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A anistia e a extinção da punibilidade

Por Rogério Tadeu Romano*

Fala-se, nos dias de hoje, em um projeto de lei para anistiar todos aqueles, seja coautores ou partícipes, que se envolveram na tentativa de golpe e afronta ao estado democrático de direito, acontecida recentemente no Brasil.

A anistia é o ato de caráter geral pelo qual o poder público deixa de punir certos crimes. É concedida por lei que terá efeito retroativo.

É o esquecimento jurídico de uma ou mais infrações.

É cabível a anistia antes e depois do processo ou da condenação. É própria, quando concedida antes da sentença condenatória transitar em julgado e imprópria, se dada, depois da sentença, recaindo sobre a pena.

A anistia pode ser geral (quando beneficia todas as pessoas que participaram do crime) ou parcial. Pode ser ampla ou plena (apaga por completo a matéria de fato e extingue todos os efeitos), é irrestrita quando inclui todos os crimes relacionados com o principal e restrita quando são excluídas algumas infrações.

Se a anistia apaga o delito e extingue seus efeitos, é justo que não se exija o decurso de dois anos previstos no artigo 94, caput, do Código Penal, para a concessão da reabilitação. O mesmo deve ser dito com relação a abolito criminis, como se vê de decisão do STF, em caso de anistia por crime contra a segurança nacional (RCrim 1.439, DJU de 6 de maio de 1983, pág. 6.023).

A anistia é forma de extinção da punibilidade (artigo 107, II, do CP). Não haveria razão, caso isso aconteça, para a continuidade das investigações. Os processos criminais na matéria seriam encerrados e as execuções penais seriam extintas.

A anistia não é um tema novo na história do Brasil.

O professor Paulo Ribeiro da Cunha contabilizou 48 anistias a partir de 1895, quando o presidente Prudente de Morais indultou os rebeldes da Revolução Federalista.

Em 1930, o Decreto nº 19.345, de 1930, concedeu anistia a todos os civis e militares envolvidos nos movimentos revolucionários ocorridos no país.

O Decreto-Lei nª 7.474, de 1945, concedeu anistia, da seguinte forma:

“Art. 1º É concedida anistia a todos quantos tenham cometido crimes políticos desde 16 de julho de 1934 até a data da publicação dêste decreto-lei.

  • 1º Não se compreendem nesta anistia os crimes comuns não conexos com os políticos, nem os praticados, em tempo de guerra, contra a segurança do Estado e definidos no Decreto-lei nº 4.766, de 1 de outubro de 1942.
  • 2º Consideram-se conexos para os efeitos dêste artigo os crimes comuns praticados com fins políticos e que tenham sido julgados, pelo Tribunal de Segurança Nacional.”

No dia 6 de março de 1956, preocupado com a governabilidade, Juscelino Kubitschek concedeu anistia a todos os participantes dos movimentos de novembro de 1955 e de Jacareacanga.

O Projeto de Decreto Legislativo (SF) n° 8, de 1961 previa a concessão de anistia aos participantes do levante militar conhecido como Sedição de Aragarças apresentado pelo Senador Filinto Müller e outros Senadores.

No Brasil, a anistia é um assunto polêmico por conta da Lei da Anistia, de 1979, que beneficiou os que participaram dos crimes políticos cometidos entre 1961 e 1979.

Necessário, por fim, estabelecer diferenças entre o indulto e a anistia: a) o indulto é para crimes comuns; a anistia, em regra, para crimes políticos; b) o indulto só é concedido após a condenação; a anistia pode ser antes ou depois da condenação; c) o indulto é concedido pelo Executivo; a anistia pelo Congresso Nacional; d) o indulto está sujeito à condições; a anistia, é, em regra, incondicional.

Indulto é o perdão coletivo, concedido independentemente de provocação. Mas, diz-se que pode ser individual ou coletivo. O primeiro não deixa de ser uma forma de graça com outro nome e poderá ser provocado por petição do condenado, por iniciativa do Ministério Público, do Conselho Penitenciário ou da autoridade administrativa, que será encaminhado, com parecer do Conselho Penitenciário ao Ministério da Justiça, onde será processado e depois submetido a despacho do Presidente da República. Por sua vez, o indulto coletivo é concedido independentemente de provocação, sem audiência dos órgãos técnicos, pelo Presidente da República, em ocasiões especiais, sendo uma tradição. É concedido todos os anos, nas vésperas do Natal.

*É procurador da República com atuação no RN aposentado.

Este artigo não representa necessariamente a mesma opinião do blog. Se não concorda faça um rebatendo que publicaremos como uma segunda opinião sobre o tema.

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Entenda como Allyson descumpre decisão do STF e deixa pessoas em situação de rua abandonadas

No dia 16 de janeiro de 2024 o presidente Lula (PT) sancionou a lei 14.821, que criou a Política Nacional de Trabalho Digno e Cidadania para a População em Situação de Rua (PNTC) que criou “Plano Ruas Visíveis” garantindo R$ 982 milhões para uma série de ações.

O projeto inclui sete temas: Assistência Social e Segurança Alimentar; Saúde; Violência Institucional; Cidadania, Educação e Cultura; Habitação; Trabalho e Renda; e Produção e Gestão de Dados.

Mas o que isso tem a ver com o Supremo Tribunal Federal (STF)? Em julho de 2023 o ministro Alexandre de Moraes proibiu remoções forçadas de pessoas em situação de rua e estabeleceu um prazo de 120 dias para o Governo Federal apresentar uma política nacional sobre o tema.

A ação foi movida pela Rede Sustentabilidade, do PSOL e o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST).

Mas o que Allyson Bezerra (UB) tem a ver com isso? Uma dica: esta semana a bancada dele rejeitou um pedido da vereadora Plúvia Oliveira (PT) para realizar uma audiência pública sobre as pessoas em situação de rua. Isso diz muito sobre os problemas do prefeito com a questão.

É agora que vamos entender o que levou os vereadores da base do prefeito a essa decisão e o motivo pelo qual o gestor teme um debate sobre o tema.
Caberia ao município fazer um censo para identificar quem são e quantos são as pessoas em situação de rua da cidade e apresentar um projeto de qualificação profissional e construção de casas para essas pessoas. “Aos PODERES EXECUTIVOS MUNICIPAIS E DISTRITAL, no prazo de 120 (cento e vinte) dias, a realização de diagnóstico pormenorizado da situação nos respectivos territórios, com a indicação do quantitativo de pessoas em situação de rua por área geográfica, quantidade e local das vagas de abrigo e de capacidade de fornecimento de alimentação”, diz a decisão de julho de 2023.

Nada disso foi apresentado para cumprir a decisão do STF e se enquadrar no Plano Ruas Visíveis” para receber os recursos. Nada disso foi apresentado pela gestão de Allyson.

A gestão sabe tanto que a audiência pública lhe causaria constrangimentos que correu para divulgar que oferta o “Abrigo Social” desde 2020, quando a prefeita era Rosalba Ciarlini. O programa não cumpre a decisão do STF nem prova que a gestão entrou no programa “Ruas Visíveis”.

A falta de políticas públicas para pessoas em situação de rua é escancarada no Centro de Mossoró que ganhou ares de “Cracolândia”.

Sem contar que o descumprimento da decisão judicial enquadra Allyson em crime de responsabilidade.

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“Vitória da democracia”, afirma Mineiro sobre decisão do STF contra Bolsonaro e aliados

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu por unanimidade, nesta quarta-feira (26), transformar o ex-presidente Jair Bolsonaro e sete aliados em réus por tentativa de golpe de Estado e outros crimes relacionados aos ataques ocorridos em 8 de janeiro de 2023. O deputado federal Fernando Mineiro (PT-RN) destaca a importância dessa decisão: “é uma vitória histórica para o Estado Democrático de Direito, sendo o primeiro julgamento de crimes contra a democracia pela justiça brasileira. Não pode haver impunidade, para que esses crimes não se repitam. Hoje a justiça começou a ser feita”.

Os oito acusados na denúncia que a Procuradoria-Geral da República (PGR) apresentou e foi acatada pelo STF serão julgados pelos crimes de tentativa de golpe de Estado, dano qualificado, grave ameaça contra o patrimônio público, deterioração de patrimônio tombado, associação criminosa e incitação ao terrorismo.

Mineiro também defende celeridade no processo “para que o país possa virar de vez a página desse triste momento da nossa história” e acrescenta: “eles terão oportunidade de fazer suas defesas, o que o presidente Lula não teve. Que seja um julgamento justo e rápido”.

O deputado reforça o compromisso de sua atuação parlamentar no fortalecimento das instituições democráticas. Suas primeiras proposições legislativas neste mandato, em 2023, tratam do “Dia Nacional de Defesa da Democracia e do Enfrentamento ao Fascismo e Terrorismo”, a ser celebrado em 8 de janeiro, e da criação do “Memorial 8 de Janeiro” nas dependências da Câmara dos Deputados.

“O Brasil precisa de uma cultura democrática sólida. O Dia de Defesa da Democracia tem como objetivo educar, conscientizar e criar um legado para que jamais permitamos que a democracia seja ameaçada novamente”, disse o deputado.

Já o “Memorial 8 de Janeiro” será um espaço dedicado à defesa da democracia e à memória dos ataques sofridos pelo país. “Esse memorial servirá para que nunca nos esqueçamos da gravidade dos ataques de 8 de janeiro e para que possamos renovar nosso compromisso com a democracia”, afirmou o parlamentar.

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Bolsonaro é o primeiro ex-presidente réu por golpismo

ICL Notícias

Pela primeira vez na História do Brasil, um político que ocupou a Presidência da República foi tornado réu pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por tentativa de golpe de Estado. A corte acatou nesta quarta-feira (26) a denúncia da Procuraria-Geral da República que aponta Jair Bolsonaro como líder do plano de ataque à democracia que culminou com a invasão das sedes dos três Poderes, em Brasília, no dia 8 de janeiro de 2023.

Além de Bolsonaro, outros seis golpistas do chamado “núcleo crucial”, a maioria militares de alta patente, foram tornados réus.

A decisão do Supremo acontece seis anos depois do início da campanha de Bolsonaro, políticos que o apoiam e integrantes de seu governo contra instituições democráticas brasileiras. Do cargo privilegiado que ocupou, o ex-presidente fez de tudo semear entre os brasileiros descrédito em relação ao Judiciário, e à Justiça Eleitoral em particular.

Contra os adversários, contou com uma eficiente tropa de disseminação de mentiras nas redes sociais, que ficou conhecida como “milícia digital”.

Fez mudanças no funcionamento de setores estratégicos do governo para colocá-los a serviço de uma ruptura democrática. Tudo com o apoio de militares de alta patente como Braga Netto, Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira e outros

Integrantes da Abin, Polícia Rodoviária Federal e Receita Federal e outros órgãos governamentais foram cooptados com esse objetivo golpista.

Com financiamento de setores empresariais, em especial de alguns representantes do agronegócio, a organização criminosa (como define o procurador-geral Paulo Gonet) pagou a infraestrutura para mobilizar seguidores fanáticos que causaram distúrbios em vários pontos do país.

Mesmo após a vitória de Lula nas urnas essa tensão foi mantida, como se viu nos confrontos ocorridos em Brasília, tanto no dia 12 de dezembro de 2022, quando houve tentativa de invasão à sede da Polícia Federal e veículos incendiados, quanto no dia 24 de dezembro, quando ocorreu a tentativa de explodir no aeroporto um caminhão de combustível.

Parte dessa massa de manobra foi a turba que invadiu as sedes dos três Poderes no dia 8 de janeiro de 2023.

Muitos desses movimentos só foram possíveis porque Jair Bolsonaro era o presidente do Brasil.

Devoto da ditadura miltar que matou e torturou tantos adversários no país e subjugou as instituições republicanas, de 1964 a 1985, Bolsonaro queria instalar o seu próprio regime de exceção.

Não deu certo.

A democracia brasileira resistiu.

Que a leniência com os golpistas de 64 não se repita e que Bolsonaro e seus apoiadores tenham julgamento justo, porém rigoroso, já que há poucos crimes piores do que trair a democracia de seu próprio país.

Como assinalou o ministro Flávio Dino, em seu voto, “golpe de Estado mata”.

 

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“O único regime adequado para a gente viver é exatamente a democracia”, diz Isolda sobre o julgamento da admissão de denúncias contra Bolsonaro

Na sessão plenária desta terça-feira (25), na Assembleia Legislativa (ALRN), a deputada Isolda Dantas (PT) fez um enfático pronunciamento em defesa da democracia e pela responsabilização dos envolvidos nos atos de 8 de janeiro de 2023, em Brasília. A parlamentar destacou a importância do momento em que o Supremo Tribunal Federal (STF) julga a denúncia contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros indivíduos acusados de crimes contra o regime democrático.

“É importante dizer nesse país que o único regime adequado para a gente viver é exatamente a democracia, porque sem ela nós inclusive não estaríamos aqui”, declarou ela.

Segundo a deputada, os atos imputados aos acusados configuram a “construção de uma trama que resultaria num golpe de estado do nosso Brasil”. Isolda mencionou o suposto plano ‘Punhal Verde Amarelo’, que teria previsto o assassinato de figuras importantes como o presidente Lula, o ministro Alexandre de Moraes e o vice-presidente da República, alegando que este plano foi impresso no Palácio do Planalto e apresentado a Bolsonaro.

A parlamentar também estabeleceu uma ligação entre esse planejamento e os eventos de 8 de janeiro, descrevendo a invasão e depredação do patrimônio público como “uma barbárie que nunca deve ser esquecida”. Diante disso, Isolda defendeu que todos têm a “obrigação de torcer para que Bolsonaro seja julgado e culpado”, posicionando-se firmemente contra qualquer possibilidade de anistia para aqueles que cometeram crimes contra a democracia.

Em sua fala, Isolda Dantas sublinhou a importância da democracia, especialmente para as mulheres e para o povo brasileiro, argumentando que sem ela não há direito à escolha de líderes nem liberdade de expressão. A deputada aproveitou para criticar um caso ocorrido no Rio Grande do Norte, onde um blogueiro teria sido demitido por criticar o prefeito de Natal, questionando essa atitude em relação aos princípios democráticos e à liberdade de expressão.

Concluindo seu pronunciamento, a deputada Isolda Dantas conclamou os brasileiros a se manifestarem contra a anistia para golpistas e para aqueles que atentaram contra a democracia e o Brasil, relembrando o golpe militar de 1964 e afirmando que a “democracia atual sobreviveu e precisa ser fortalecida através da punição dos responsáveis”, concluiu.

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Entenda como será o julgamento de Bolsonaro

ICL Notícias

Começa nesta terça-feira (25), na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), o julgamento que vai decidir se o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e seus apoiadores vão se tronar réus por tentativa de golpe de Estado.

A denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) será analisada pelo colegiado, que vai avaliar se elementos para a abertura de uma ação penal.

Serão duas sessões na terça-feira (25), uma pela manhã e outra à tarde, e a terceira na manhã de quarta-feira (26).

O objetivo é acelerar o trâmite do caso para que a decisão final seja anunciada até setembro deste ano, evitando contaminar o processo eleitoral de 2026. Os envolvidos na tentativa de golpe foram denunciados por cinco crimes: organização criminosa, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado ao patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado.

O órgão dividiu os investigados em cinco grupos de atuação.

A PGR apresentou, em 18 de fevereiro, denúncia contra 34 pessoas. Mas este primeiro julgamento envolve os acusados do “núcleo crucial” do suposto esquema. A situação de cada investigado será analisada individualmente. São eles:

  • Jair Bolsonaro, ex-presidente.
  • Alexandre Ramagem Rodrigues, deputado federal (PL-RJ) e ex-diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (ABIN).
  • Almir Garnier Santos, ex-comandante da Marinha.
  • Anderson Gustavo Torres, ex-ministro da Justiça.
  • Augusto Heleno Ribeiro Pereira, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).
    Mauro Cesar Barbosa Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.
  • Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, ex-ministro da Defesa.
  • Walter Souza Braga Netto, ex-ministro da Defesa.

Os membros da Primeira Turma são Alexandre de Moraes (relator), Cármen Lúcia, Cristiano Zanin (presidente), Flávio Dino e Luiz Fux.

Caso a denúncia seja aceita pela maioria dos ministros, os acusados serão considerados réus e começará o trâmite de uma ação penal no Supremo.

Qual a ordem do julgamento?

A ordem estabelecida no regimento interno do Supremo é a seguinte:

  1. Abertura da sessão:o presidente da Primeira Turma, Cristiano Zanin, iniciará os trabalhos, apresentando os pontos a serem discutidos e estabelecendo a ordem dos trabalhos.​
  2. Leitura do relatório:o relator do processo, ministro Alexandre de Moraes, fará a leitura do relatório, resumindo os fatos, as acusações e os fundamentos jurídicos da denúncia.​
  3. Sustentação do Procurador-Geral da República (PGR):Paulo Gonet terá 30 minutos para expor suas argumentações, reforçando os pontos da denúncia e respondendo a eventuais questionamentos dos ministros.​
  4. Sustentação oral das defesas:representantes das defesas dos oito réus terão 15 minutos cada para apresentar seus argumentos, na ordem definida pelo presidente da sessão.​
  5. Voto do relator nas preliminares:Alexandre de Moraes lerá seu voto sobre as questões preliminares levantadas, como eventuais nulidades processuais ou incompetência do STF para julgar o caso.​
  6. Votos dos demais ministros sobre preliminares:os ministros votarão sobre as questões preliminares, seguindo a ordem estabelecida — Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia​ e Cristiano Zanin.
  7. Voto do relator no mérito da denúncia:o relator, Alexandre de Moraes, apresentará seu voto sobre o mérito da denúncia e se os investigados devem se tornar réus.
  8. Votos dos demais ministros sobre o mérito:cada ministro proferirá seu voto sobre o mérito da denúncia, na seguinte ordem: ​Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia​ e Cristiano Zanin.
  9. Decisão:após a manifestação de todos os ministros, Cristiano Zanin proclamará o resultado do julgamento, declarando a decisão tomada pelo colegiado.

E se Bolsonaro e apoiadores se tornarem réus?

Se a maioria dos ministros que integram a Primeira Turma decidirem pela abertura da ação penal, os acusados serão considerados réus e começará o trâmite do processo no Supremo. O caso continua na Primeira Turma.

O processo judicial segue uma sequência de etapas destinadas a assegurar o contraditório e a ampla defesa. Inicialmente, ocorre a audiência de instrução e julgamento, onde são produzidas as provas testemunhais, periciais e documentais.

Nessa fase, são ouvidas as testemunhas de acusação e defesa, e há esclarecimentos de peritos, se necessário. Depois, é aberto o prazo para as alegações finais, momento em que as defesas podem contestar as provas apresentadas pela PGR na denúncia e argumentar em favor da inocência dos réus.

Após as alegações finais, o Supremo agendará a data para o julgamento dos acusados, onde será decidido se serão ou não condenados. Depois dessa fase, ainda cabe recurso.

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Um caso de abandono de mandato parlamentar

Por Rogério Tadeu Romano*

Observo a reportagem do Estadão, em 19.3.24:

“O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) pediu ontem licença do mandato na Câmara dos Deputados para viver nos Estados Unidos, onde pretende “buscar sanções aos violadores dos direitos humanos”. Em postagem publicada nas redes sociais, o filho do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) disse ser alvo de perseguição, criticou o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes e chamou a Polícia Federal de “Gestapo”, a polícia secreta da Alemanha nazista.

“Irei me licenciar sem remuneração para que possa me dedicar integralmente e buscar sanções aos violadores de direitos humanos. Aqui, poderei focar em buscar as justas punições que Alexandre de Moraes e a sua Gestapo da Polícia Federal merecem”, afirmou ele, que está nos EUA desde o fim de fevereiro”.

Ainda ali se disse:

“Eduardo afirmou que sua decisão foi difícil, mas que era a melhor forma de “pressionar” Moraes, já que, na sua opinião, Jair Bolsonaro “está condenado”.

Será caso de abandono de mandato?

Há quem entenda que a cassação do parlamentar é matéria de reserva do Poder Legislativo, através do previsto em Regimento Interno da Casa, desde que autorizada pela Constituição.

Os casos do artigo 55, III, IV e V, são de simples extinção do mandato, de modo que a declaração pela Mesa da perda deste é meramente declaratória, envolvendo o mero reconhecimento da ocorrência do fato.

A  extinção do mandato do mandato do parlamentar incide nas hipóteses do Parlamentar deixar de comparecer, em cada sessão legislativa, à terça parte das sessões ordinárias da Casa a que pertencer, salvo licença ou missão por esta autorizada; que perder ou tiver suspensos os direitos políticos; quando o decretar a Justiça Eleitoral, nos casos previstos na Lei.

Dir-se-á que o caso envolve pedido de licença de mandato. Mas tal hipótese merece o correto enquadramento em norma do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, sob pena de entendimento que seja pelo abandono do mandato parlamentar.

A Câmara prevê quatro tipos de licença para os deputados: desempenhar missão temporária de caráter diplomático ou cultural; tratamento de saúde, tentar outro cargo eletivo ou tratar de interesse particular, desde que o afastamento não ultrapasse 120 dias por sessão legislativa. Também são previstas licenças maternidade e paternidade, garantidas em lei.

Tem-se o artigo 55, III, da CF:

Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador:

….

III – que deixar de comparecer, em cada sessão legislativa, à terça parte das sessões ordinárias da Casa a que pertencer, salvo licença ou missão por esta autorizada;

,,,

O Regimento Interno da Câmara dos Deputados (Resolução no 30, de 31.10.72) tratou dessa matéria no artigo 253: “Artigo 253 – Perde o mandato o deputado: III – que deixar de comparecer à terça parte das sessões ordinárias da Câmara, em cada sessão legislativa anual, salvo doença comprovada, licença ou omissão autorizada. $ 29- no caso do inciso III a representação poderá ser de inciativa de qualquer deputado, de partido político ou do primeiro suplente do partido e a perda do mandato será declarada pela Mesa, assegurada ao representado plena defesa, podendo a decisão ser objeto de apreciação judicial.

5º – a representação será encaminhada à Comissão de Constituição e Justiça, que proferirá seu parecer em quinze sessões, concluindo: b- no caso do inciso III, pela procedência, ou não, đa representação. $ 98 -o parecer da Comissão de Constituição e Justiça, uma vez lido no expediente e publicado no Diário do Congresso Nacional é em Avulsos será: nos casos do inciso III encaminhado à Mesa para decisão”.

Trago a lição de J. Cretella Júnior (Comentários à Constituição de 1988, volume V, 2ª edição), quando explica a perda do mandato do parlamentar por falta de comparecimento às sessões ordinárias.

“A ausência ou falta de comparecimento às sessões da Câmara a que pertence o congressista constitui falta gravíssima, cuja consequência é a perda do mandato parlamentar.”

As sessões de que se fala seriam as ordinárias e as extraordinárias, certamente.

É incabível falar em licença de parlamentar para afastamento no exterior com intuito de promover campanha contra a democracia e as instituições brasileiras, a Constituição, quando jurou respeitar à época de sua posse no mandato.

Deve-se se dar, no entanto, ao parlamentar pleno direito de defesa diante de um eventual pedido de cassação, no caso de afastamento do mandato, fora da hipótese prevista para os casos de licença de parlamentar.

A esse respeito já se entendeu:

“CONSTITUCIONAL. DEPUTADO. PERDA DE MANDATO. NÃO COMPARECIMENTO AS SESSÕES DA CÂMARA . AMPLA DEFESA. C.F./88, ART . 55, III, PAR.3.. I. PERDA DE MANDATO DECLARADA DE OFICIO PELA MESA DA CÂMARA DOS DEPUTADOS, TENDO SIDO OBSERVADO O REQUISITO DA AMPLA DEFESA ( CF, ART. 55, III, PAR.3 .). II. MANDADO DE SEGURANÇA INDEFERIDO.

(STF – MS: 20992 DF, Relator.: Min . MARCO AURÉLIO, Data de Julgamento: 12/12/1990, TRIBUNAL PLENO, Data de Publicação: DJ 23-04-1993 PP-06920 EMENT VOL-01700-01 PP-00173 RTJ VOL-00146-01 PP-00077).”

Foi dito, então, pelo relator:

“Quanto ao aspecto formal, o$ 3º reveste-se das características básicas das normas autoaplicáveis, destacadas pela doutrina clássica norte-americana, pois define as entidades, órgãos e autoridades legitimados para a instauração do procedimento e o órgão competente para a decisão e, por outro lado, não indica nem exige processo especial de sua execução. Enquadra-se, portanto, entre as normas de eficácia plena, que são, na definição de José Afonso da Silva, as que “estabelecem conduta jurídica positiva ou negativa com comando certo e definido, incrustando-se, predominantemente, entre as regras organizativas e limitativas dos poderes estatais, e podem conceituar-se como sendo aquelas que, desde a entrada em vigor da Constituição, produzem, ou tem possibilidade de produzir, todos os efeitos essenciais, relativamente aos interesses, comportamentos e situações, que o legislador constituinte, direta e normativamente, quis regular” (Aplicabilidade da Normas Constitucionais, 2a Edição, 1982, pagina 89). Resta saber se, no caso concreto, foi garantida a ampla defesa, exigida no mesmo $ 3º do artigo 55 da Constituição Federal. As peças do processo administrativo que acompanham as informações demonstram que o Requerente exerceu direito garantido no citado preceito constitucional, tendo oferecido defesa escrita, produzido prova documental requerido e obtido a oitiva de testemunhas, com a realização de diligência tendente à sua intimação para a audiência respectiva (folha 241-verso), sendo certo, ainda, que compareceu à reunião da Mesa, convocada para a decisão, fazendo defesa oral durante trinta minutos. Por outro lado, embora tenha considerado exíguo o prazo de cinco dias, o Requerente produziu todas as provas sobre os fatos reputados relevantes para a defesa, em seu intento de descaracterizar a infração prevista no artigo 55, inciso III da Lei Maior.”

Sem dúvida, deve ser caso de representação perante a Casa apresentada por ente legitimado, no sentido de abandono de mandato diante dos fatos acima narrados.

*É procurador da República com atuação no RN aposentado.

Este artigo não representa necessariamente a mesma opinião do blog. Se não concorda faça um rebatendo que publicaremos como uma segunda opinião sobre o tema.

 

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STF começa a julgar deputada bolsonarista por usar arma para perseguir jornalista

ICL Notícias

O Supremo Tribunal Federal (STF) começa, nesta sexta-feira (21), o julgamento da ação penal contra a deputada Carla Zambelli, por porte ilegal de arma e constrangimento ilegal com emprego de arma de fogo. A ação se refere a um episódio em 2022, quando Zambelli perseguiu um jornalista sob a mira de uma arma, após uma discussão em uma esquina dos Jardins, em São Paulo.

O caso de ocorreu às vésperas do segundo turno das eleições presidenciais. Luan Araújo, o jornalista negro perseguido, era apoiador do então candidato à presidência Lula (PT).

Denúncia contra Zambelli

A Procuradoria-Geral da República denunciou Carla Zambelli ao STF pelos crimes de porte ilegal de arma de fogo, previsto no Estatuto do Desarmamento, com pena de 2 a 4 anos de prisão, além de constrangimento ilegal com arma de fogo, previsto no Código penal, com pena inicial de 3 meses a um ano, que é aplicada em dobro quando há o emprego de armas.

A PGR pediu, ainda, que Carla Zambelli tenha o porte de arma cancelado e perca o armamento usado nos delitos. Também pediu a condenação por danos morais no valor de R$ 100 mil.

Processo

O processo contra Zambelli inicia, nesta sexta-feira (21), a fase de julgamento, quando os ministros do STF vão avaliar se houve crime, as circunstâncias e a participação da deputada nos delitos. A partir daí, vão decidir se ela será condenada ou absolvida.

Se for absolvida, o caso é arquivado e não haverá punição. Se for condenada, os ministros vão propor a fixação de uma pena, que vai ser calculada de acordo com a análise do ocorrido. Desta decisão, cabe recurso no próprio Supremo.

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Menos, por favor

Por Marcelo Alves Dias de Souza*

Estes dias o Supremo Tribunal Federal finalizou o julgamento do HC 232.627/DF, no qual se discute a manutenção da chamada “prerrogativa de foro”, nos casos de crimes cometidos no cargo público e em razão dele, mesmo depois que a autoridade tenha deixado a função. Prevaleceu, por 7 x 4, o entendimento do relator, Ministro Gilmar Mendes, pela concessão da ordem, para reconhecer a competência do STF para processar e julgar a ação penal originária, com a fixação da seguinte tese: “A prerrogativa de foro para julgamento de crimes praticados no cargo e em razão das funções subsiste mesmo após o afastamento do cargo, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados depois de cessado seu exercício”. Ter-se-á, segundo consta, a aplicação imediata do novo entendimento aos processos em curso, com a ressalva de todos os atos praticados pelo STF e pelos demais Juízos com base na jurisprudência anterior. Por derradeiro, o Ministro Flávio Dino ainda propôs acrescentar à proposta de tese um item II com a seguinte redação: “Em qualquer hipótese de foro por prerrogativa de função, não haverá alteração de competência com a investidura em outro cargo público, ou a sua perda, prevalecendo o foro cabível no momento da instauração da investigação pelo Tribunal competente”.

Bom, não vou entrar no mérito da decisão. Pode até ser o melhor direito. E nós, operadores jurídicos, a aplicaremos devidamente (já me manifesto expressamente nesse sentido).

O problema aqui está em ser essa, nos últimos anos, a enésima mudança de entendimento do STF sobre o tema, sem que, na maioria das vezes, haja alteração do texto constitucional ou na disciplina legal pertinentes.

Com todo respeito ao nosso STF – a quem atribuo um papel fundamental na manutenção do nosso Estado Democrático de Direito, sobretudo nos últimos anos –, essa “constante mudança” (desculpem a contradição em termos) de entendimento na temática causa grave perplexidade (ainda muito discutiremos os detalhes e as nuanças, que serão várias, da novel interpretação), tumulto (começará nos próximos dias um sobe e desce de inquéritos e processos), morosidade (esse sobe e desce causará um prejuízo enorme à celeridade da persecução penal) e impunidade na administração da Justiça (com a extrapolação desarrazoada dos prazos previstos, sabemos que a Justiça, entre nós, tarda e falha).

Um direito estável é salutar para qualquer país. A instabilidade, com regras de direito constantemente reformuladas e aplicadas de maneira diversa, prejudica muito a confiabilidade no sistema. Se, infelizmente, a instabilidade do direito parece já fazer parte da tradição brasileira, sofrendo o nosso sistema jurídico, num grau altíssimo, desse problema, contribuir jurisprudencialmente o nosso STF para isso é inadmissível. Com todo respeito, claro. Ademais, como de há muito aprendi com o saudoso mestre Arruda Alvim (em “Tratado de Direito Processual Civil”, RT, 1990), a partir da sua requerida estabilidade, deveríamos fomentar uma previsibilidade ou certeza (até bem futura) do que é o direito. A atividade jurisdicional, no seu conjunto e a do STF em especial, deve traduzir e, sobretudo, proporcionar essa certeza, para que os operadores do direito e os jurisdicionados, havendo já uma previsão de como as questões a eles relacionadas seriam tratadas judicialmente, possam melhor ordenar seus negócios e suas condutas. E isso sem falar na igualdade (talvez o fundamento derradeiro da Justiça) de tratamento decorrente de um entendimento jurisprudencial devidamente perene. Nada mais justo que casos semelhantes sejam sempre tratados de maneira semelhante; ao revés, nada mais injusto que esses casos (semelhantes) sejam tratados, se foi ontem ou é hoje, de modos diversos.

Dito tudo isso, rogo, para a temática aqui referida e para tantas outras tão importantes para o nosso país: mudanças, menos, por favor!

*É Procurador Regional da República, Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL e e Membro da Academia Norte-rio-grandense de Letras – ANRL.

Este artigo não representa necessariamente a mesma opinião do blog. Se não concorda faça um rebatendo que publicaremos como uma segunda opinião sobre o tema.

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Algumas anotações sobre o controle de preços dentro do direito econômico

Por Rogério Tadeu Romano*

Fala-se hoje nos altos preços de produtos para os consumidores.

Numa economia capitalista é impossível trabalhar sem o mercado. O resto é ilusão.

Além disso, sem crescimento na economia, uma empresa não sobrevive.

Aliás, o Supremo Tribunal Federal já definiu:

EMENTA: CONSTITUCIONAL. ECONÔMICO. INTERVENÇÃO ESTATAL NA ECONOMIA: REGULAMENTAÇÃO E REGULAÇÃO DE SETORES ECONÔMICOS: NORMAS DE INTERVENÇÃO. LIBERDADE DE INICIATIVA. CF, art. 1º, IV; art. 170. CF, art. 37, § 6º. I. – A intervenção estatal na economia, mediante regulamentação e regulação de setores econômicos, faz-se com respeito aos princípios e fundamentos da Ordem Econômica. CF, art. 170. O princípio da livre iniciativa é fundamento da República e da Ordem econômica: CF, art. 1º, IV; art. 170. II. – Fixação de preços em valores abaixo da realidade e em desconformidade com a legislação aplicável ao setor: empecilho ao livre exercício da atividade econômica, com desrespeito ao princípio da livre iniciativa. III. – Contrato celebrado com instituição privada para o estabelecimento de levantamentos que serviriam de embasamento para a fixação dos preços, nos termos da lei. Todavia, a fixação dos preços acabou realizada em valores inferiores. Essa conduta gerou danos patrimoniais ao agente econômico, vale dizer, à recorrente: obrigação de indenizar por parte do poder público. CF, art. 37, § 6º. IV. – Prejuízos apurados na instância ordinária, inclusive mediante perícia técnica. V. – RE conhecido e provido. ( RE 422.941/DF. Relator: Ministro Carlos Velloso. Julgamento: 06/12/2005. Publicação: DJ 24/03/2006).

Na mesma linha de raciocínio, no encalço da posição firmada pelo Poder Judiciário pátrio, demonstra o Supremo no julgamento da ação direita de constitucionalidade número 3.710/GO, veiculada no Informativo 455 do STF, o reconhecimento por uma ordem econômica livre e respeitadora da propriedade privada, confirmando assim a posição tendente à sistemática capitalista, como segue: O Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pela Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino – CONFENEN, para declarar a inconstitucionalidade da Lei 15.223/2005, do Estado de Goiás, que dispensa do pagamento pelo uso de estacionamento em shopping centers, hipermercados, instituições de ensino, rodoviárias e aeroportos, instalados no Estado, os clientes, alunos e usuários que comprovarem despesas correspondentes a pelo menos dez vezes o valor cobrado por esse uso. Preliminarmente, o Tribunal, por maioria, conheceu da ação. Vencidos, no ponto, os Ministros Cármen Lúcia, Marco Aurélio, Celso de Mello e Sepúlveda Pertence, que dela não conheciam, ao fundamento de ser a requerente carecedora da ação, ante a ausência de pertinência temática. No mérito, entendeu-se caracterizada a ofensa à competência privativa da União para legislar sobre direito civil ( CF, art. 22, I), já que, pela norma impugnada, faz-se uma limitação genérica ao exercício do direito de propriedade. O Min. Marco Aurélio ressaltou que, em se tratando de atividade econômica, a atuação do Estado, a teor do disposto no art. 174, da CF, quanto à iniciativa privada, é simplesmente de fiscalização, incentivo e planejamento, e não pode ser vinculante. O Min. Carlos Britto considerou não haver afronta ao direito de propriedade, nem à competência privativa da União para legislar sobre direito civil, mas sim à liberdade econômica dos estabelecimentos de ensino. O Min. Sepúlveda Pertence, embora acompanhando o relator, ressalvou continuar com a convicção expressa na ADI 1472/DF (DJU de 25.10.2002) e na ADI 1918/ES (DJU de 1º.8.2003). ADI 3710/GO, rel. Min. Joaquim Barbosa, 9.2.2007. ( ADI-3710)( STF – Informativo 455).

Neste mesmo sentido, tutelando o princípio da livre concorrência que é caro à conformação de uma ordem econômica livre e inserta na concepção de economia de mercado, o Ministro Joaquim Barbosa demonstra consonância com o ordenamento constitucional econômico ao decidir a medida cautelar a seguir enunciada: EMENTA: RECURSO. Extraordinário. Efeito suspensivo. Inadmissibilidade. Estabelecimento industrial. Interdição pela Secretaria da Receita Federal. Fabricação de cigarros. Cancelamento do registro especial para produção. Legalidade aparente. Inadimplemento sistemático e isolado da obrigação de pagar Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI. Comportamento ofensivo à livre concorrência. Singularidade do mercado e do caso. Liminar indeferida em ação cautelar. Inexistência de razoabilidade jurídica da pretensão. Votos vencidos. Carece de razoabilidade jurídica, para efeito de emprestar efeito suspensivo a recurso extraordinário, a pretensão de indústria de cigarros que, deixando sistemática e isoladamente de recolher o Imposto sobre Produtos Industrializados, com consequente redução do preço de venda da mercadoria e ofensa à livre concorrência, viu cancelado o registro especial e interditados os estabelecimentos (AC 1.657 MC/RJ. Relator: Ministro Joaquim Barbosa. Julgamento: 26/06/2007. Publicação: DJ 31/08/2007).

A livre fixação de preços é elemento fundamental da livre iniciativa, princípio constitucional impositivo. Assim, o controle prévio de preços como política pública regular viola princípio constitucional.

Admite-se, todavia, que em situações anormais seja possível o controle prévio de preços pelo Estado, na medida em que o mercado privado como um todo tenha se deteriorado a ponto de não mais operarem a livre iniciativa e a livre concorrência de forma regular.

A Constituição brasileira não admite, como política pública, regular o controle prévio de preços.

Note-se que a situação de normalidade a que se fez referência não exclui, por natural, a possibilidade episódica da prática de ilícitos contra a ordem econômica. Diante de algum indício de conduta infratora ou anticoncorrencial, podem ser deflagrados os mecanismos próprios de apuração, mediante devido processo legal, e, se for o caso, de punição.

Em situações normais, o controle estatal em matéria de preços de produtos e serviços será sempre posterior à verificação de práticas abusivas ou anticoncorrenciais, assegurados os direitos fundamentais à ampla defesa e ao devido processo legal ( CF, art. 5º, LIV).

A matéria envolve uma premissa de direito econômico envolvendo a possibilidade de o Estado regulamentar ou regular a economia.

Desregular significa não dar ordenação à atividade econômica, ao passo que desregulamentar, deixar de fazê-lo através de preceitos de autoridade, ou seja, jurídicos, como explicou Felipe A. Gonzáles Arzag (Sobre los conceptos de desregulación y desregulamentación, Revista de Derecho Público y Teoria del Estado, 3, pág. 196).

Expõe Eros Roberto Gradu (Interpretação e crítica da ordem econômica, pág. 48) que devem ser feitas, diante disso, as seguintes indagações: a) conforma-se ao bem comum e ao princípio da justiça a regulação da atividade econômica através de mecanismos de mercado? é possível o próprio mercado, sem uma legislação que o proteja, sofrer uma vigorosa intervenção destinada a assegurar sua existência e preservação?

A resposta à primeira pergunta tem caráter sabidamente ideológico. Os cultores da fé na economia de mercado a ela responderão afirmativamente. Já quem não seja fiel a esse credo responderá de modo negativo, com apoio em verificações empíricas.

Com relação à segunda pergunta, o ministro Eros Grau (obra citada, pág. 48) expõe que não se pode perder de vista a circunstância de que a atribuição, ao Estado, da missão de conduzir o desenrolar do processo econômico, ordenando-o, é toda ela desenvolvida sob o compromisso de preservar os mercados. Isso porque o capitalismo reclama não o afastamento do Estado dos mercados, mas sim a atuação estatal, reguladora, a serviço dos interesses do mercado.

Assim, o mercado não seria possível sem uma legislação que o protegesse e uma racional intervenção, que assegurasse a sua existência e preservação.

Para Felipe A. Gonzáles Arzac (obra citada, pág. 199), os que pretendem desregular a economia nada mais desejam, no fundo, senão uma mudança nas técnicas de regulação, de modo a elevar a eficácia reguladora da atuação estatal sobre o domínio econômico, isto, aliás, através de procedimentos desregulamentadores. Pretende-se desregulamentar para melhor regular.

Dessa forma, diante de uma necessária atuação do sistema da legalidade, vem a surgir uma inflação normativa. Contra a proposta de apresentação de normas rígidas, se opõe a adoção de normas flexíveis, indutoras de comportamentos, que poderá não produzir a eficácia da demanda.

O sistema capitalista é preservado pela Constituição de 1988. O modo de produção, os esquemas de repartição do produto e os mercados capitalistas são mantidos em sua integridade pela Constituição de 1988.

A questão da fixação de tabelamento de preços, dentro da atual ordem econômica somente virá em situações excepcionais.

A experiência demonstrou que o sistema de autorregulação do mercado nem sempre é eficaz em relação a um conjunto de outros aspectos dos produtos e serviços, como qualidade e segurança, veracidade das informações ao consumidor, vedação de cláusulas abusivas, atendimento pós-consumo etc. Daí a necessidade de uma regulamentação específica de proteção ao consumidor, que veio inscrita inclusive como um direito individual constitucionalizado. Trata-se, aqui, tanto de um princípio de funcionamento da ordem econômica, ao qual está vinculada a iniciativa privada, quanto de um dever do Estado. A ele cabe, não apenas assegurar um mercado efetivamente concorrencial, como também criar condições equitativas entre partes naturalmente desiguais, ainda que de forma induzida, e assegurar condições objetivas de boa fé negocial, como demonstrou Teresa Negreiros (Fundamentos para uma interpretação constitucional do princípio da boa-fé, 1998).

A opção por uma economia capitalista se funda na crença de que o método mais eficiente de assegurar a satisfação dos interesses do consumidor de uma forma geral é através de um mercado em condições de livre concorrência, especialmente no que diz respeito a preços.

Respeita-se o princípio da livre iniciativa, essencial no capitalismo, regime econômico que foi escolhido pela Constituição de 1988.

Particularmente, acerca da livre iniciativa e dos demais princípios que com ela convivem, escreveu ainda uma vez Diogo de Figueiredo Moreira Neto: “O princípio da liberdade de iniciativa tempera-se pelo da iniciativa suplementar do Estado; o princípio da liberdade de empresa corrige-se com o da definição da função social da empresa; o princípio da liberdade de lucro, bem como o da liberdade de competição, moderam-se com o da repressão do abuso de poder econômico; o princípio da liberdade de contratação limita-se pela aplicação dos princípios de valorização do trabalho e da harmonia e solidariedade entre as categorias sociais de produção; e, finalmente, o princípio da propriedade privada restringe-se com o princípio da função social da propriedade.”(Ordem Econômica e desenvolvimento na Constituição de 1988, pág. 28).

Disse o ministro Luis Roberto Barroso (A ordem econômica constitucional e os limites à atuação estatal no controle de preços): “Ora bem: se a liberdade para fixar preços de acordo com o mercado concorrencial é da própria essência da livre iniciativa, ela não pode ser eliminada de forma peremptória, sob pena de negação do princípio, e não de ponderação com outros valores. A menos que – e este é o ponto a que se chegará mais à frente – o controle prévio fosse necessário para recompor o próprio sistema de livre iniciativa. Além desses dois princípios fundamentais – livre iniciativa e valorização do trabalho -, o art. 170 apresenta, ainda, um conjunto de princípios setoriais que, em harmonia com esses, deverão conduzir a ordem econômica.”

Na matéria, ensinou Técio Lins e Silva (Congelamento de preços – tabelamentos oficiais (parecer), in Revista de Direito Público, n. 91, pág. 77/78):

“Em consequência, deve-se dizer, portanto, que o sentido do papel do Estado como agente normativo e regulador está delimitado, negativamente, pela livre iniciativa, que não pode ser suprimida. O Estado, ao agir, tem o dever de omitir a sua supressão. Positivamente, os limites das funções de fiscalização, estímulo e planejamento estão nos princípios da ordem, que são a sua condição de possibilidade. O primeiro deles é a soberania nacional. Nada fora do pacto constituinte. Nenhuma vontade pode se impor de fora do pacto constitucional, nem mesmo em nome de alguma racionalidade da eficiência, externa e tirânica. O segundo é a propriedade privada, condição inerente à livre iniciativa. O terceiro é a função social da propriedade, que tem a ver com a valorização do trabalho humano e confere o conteúdo positivo da liberdade de iniciativa. O quarto é a livre concorrência: a livre iniciativa é para todos, sem exclusões e discriminações. O quinto é a defesa do consumidor, devendo-se velar para que a produção esteja a serviço do consumo, e não este a serviço daquela. O sexto é a defesa do meio ambiente, entendendo-se que uma natureza sadia é um limite à atividade e também sua condição de exercício. (…) Esses nove princípios não se contrapõem aos fundamentos da ordem, mas dão-lhes seu espaço relativo. Cumpre ao Estado assegurar os fundamentos, a partir dos princípios. Não se pode, por isso, em nome de qualquer deles eliminar a livre iniciativa nem desvalorizar o trabalho humano. Fiscalizar, estimular, planejar, portanto, são funções a serviço dos fundamentos da ordem, conforme seus princípios. Jamais devem ser entendidos como fun- ções que, supostamente em nome dos princípios, destruam seus fundamentos.”

Não há, na ordem econômica constitucional, que se falar em dirigismo econômico, como ensinou Tércio Sampaio Ferraz Júnior (obra citada, pág. 76/88):

“ O dirigismo econômico é próprio dos modelos coletivistas, baseados na planificação centralizada e cogente e na propriedade coletiva dos meios de produção. O mercado deixa de estar centrado na atividade das pessoas e dos grupos privados e passa a ser largamente manipulado pelo Estado. Já nos Estados que optaram pela livre iniciativa, a disciplina é um instrumento de intervencionismo econômico – prática que teve o seu ponto alto no período em que se fortaleceu a ideia de Estado de bem-estar social -, mas se rege por um postulado essencial: o de que o livre mercado concorrencial é o mecanismo mais eficaz de produção de riquezas e bem estar (ainda que longe de ser perfeito). Em suma: a disciplina é forma de intervenção que se dá não contra o mercado, mas a seu favor.”

Impossível, assim, diante da Constituição de 1988, controlar preços de supermercados no varejo ou no atacado.

Acabou a época dos “fiscais do Sarney”, em 1986, quando de uma frustrada tentativa de controle de preços dentro de uma economia que vivia uma inflação galopante.

O Plano Real não congelou preços e deu certo. É a moeda que ainda usamos.

*É procurador da República com atuação no RN aposentado.

Este artigo não representa necessariamente a mesma opinião do blog. Se não concorda faça um rebatendo que publicaremos como uma segunda opinião sobre o tema.