Por Ney Lopes
Hoje, 14 de julho**, a data nacional da França.
Há dois 14 de julho na história da revolução francesa.
O de 1789, lembrado como a histórica “Tomada da Bastilha”, término do absolutismo monárquico e o início da Revolução.
E o 14 de julho de 1790, a grande festa da federação.
Afinal, qual deles marca a revolução francesa?
Em 9 de julho de 1789, o rei Luís XVI percebeu o início da insurreição popular e a adesão de pensadores franceses às ideias do iluminismo, movimento intelectual, que inspirara a revolução americana (1776) e pregava maior liberdade econômica e política.
Diante da crise econômica gravíssima, o monarca proclamou a abertura da Assembleia Nacional Constituinte, como tentativa de apaziguar os ânimos políticos.
Entretanto, o movimento já estava nas ruas e irrompeu cinco dias depois (14 de julho).
Iniciava-se processo, revolucionário causado pela fome do povo, que levou as massas a invadirem castelos e mosteiros, pilhando e saqueando as propriedades.
A Bastilha era uma prisão, símbolo do antigo regime, tendo sido tomada pela população parisiense.
Ocorreu verdadeiro banho de sangue, quando centenas de pessoas morreram, inclusive a decapitação do governador de Paris. A revolta chegou às áreas rurais, com maior intensidade.
O segundo 14 de julho é de 1790, ocorreu um ano depois, na chamada “Festa da Federação”.
Em Paris, o clima era de esperança e otimismo. A reconciliação nacional parecia próxima.
Diante disso, a população decidiu festejar nas ruas as conquistas alcançadas, após a queda da Bastilha.
Nesse primeiro ano, ocorreram muitos avanços: os bens do clero foram confiscados; os nobres perderam a maioria de seus privilégios; aprovada a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, que assegurava, ao cidadão os direitos civis; liberdade de pensamento e expressão; igualdade perante a lei; defesa da propriedade; direito de se rebelar contra os abusos do governo.
O rei Luiz XVI continuou no trono, com poderes reduzidos pela Assembleia Constituinte.
A principal razão para os festejos foi a reconciliação popular com a monarquia.
A “Festa da Federação” teve o propósito do esquecimento, perdão das violências e o sangue derramado.
A França vivia a “fase otimista da revolução”, que parecia caminhar para um final feliz, com a união da nação, da lei e do rei.
Infelizmente, o 14 de julho de 1790, que comemorou a unidade nacional, não sobreviveu por muito tempo.
A revolução prosseguiu com mortes e o assassinato do rei e da rainha, três anos depois.
Seguiram-se os períodos do terror, Robespierre, de Napoleão Bonaparte.
O exemplo revolucionário francês estimulou movimentos semelhantes na Holanda, Bélgica e Suíça; com apoio na Itália, Alemanha, Áustria, Inglaterra e Irlanda. Chegou até o Novo Mundo e influenciou a independência nas colônias portuguesas e espanholas.
Diante da coincidência dos episódios históricos, ocorridos no dia 14 de julho de 1789 e 1790, surgiu um debate sobre qual deveria ser considerada a data nacional francesa.
A tomada da Bastilha fora um motim popular sangrento.
A Festa da Federação, comemoração pacífica e reconciliadora.
Tudo convergiu para considerar a Festa da Federação, a data em torno da qual a maioria poderia concordar.
Em 1880, o governo francês proclamou o 14 de julho como a data nacional, numa lei, cujo texto “não mencionou o ano”.
Porém, o senador Henri Martin, que rascunhou a Lei do Dia Nacional, na sua proposta se referiu ao ano de 1790.
Na memória popular, até hoje, a data continua associada a tomada da Bastilha, em 1789.
Em Paris, os festejos se concentram na praça da Bastilha, com shows e espetáculos ao ar livre, para brindar o fim o despotismo e a chegada da soberania popular.
Os valores cultuados à época da Revolução Francesa continuam atuais e merecem reflexões, no período de reconstrução que se inicia, após a pandemia devastadora.
O lema “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”, que inspirou o movimento histórico, deverá servir de exemplo à democracia brasileira, neste momento de tensões e inquietações políticas repetidas.
O valor nacional a ser preservado, a qualquer custo, é a estabilidade do nosso Estado Democrático de Direitos, com o respeito a supremacia da vontade popular, preservação da liberdade e igualdade de direitos, que traduzem a universalidade da cidadania.
Esses valores serão alcançados, a partir da legitimidade das próximas eleições gerais de 2022, realizadas com base na Constituição vigente, que conduzirão a nação para a governabilidade indispensável, na difícil tarefa de reconstrução após a pandemia.
*É jornalista, ex-deputado federal, professor de direito constitucional da UFRN e advogado.
**Data do envio do artigo.
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