e transmissão de dados, há uma infinidade de produtos e serviços que os chineses rapidamente aprenderam a fazer e querem, naturalmente, que os brasileiros consumam.

Embora admitindo forte imbricação com os americanos, também devemos ser francos: essa relação sempre foi mais benéfica para os gringos. Os americanos precisam oferecer mais vantagens ao Brasil, pois somos um país com mais de 210 milhões de consumidores, com gigantesco potencial de recursos naturais e altíssimo produtividade agropecuária. Precisamos de acesso, compartilhamento e capacidade de desenvolver novas tecnologias. entre EUA e China, devemos priorizar a parceria que for mais benéfica aos mais altos interesses nacionais, de curto e longo prazo. Priorizar uma, no entanto, não deve significar abrir mão das relações com a outra.

Embora não seja fácil escolher sem fragilizar nossas relações com uma das superpotências, é necessário traçar estratégias e negociar. Para isso, precisamos de mentes técnicas e políticas altamente qualificadas, cientes da guerra por hegemonia que está em curso e comprometidas com os interesses do povo brasileiro. Não se trata de simples nacionalismo, é parte necessária da estratégia de desenvolvimento.

Para que qualificadas mentes técnicas e políticas possam atuar, é preciso que fique claro: o brasileiro não suporta mais lideranças carismáticas, pessoalmente incapazes e seus liderados doutrinados, mais propensos a seguir cartilhas e dogmas dos seus lideres, do que capazes refletir de uma forma organizada. Não suporta a corrupção, desperdício e incompetência técnica. Não aceita o baixo desempenho do sistema educacional, da ciência e tecnologia. Não aguenta o custo do processo eleitoral, das casas legislativas, do judiciário e da maioria dos órgãos que compõem a burocracia pública e quer mais e melhores serviços públicos. Percebe-se, então, que, apesar da guerra sino-americana e da COVID-19, nossos principais adversários falam português, gostam de samba e futebol, nenhum deles é americano ou chinês.

*É professor do Departamento de Economia da UERN e vereador pelo partido Progressista, em Mossoró/RN.
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Keynesianos de ocasião

John Maynard Keynes

Por Jean Paul Prates*

Foi preciso que uma infelicidade sacudisse o planeta para que os ultraliberais comandados por Bolsonaro e Paulo Guedes acordassem para a necessidade de aplicar políticas minimamente voltadas para dar algum fôlego à economia.

Antes da pandemia de coronavírus, o País já se debatia sob os efeitos do estrangulamento fiscal e de cortes de direitos que resultavam em PIBs anêmicos — em 2019, não esqueçamos, o resultado foi de 1,1% — retorno do Brasil ao mapa da fome, 11,9 milhões de desempregados e quase 40 milhões de trabalhadores na informalidade e sem qualquer garantia.

Os resultados eram desastrosos e mortíferos, mas o remédio era tratado pelos ultraliberais como inquestionáveis. Mas veio a pandemia para virar os manuais pelo avesso: grandes empresários “descobriram” a importância de seus empregados e casos terminais de privatismo se converteram à necessidade da presença do Estado.

O BNDES anunciou algumas medidas pontuais para auxiliar setores da economia na travessia da crise levada ao paroxismo pela pandemia. Um exemplo é a linha de crédito de R$ 40 bilhões para que pequenas e médias empresas possam pagar até dois salários mínimos a seus empregados por dois meses, com o compromisso de não demitirem por igual período.

A linha de crédito do BNDES vai beneficiar empresas com faturamento anual de R$ 360 mil e R$ 10 milhões, deixando de fora o vasto contingente de microempreendedores e autônomos.

Iniciativas como essa sugerem que até mesmo os mais empedernidos dos Chicago boys são capazes de apanhar um livro de Keynes na prateleira, quando a coisa aperta.

Mas a timidez da medida comprova que a sensibilidade social atingiu apenas a epiderme dos tecnocratas — e nem sinal de proposta concreta para permitir um mínimo de proteção aos trabalhadores durante a pandemia.

O meu partido, o PT, defende uma atuação muito mais profunda do Estado do que as receitas para uso tópico apresentadas pelo governo, até agora.

Nesta segunda-feira, apresentamos um novo conjunto de propostas para garantir a renda, o bem estar mínimo e a sobrevivência econômica nesta crise do coronavírus.

O projeto garante a remuneração de quem ganha até três salários mínimos e vai beneficiar 30 milhões de trabalhadores. A linha de crédito do BNDES e Banco Central que defendemos é de R$ 300 bilhões para as empresas.

Depois de assegurar a renda básica de até R$ 1.200 para todos os inscritos no Cadastro Único de Programas Sociais, beneficiando 77 milhões de pessoas, estamos propondo o Salário Quarentena, garantia de remuneração e manutenção do emprego durante a pandemia para 80% dos trabalhadores do país, ao custo máximo mensal de R$ 34 bilhões.

*É senador pelo RN.

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Governo do RN articula junto aos bancos medidas para minimizar efeitos do coronavírus na economia

Governo tenta garantir recursos para empresas e autônomos (Foto: Assecom/RN)

O Governo do RN está tratando junto às instituições bancárias oficiais a celeridade das medidas de atendimento a pessoas física e jurídica afetadas pela pandemia do novo coronavírus. A governadora Fátima Bezerra determinou ao secretário de Desenvolvimento Econômico, Jaime Calado, a articulação junto aos bancos para minimizar os efeitos do vírus que afetam trabalhadores autônomos formais e informais e de empresas.

“Nossa preocupação é também com os negócios, daqueles que trabalham por conta própria e das empresas do mercado formal. É preciso garantir a sobrevivência das pessoas e dos empreendimentos até que a pandemia seja superada e todos nós possamos voltar às atividades normais”, afirmou a Governadora.

A Secretaria de Estado do Desenvolvimento Econômico (Sedec) já realizou duas videoconferências com as entidades empresariais Fetronor, Sebrae, FCDL, FAERN, FIERN e Fecomércio e com os superintendentes regionais do Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Banco do Nordeste do Brasil, Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e com a Agência de Fomento do RN (AGN). “Continuaremos realizando duas videoconferências semanais para monitorar a situação e agilizar as medidas. Além da questão da saúde pública, estamos trabalhando para garantir a saúde financeira das empresas e do trabalhador por conta própria. Seguimos recomendação da governadora que todos os esforços para atendermos a população”, afirmou Jaime Calado.

As medidas tomadas são:

BANCO DO NORDESTE

– Prorrogação dos prazos de empréstimos e financiamentos por até seis meses,

– Concessão de empréstimo para capital de giro com até seis meses de carência para início da amortização,

– Ampliação do prazo médio do Crediamigo de cinco para sete meses e antecipação das renovações das operações de microcrédito urano a vencer entre os meses de abril e junho de 2020,

– Para clientes não rurais, elevação do valor das contratações de R$ 50 mil para R$ 100 mil, sem a obrigatoriedade de vinculação de garantias reais,

– Redução do pacote de tarifas para operações de crédito,

– Carência de 60 dias para empréstimos a pessoas físicas,

– Disponibilização do telefone 0800 728 3030 para agendar atendimentos nos casos que não possam ser resolvidos via Internet Banking ou canais digitais.

CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

– Pausa de dois meses nos créditos par pessoa física, pessoa jurídica e habitacional,

– Carência de 60 dias para novos empréstimos,

– Saque nas lotéricas até R$ 3 mil,

– Transações até R$ 10 mil pelo APP Caixa,

– Funcionamento exclusivo das salas de autoatendimento para pagamento do INSS, Bolsa Família e cadastramento de senha.

BNDES

– Suspensão da cobrança de empréstimos por seis meses,

– Liberação de R$ 30 bilhões em empréstimos – 19 bilhões para operações diretas e R$ 11 bilhões para operações indiretas -, para empresas nos setores de petróleo e gás, aeroportos, portos, energia, transporte, mobilidade urbana, saúde, indústria e comércio e serviços,

– R$ 5 bilhões em crédito para micro, pequenas e médias empresas com faturamento anual de até R$ 300 milhões,

– Ampliação do limite de crédito por beneficiário de R$ 10 milhões para R$ 70 milhões por ano, com carência de até 24 meses e prazo total para pagamento de 60 meses.

AGN

– Microempreendedores com financiamentos ativos terão pausa por até 90 dias no pagamento das parcelas,

– Ampliação para até três meses de carência para o início do pagamento de novos financiamentos contratados até 30 de abril de 2020,

– Para garantir a prorrogação do pagamento do financiamento, o cliente precisa estar com o pagamento das parcelas em dia e encaminhar email para o endereço boleto@agnrn.com.br com título “Solicitação de Prorrogação de Contrato” informando nome completo, CPF ou CNPJ. Em caso de dúvidas sobre a suspensão temporária dos pagamentos, o microempreendedor poderá entrar em contato por telefone ou WhatsApp nos números 99914-7837 e 99426-0579.

– As linhas de financiamento voltadas para empreendedores formais e informais das áreas do comércio, indústria e serviços, assim como as operações voltadas à cultura, artesanato e agricultura familiar estarão operando normalmente para contratação que poderá ser feita através de WhatsApp ou teleatendimento das 8h às 16h.

– O atendimento presencial na AGN fica restrito a casos excepcionais e para assinatura de contratos, mediante agendamento via teleatendimento 99914-7837 e 99426-0579.

BANCO DO BRASIL

– Renegociação de dívidas para pessoas e empresas, com dispensa da primeira parcela, carência de 90 dias e prazo de dois a 100 meses para o novo contrato.

– Clientes pessoa física que já tenham operações de crédito contratadas podem renovar com carência para pagamento da primeira parcela nas linhas de crédito direto ao consumidor (CDC). O banco aumentou o prazo para até dois meses de pagamentos do saldo devedor do cheque especial.

– Adesão às novas condições pode ser feita pelos canais digitais – não é preciso ir até uma agência. Clientes que precisarem reescalonar ou recuperar, irão contar com renegociações sem a necessidade de pagamento de entrada e repactuação que vai de 2 a 96 meses.

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O papel do Estado em tempos de crise

O Papel do Estado na Economia | AaA PUC

Por Isolda Dantas*

As políticas neoliberais são organizadas pela insistente visão de austeridade nas políticas socais que apontam Estado mínimo como sinônimo de eficiência, autorregulação dos mercados, privatizações de setores estratégicos e ajustes fiscais como as receitas prontas para o desenvolvimento da economia. Mais do que isso, os economistas da grande mídia costumam anunciar a ausência de qualquer alternativa a esse modelo. Recentemente, porém, a pandemia do novo coronavírus (COVID-19) – que já matou mais de 16.000 pessoas no mundo e infectou quase 3000 brasileiros até a noite do dia 26 de março de 2020 – tem colocado em xeque esse dogma capitalista.

Com as medidas necessárias de distanciamento social como mecanismo de contenção da propagação do vírus, setores importantes do comércio e indústria paralisaram ou reduziram significativamente suas atividades. Enquanto isso, o mercado financeiro operou em forte queda por semanas consecutivas. O impacto econômico das medidas sabidamente mais efetivas para a preservação das vidas no planeta já é latente. Assim, aqueles que sempre se utilizaram da racionalidade neoliberal, hoje clamam socorro do Estado para salvar seus lucros. Esses mesmos que clamam por socorro do Estado dizem que a economia não pode parar e que portanto a classe trabalhadora uma vez mais será sacrificada. Quando a resposta deveria ser justamente o contrário e o Estado garantir políticas de proteção social para assegurar a vida e dignidade mínima para sua sobrevivência.

Esse cenário revela o papel fundamental do Estado nos momentos de crise, que deve atuar para garantir a economia com a produção dos bens e serviços para sustentar a vida e isso inclui garantir os direitos mais básicos da população, como a saúde e trabalho. Não podemos mais aceitar soluções privadas para problemas públicos. Neste sentido, Portugal, Singapura e até países como Estados Unidos e o Reino Unido acenam com medidas de subsídio a pequenas empresas, cobertura de salários que eventualmente deixarão de pagos pela iniciativa privada, apoio financeiro a trabalhadores informais, autônomos, inquilinos e desempregados.

No Brasil, entretanto, Bolsonaro vai na contramão das recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) e de seu próprio Ministério da Saúde. Sugere o fim das medidas de distanciamento social, ataca e deslegitima ações dos governos estaduais e minimiza as milhares de vidas que podem ser perdidas em nome da manutenção do desempenho econômico da classe dominante que o colocou no poder. No mesmo dia em que o Banco Central injetou cerca de 1 trilhão de reais de liquidez para ajudar bancos, Bolsonaro apresenta a Medida Provisória n. 927 que atinge justamente os trabalhadores e trabalhadoras da iniciativa privada. Dentre outros elementos, essa MP dá a possibilidade de redução de salários em até 25%, num contexto em que cerca de 63 milhões de brasileiros já enfrentam dívidas que têm extrema dificuldade para pagar. O presidente expõe ainda mais ao risco de vida a população que deveria proteger e extrapola todos os limites de irresponsabilidade no exercício do cargo.

A despeito das posições genocidas do presidente, as iniciativas efetivas tomadas até então no enfrentamento à pandemia vêm do Poder Público: os testes são produzidos pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) ou Universidades públicas; a maior parte dos tratamentos realizados pelo SUS, através de sua presença em todos os municípios do país; contratação extraordinária de profissionais da saúde; abertura de linhas de crédito através da Caixa Econômica Federal, dentre outras, reforçando a importância de um Estado forte para minimizar os efeitos da pandemia na vida do povo.

Na perspectiva de solidariedade internacional neste momento, os governadores do Nordeste solicitaram ao embaixador da China no Brasil, Yang Wanming, o apoio do governo chinês por meio do envio de materiais médicos, insumos e equipamentos, como leitos de UTI e respiradores. Entendendo quem são realmente os mais afetados com a crise, os governadores Camilo Santana (PT) do Ceará e Fátima Bezerra (PT) do Rio Grande do Norte, meu estado, suspenderam a cobrança de água para as categorias mais pobres. No Maranhão, o governador Flávio Dino (PCdoB) solicitou abertura de edital para apresentações culturais online, visando minimizar a crise em um dos setores mais atingidos, o setor cultural. Aqui em nosso estado também solicitamos à governadora a realização de iniciativas similares.

Apesar de esse momento histórico escancarar as mazelas do modelo de Estado mínimo e sua completa incapacidade para solucionar os desafios da população em momentos de crise, a síntese deste período não será necessariamente a emergência de um futuro mais solidário, com Estado mais presente na garantia de direitos. As classes dominantes continuarão defendendo seus privilégios de um modelo que priorize seus lucros e compartilha os prejuízos, precarizando o trabalho, a vida e esvaziando a democracia de seu sentido mais substancial.

Caberá, então, aos setores populares do país a exigência da defesa da nossa gente. Se os bancos centrais podem salvar os mercados financeiros, os governos devem ser responsáveis por políticas que amparem quem tem a vida em risco nesse momento. Se devido o distanciamento social a produtividade é impactada, urge que o estado subsidie a renda das pequenas empresas e famílias trabalhadoras. O Congresso deu uma demonstração disso, ao aprovar a Renda Básica Emergencial apresentada pelo PT e demais partidos de oposição.

O Projeto aprovado consiste em benefícios para pessoas com renda familiar per capita de até meio salário mínimo, ou renda familiar de até três salários mínimos. Os benefícios são de R$ 600,00 reais por trabalhador ou de R$ 1.200,00 reais para famílias com dois ou mais trabalhadores e mulheres chefes de família com filhos menores de 18 anos pelo período de 03 meses, prorrogável por igual período. A proposta aprovada passará ainda pelo Senado e pela sanção presidencial. A medida deve alcançar mais de 100 milhões de brasileiros beneficiários do Bolsa Família, pessoas inscritas no Cadastro Único e todos os trabalhadores informais e de baixa renda, que precisam permanecer dentro de casa e parar suas atividades.

Por fim, e mais do que isso, precisamos defender uma transformação social profunda, que passa pela construção de um modelo de Estado mais forte, capaz de priorizar a vida e os direitos básicos da população. No Brasil, isso está vinculado a recuperar a democracia e um governo comprometido com essa transformação social. Nesse momento tão difícil, o que Bolsonaro expressa é que é inimigo do povo, fato absolutamente explicitado na sua irresponsabilidade e recusa de enfrentamento à pandemia. O que gerou o coronavírus não foi a política, mas os remédios para seus impactos passam fundamentalmente por ela. E como quem não somente sonha, mas também organiza o sonho, afirmo com toda a certeza: salvaremos as vidas, os empregos e a política. Fora Bolsonaro!

*É socióloga e deputada estadual.

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Petróleo cai 50%. Mas na bomba?

Preço médio da gasolina na bomba cai pela 7ª semana seguida, diz ANP

Por Elviro Rebouças*

Com a indústria do petróleo enfrentando a maior crise em 100 anos, a Europa e a América do Norte se entrincheirado, as estimativas mais recentes sugerem que 10% a 15% do consumo mundial poderá evaporar nos próximos meses. Não é exagero afirmar que a estamos diante de um dantesco quadro surreal para a era moderna. Com as economias ocidentais entrando em estado de hibernação, na esperança de sufocar a primeira onda do coronavírus por meio de quarentenas e isolamento, o setor se depara com o fato de que a demanda por combustíveis vai cair mais rápido do que nunca.

Os preços já caíram cerca de 50% desde o começo do mês, com as atividades das companhias aéreas interrompidas e milhões de trabalhadores trocando o automóvel por uma caminhada curta até o laptop na mesa da cozinha. Para um setor há muito ciente de que uma oscilação de 1% a 2% no equilíbrio do fornecimento e da demanda pode representar a diferença entre a disparada e o colapso dos preços, a extensão da queda no consumo é difícil de processar.

As estatísticas da OPEP mostram que o mundo produzia, até fevereiro, uma média de 105 milhões de barris/dia, com o Brasil ascendendo a 3,4 milhões, sendo agora autossuficiente, marco importante para uma nação que há 60 anos não produzia um só litro do combustível. A recente guerra lançada entre a Arábia Saudita e a Rússia, afora os Estados Unidos, os maiores produtores do mundo, fez com que o preço do barril descesse dos US$.65 para US$.25,o menor valor deste o ano de 2003, com uma verdadeira convulsão econômica.

Causa espécie no nosso País, que no acumulado do ano os  preços da gasolina nas refinarias já tiveram uma redução  acumulada de 40%. Atualmente, está no menor patamar dos últimos nove anos. Mas, nas bombas, o produto, em média, teve uma tímida redução de 3,03% de janeiro até agora. Fonte: ANP – Agência Nacional de Petróleo. É a chamada inversão de valores, na subida do preço o consumidor paga tudo, ou até mais, na baixa só tem direito a reclamar. É um conjunto de  fatores que fazem com que os preços nas bombas não tenham uma  redução maior. Principalmente a questão do ICMS e a mistura do etanol.  Além  disso, tem a questão dos estoques, como também a retenção  de lucro excedente.  O empresário vê o volume de vendas mais fraco. Então, no pouco que ele vende, não tem como abrir mão do quanto ganha. É como se fosse uma espécie de subsistência. Nos Estados Unidos, no Canadá e na Europa o galão do produto – equivalente a 3,79 litros – teve uma queda média, este mês, de 23,70 % – Fonte: Bloomberg, numa disparidade ininteligente.

O crash acontece no pior momento possível para um setor que já não tinha a preferência dos investidores, que temem que a demanda por petróleo possa atingir o pico na próxima década e também se preocupam com os impactos ambientais. Os poucos investidores resistentes que estão se atendo às grandes empresas de energia foram chamuscados mais uma vez. O preço da ação da British Petroleum (BP) acumula uma perda de mais de 50% no ano, recuando a um patamar visto pela última vez em 1995, afundando mais até do que quando por ocasião do desastre de Macondo, quando a própria sobrevivência da companhia esteve em dúvida. A ExxonMobil, outrora a maior companhia aberta do mundo, perdeu 70% de seu valor de mercado nos últimos seis anos. A nossa Petrobrás, só neste ano, teve o seu patrimônio na BOVESPA depreciado em 50,33%. Mas uma pergunta fica sem resposta, por que o preço do combustível não cai na bomba?

*É economista e empresário.

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O poder de Jair Bolsonaro

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Presidente perde poder (Foto: REUTERS/Adriano Machado)

Por Luiz Carlos Bresser-Pereira*

Nunca houve no Brasil um governo que tenha perdido tanto apoio social como esse que está aí. Um governo que se põe contra praticamente todos os setores da sociedade para ter o apoio de uma extrema-direita populista. Um governo que aposta no caos para ter mais poder, mas tem cada vez menos poder

No dia 27 de fevereiro, na minha página pública do Facebook, afirmei que o governo Bolsonaro perdera o apoio das elites econômicas e políticas; perdera, portanto, legitimidade social, e não mais governava. Não estava, assim, com o apoio da sociedade para enfrentar a crise interna caracterizada pelo crescimento do PIB de 1,1% em 2019, e pela disparada do dólar.

Nesta semana somou-se à crise interna o pânico em todas as bolsas do mundo com a recessão que o coronavirus deverá causar. A queda da Bolsa de São Paulo, de 25,9%, porém, foi na semana de 9 a 13 de março a muito maior do que na Bolsa de Nova York, de 16,5%. Por que? Essencialmente porque, dada essa crise de legitimidade, o governo Bolsonaro sofre hoje de uma dramática perda de poder.

Nessa mesma semana o Congresso rejeitou o veto do presidente ao projeto de lei aumentando para meio salário mínimo o escopo do Benefício de Prestação Continuada (BCP). O poder executivo foi, assim, incapaz de evitar uma despesa adicional sem a respectiva fonte de receita que, apenas neste ano, deverá custar R$ 20 bilhões. Estamos vendo essa perda de poder do governo também na sua incapacidade de reagir adequadamente à pandemia do coronavirus.

Mas o problema não é apenas perda de poder, é também não saber usá-lo, como se vê desde que assumiu o cargo em janeiro de 2019. Ao invés de enfrentar o desemprego e a falta de demanda com um grande plano de investimentos públicos, o governo promete que a retomada do crescimento acontecerá assim que for aprovada a próxima reforma. As reformas acontecem, algumas delas eram necessárias, como a reforma da Previdência, mas o crescimento não vem.

E assim a crise econômica se interna soma à crise internacional. Por quanto tempo isso será suportável? Não sei. Mas de uma coisa estou certo: nunca houve no Brasil um governo que tenha perdido tanto apoio social como esse que está aí. Um governo que se põe contra praticamente todos os setores da sociedade para ter o apoio de uma extrema-direita populista. Um governo que aposta no caos para ter mais poder, mas tem cada vez menos poder.

*É Professor Emérito da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP).

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Zenaide cobra revogação do teto de gastos

Segundo Zenaide, teto de gastos tirou R$ 13 bilhões da saúde (Foto: cedida)

A senadora Zenaide Maia (Pros-RN), médica infectologista de formação, considerou insuficientes as medidas apresentadas pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, para o enfrentamento à crise econômica, agravada pela pandemia do novo coronavírus. Na análise da parlamentar, ao propor antecipação do 13º salário e saques do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), o governo apenas trata de recursos que já pertencem ao trabalhador, sem oferecer nenhuma solução para o problema do subfinanciamento da saúde pública, estrutura que, se reforçada, pode oferecer resposta à altura para a gravidade da pandemia. “Precisamos de recursos no Sistema Único de Saúde. Se tem alguma instituição que vai salvar vidas é o SUS”, disse Zenaide, em vídeo publicado em suas redes sociais. A senadora defendeu a revogação da Emenda Constitucional 95, do Teto de Gastos, que congelou investimentos públicos por vinte anos. “Só no ano passado, por causa do Emenda 95, foram R$ 13,5 bilhões a menos para a saúde”, criticou a parlamentar.

Eletrobrás

Zenaide Maia, que é presidente da Frente Parlamentar em Defesa da Soberania Nacional, demonstrou indignação com a inclusão do projeto da privatização da Eletrobrás (pl 5.876/19), entre as medidas anticrise do governo. “Venda da Eletrobrás, isso é grave! Aproveita a queda das bolsas para desvalorizar a empresa e vende, desempregando milhões de brasileiros”, denunciou.

Contrato verde-amarelo

A senadora também questionou o fato do governo querer aprovar, na semana em que muitos parlamentares estão afastados de Brasília por serem dos grupos de risco da covid-19, a Medida Provisória 905, do “contrato verde-amarelo”, modalidade que reduz direitos do trabalhador em nome de um alegado aumento da empregabilidade. A Comissão Mista que analisa a MP foi o único colegiado que funcionou nesta terça-feira (17) e aprovou o relatório do deputado Christino Aureo (PP-RJ), desconsiderando acordo feito na última reunião para votação nominal dos destaques.

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Frente ao colapso, uma tentação perigosa

Por José Luís Fiori e William Nozaki

Le Monde Diplomatique

Basta ligar dois pontos para desenhar uma reta. Mas no caso da economia brasileira são muitos pontos numa mesma direção, apesar de as autoridades insistirem em desconhecê-los, iludindo-se com a ideia de uma retomada que nunca existiu e nem nunca esteve no horizonte. Tudo isso muito antes e independentemente da pandemia de coronavírus, da guerra de preços do petróleo e da recessão mundial que deverá ocorrer, piorando a situação. De forma que hoje a única dúvida que existe é se o desastre a frente assumirá a forma de uma estagnação prolongada, acompanhada da destruição da indústria e de seu mercado de trabalho, ou a forma pura e simples de um colapso, com a desintegração progressiva da infraestrutura, dos serviços públicos e do próprio tecido social.

Tudo isso se reflete no crescimento pífio do PIB brasileiro dos últimos três anos, mas muito mais ainda no declínio continuado da taxa de investimento da economia, que era de 20,9% em 2013 e hoje é de 15,4%, a despeito do golpe de Estado, da reforma trabalhista, da reforma da previdência e das privatizações. Ao contrário do prometido, a economia não só não cresceu, como aumenta a cada dia a “fuga de capitais”, que nos últimos três meses já é maior do que em todo o ano de 2019.

A esperança depositada nos investidores internacionais também enfraqueceu com a notícia de que, em 2019, o Brasil simplesmente desapareceu do Índice Global de Confiança para Investimento Estrangeiro, da consultoria americana Kearney, que indica os 25 países mais atraentes para os investidores internacionais. O mesmo índice em que o Brasil ocupava a 3a posição nos anos de 2012 e 2013, tendo caído para o 25º em 2018, e do qual foi simplesmente eliminado na hora das grandes reformas ultraliberais de Paulo Guedes, que supostamente iriam atrair os grandes investidores internacionais.

Piora no cenário

Este quadro só deve piorar com a nova crise econômica mundial que se anuncia, com o avanço da pandemia do coronavírus e com o início de uma nova guerra de preços na indústria do petróleo. As agências financeiras privadas e os organismos internacionais já estão prevendo uma redução do investimento global na ordem de 15% e uma queda do PIB mundial na ordem de 1,9%, com a possibilidade de uma recessão mundial no primeiro semestre de 2020, que pode prolongar-se no segundo semestre, tanto na Europa como nos Estados Unidos. Neste momento, o que domina é o pânico e a incerteza, mas o pior ainda pode estar por vir.

Tudo isso deverá ocorrer no período das eleições presidenciais norte-americanas, quando o presidente Donald Trump busca sua reeleição. Desde agora, bem no início da crise que se anuncia, o presidente americano parece que já está perdendo apoios, segundo pesquisa publicada pelo jornal Financial Times. E é exatamente aqui que pode estar se gestando a grande “tentação” do presidente Trump e que poderá se transformar numa catástrofe para a América Latina nos próximos meses. Afinal, é nessas horas, sobretudo no caso de um presidente americano que busca sua própria reeleição, que é comum a aposta em alguma iniciativa de “alto teor” explosivo, como é o caso de guerras ou ações militares que façam esquecer a agenda desfavorável e que sejam capazes de mobilizar o sentimento comum de identidade nacional e patriotismo dos norte-americanos.

O problema é que o “menu de alternativas” à disposição do presidente Donald Trump é bastante limitado, e parece que só existe uma opção capaz de unificar o establishment norte-americano, cooptando inclusive as principais lideranças do Partido Democrata, qual seja, o cerco, o bloqueio naval ou o ataque direto à Venezuela, em tempo de driblar a epidemia, a recessão e a crise de sua indústria do petróleo. E foi exatamente isto que Donald Trump anunciou no seu discurso sobre o Estado da União, frente ao Congresso Americano, mesmo sem entrar em detalhes. Devendo-se anotar que este foi o único momento em que ele foi aplaudido de pé por todos os congressistas, republicanos e democratas.

Flutuação de ações na Bolsa de Valores (Crédito Pixabay)
Operação militar americana

É exatamente aqui, na preparação dessa operação militar americana, que se inscreve a encenação do jantar do presidente Trump na sua casa de praia, com seu vassalo brasileiro, que ele despreza de forma visível, mas que vem lhe entregando sem contrapartida tudo o que lhe é solicitado – inclusive o novo acordo militar RDT&E, que deverá servir de “guarda-chuva” para todas as ações militares conjuntas no futuro próximo, englobando o tensionamento com a Venezuela. Trata-se de um acordo que começou a ser negociado logo depois do golpe de Estado de 2016, pelo Departamento de Defesa dos EUA em conjunto com o Ministério de Defesa do Brasil e que acaba de ser assinado pelos representantes brasileiros, de forma emblemática, diretamente com o comandante Craig Faller, chefe do Comando Sul das Forças Armadas dos EUA para a América Latina e o Caribe.

Na ocasião da assinatura, o Almirante Craig declarou: “assinamos um acordo histórico hoje, que abrirá caminho para o compartilhamento ainda maior de experiências e informações. Trabalhamos muito próximos das nações aliadas”, além disso fez referências explícitas à Venezuela e à Bolívia (conforme jornal Valor de 08/03/2020).

É interessante chamar atenção para o papel do general Braga Neto, que participou das negociações deste acordo e que depois foi comandante do Estado Maior do Exército brasileiro, antes de assumir recentemente a Casa Civil da Presidência da República, colocando-se ao lado do general Luiz Eduardo Ramos, que era o chefe do comando militar do sudeste e hoje ocupa a secretaria do governo, como cabeças visíveis de um governo “paramilitar” que já conta com 2.897 integrantes das FFAA, alocados em inúmeros órgãos da administração pública federal, muito mais do que durante toda a ditadura militar de 1964, segundo o Portal 360.

Além disso, do ponto de vista econômico, merece atenção neste período recente a forma como a política e os gastos da Defesa têm crescido, na contramão da política econômica ultraliberal do Ministério da Economia. Basta dizer que foi exatamente no período recente de 2019-2020 que o Ministério da Defesa brasileiro teve seu maior orçamento histórico, R$ 115 bilhões em média. E só a Empresa Gerencial de Projetos Navais (Emgepron), vinculada à Defesa e à Marinha, foi capitalizada em R$ 7,6 bilhões, passando por um projeto de revisão de sua atuação e escopo que lhe permite coordenar e executar projetos estratégicos não apenas da Marinha, mas também do Exército e da Aeronáutica. Seguindo esta linha, cabe sublinhar que o próprio acordo RDT&E, parece ter sido apenas um passo a mais de uma estratégia que já passou por outros acordos anteriores com as FFAA norte-americanas, como é o caso do Master Information Exchange Agreement (de troca de informações tecnológicas militares), o Acquisition and Cross-Servicing Agreement (de apoio logístico e de serviços militares) e o Space Situational Awareness (de uso do espaço exterior e aéreo para “fins pacíficos”).

Vários movimentos militares que parecem convergir e coincidir com o documento divulgado recentemente pelas FFAA, no qual elas definem, a partir de seu próprio arbítrio, os cenários da política de defesa brasileira até 2040, com a escolha da França como principal inimiga estratégico do Brasil. Uma escolha que surpreende aos menos avisados, mas que parece perfeitamente coerente com o objetivo central e imediato da preocupação das FFAA brasileiras, que é a Venezuela, e agora também a Guiana, devido a sua descoberta recente de imensas reservas de petróleo off-shore. Além disso, a escolha da França como principal inimigo facilita a provável denúncia futura do acordo de cooperação militar do Brasil com a França, em torno da construção do primeiro submarino nuclear brasileiro, que provavelmente será substituído por um novo projeto conjunto com os próprios Estados Unidos. É dentro dessa mesma perspectiva que se deve enquadrar também o acordo já assinado com os EUA de liberação do lançamento de foguetes e satélites na Base de Alcântara, de venda da Embraer para a Boeing, de transformação do Brasil em aliado preferencial extra-OTAN, o que significa, no limite, a transformação progressiva do Brasil em um “protetorado militar” dos EUA.

Mais ainda, é dentro dessa mesma “ofensiva final” contra a Venezuela, anunciada pelos Estados Unidos e apoiada pelo Brasil, que se pode entender a nomeação do General Mourão para o comando unificado do Conselho da Amazônia, do qual foram excluídos todos os governadores civis da região, que assim ficam afastados de todo tipo de informação e decisão, inclusive na eventualidade de que que o Brasil seja convocado pelos norte-americanos para garantir o cerco amazônico da fronteira venezuelana. Uma situação que parece cada vez mais exequível depois que o Brasil retirou seus diplomatas e cônsules das cidades fronteiriças da Venezuela, e depois que o governo brasileiro notificou vários funcionários e diplomatas venezuelanos de que devem abandonar o território brasileiro no prazo de 60 dias. Uma ruptura diplomática sem precedentes, que só costuma ocorrer em caso de escaladas militares ou de preparação para a guerra.

Salvação da eleição de Trump

Dadas as características próprias da sociedade americana, não é impossível que essa ofensiva militar – muito provável – possa “salvar” a eleição de Donald Trump, numa conjuntura de forte recessão econômica. O mesmo se pode dizer com relação ao governo “paramilitar” brasileiro, que poderia passar a governar por “decreto” e por cima do Congresso Nacional, em caso de uma “emergência de segurança nacional” desse tipo. No entanto, se o Brasil quiser obedecer e seguir atrás dos Estados Unidos, os responsáveis por tal insensatez devem ter claro para si que estarão entrando em um tipo de conflito internacional do qual o Brasil nunca participou, envolvendo de forma direta as três maiores potências militares do sistema mundial.

Deve-se ter bem claro, além disso, que o Brasil não dispõe de armamentos, nem de capacidade financeira e logística para enfrentar as forças armadas venezuelanas, a menos que se restrinja ao mesmo papel simbólico, subalterno e pontual que teve ao lado dos Estados Unidos na Segunda Guerra, e na invasão de Santo Domingos, em 1965. Mas, se mais à frente – e isto é muito provável – as FFAA brasileiras receberem e aprenderem a utilizar o armamento americano mais sofisticado que deve lhes ser repassado pelo novo acordo RDT&E, e decidirem utilizá-lo contra um vizinho latino-americano, seria muito importante que esses senhores que pretendem tomar uma decisão de tamanha gravidade, em nome do povo brasileiro, tenham muito claro o que estão fazendo e quais as consequências do seu ato de vassalagem, para o longo prazo da história do Brasil e da América Latina. Porque eles serão os responsáveis, frente à História, por terem trazido a guerra em grande escala para um continente que foi sempre pacífico, e por terem contribuído com os Estados Unidos para transformar esta região da América do Sul num novo Oriente Médio. Com a diferença que, neste caso, não será concedido ao Brasil o lugar que Israel ocupa na política externa americana. Pelo contrário, o mais provável é que o Brasil se transforme num novo Iraque de Saddam Hussein, que foi usado pelos americanos durante uma década de guerra contra o Irã, e que depois foi destruído pelos próprios Estados Unidos. Quase da mesma maneira com que os Estados Unidos utilizaram os Talibãs na sua guerra contra a URSS, na década de 80, e depois os bombardearam durante 20 anos antes de trazer seus jovens de volta para casa, deixando para trás um Afeganistão completamente destroçado.

José Luís Fiori é professor titular do Programa de Pós-graduação em Economia Política Internacional (IE-UFRJ); pesquisador do Instituto de Estudos Estratégicos do Petróleo, Gás e Biocombustíveis (INEEP). William Nozaki é professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo e diretor técnico do Instituto de Estudos Estratégicos do Petróleo, Gás e Biocombustíveis (INEEP).

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A Técnica do Orçamento Base-Zero

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Marcelo Siqueira*

Aqueles que trabalham em empresa podem estar mais familiarizados com o termo Orçamento Base Zero, porque é uma ferramenta reconhecida e utilizada no mundo corporativo para eliminar gastos desnecessários. Essa técnica já comprovou sua eficiência tanto que tem sido também bastante utilizada por empresas reconhecidas por terem seus custos extremamente enxutos, como é o caso da mega cervejaria Ambev. No entanto, qualquer pessoa interessada em finanças pessoais e em sua gestão monetária pode utilizar essa mesma técnica, que terá bons resultados.

Técnica de Orçamento Base-Zero pode ajudar a eliminar alguns gastos de uma vez por todas, principalmente aqueles que estão presentes por força da imobilidade, frequentemente por anos, e sem que a pessoa se dê conta que não precisa verdadeiramente de conviver com eles.

Uma receita básica pode seguir alguns simples passos:

 

  1. Coloque na primeira linha a renda mensal líquida;
  2. Liste todos os destinos do dinheiro, sem colocar nenhum valor inicialmente. Coloque como primeiro item da sua lista a categoria ‘Investimentos’. É possível que eles não caibam no seu orçamento hoje, mas é aí que essa técnica começa a ficar interessante.
  3. Logo abaixo procure listar todas as suas categorias de gastos, ainda sem colocar nenhum valor, somente os nomes das categorias (ex.: escola, aluguel, supermercado e etc.). Liste tudo o que seja necessário.
  4. As parcelas das dívidas e financiamentos também precisam estar nesse lugar, se for esse o caso. Note que até esse momento, o único valor que aparece na sua planilha é o da renda líquida. Pois bem, a soma dos seus gastos não pode ultrapassar a renda líquida.
  5. Feito isso é preciso começar a preencher com os demais valores. A primeira linha que você vai preencher é a do investimento. Normalmente as pessoas tratam o investimento como a ‘sobra’. É preciso inverter essa condição e se garantir primeiro.
  6. Quanto você gostaria de separar todos os meses (sugiro algo entre 3% e 10% da sua renda, se conseguir mais, melhor)
  7. Agora você precisa fazer a conta de chegada. O que você vai fazer com a renda que sobra depois da parcela dos investimentos? O que realmente é prioridade na sua vida? Será que aquela tv a cabo de R$ 500,00 é tão importante assim? É preciso ter sempre isso em vista.

 

Segundo o Small-Business-Accounting-Guide, ou Guia de Contabilidade para Pequenos Negócios, esse método obriga que você faça a justificativa de todas as despesas planejadas para cada novo período de exercício. Os outros métodos mais tradicionais, em geral, exigem apenas que você explique os valores necessários, além do financiamento do período anterior.

Orçamento Base-Zero tem sido muito indicado para ongs e até mesmo para orçamentação governamental. Neste caso, ele é muito aconselhado porque as despesas podem facilmente ficar fora de controle se for assumido automaticamente que aquilo que foi gasto no ano anterior deve ser gasto neste ano também.

Em finanças pessoais, o termo Orçamento com Base-Zero, às vezes, é usado para descrever a prática de planejar cada ‘real’ de receita que você recebe e, em seguida, ajustar parte de seu plano conforme a necessidade. Naturalmente, há vantagens e também desvantagens que devem ser consideradas.

Entre os pontos favoráveis está alocação eficiente de recursos, pois se baseia em necessidades e benefícios; auxilia a descobrir maneiras econômicas de melhorar as operações; ajuda na detecção de previsões infladas; identifica e elimina desperdício; e incentiva a olhar mais criticamente a maneira como os serviços são prestados. Na relação de aspectos desfavoráveis está o fato de você ter que justificar todos os detalhes relacionados às despesas; e pode ser mais demorado e exaustivo que outros métodos tradicionais, entre outros pontos.

* É mentor financeiro. É formado em Economia pela FAAP e pós-graduado em Mercados Capitais pela USP.