Garantir o direito ao acolhimento digno da população em situação de rua no município de Natal. Esse é o objetivo de uma ação civil pública do Ministério Público Federal (MPF), Ministério Público do Rio Grande do Norte (MPRN), Defensoria Pública da União (DPU) e Defensoria Pública do Estado (DPE/RN).
A ação cobra da União, do estado do Rio Grande do Norte e do município de Natal – em caráter de urgência – a implementação de melhorias no serviço e a ampliação da estrutura física e do número de vagas da Unidade de Acolhimento para Adultos e Famílias em Situação de Rua, localizada no bairro do Alecrim. A unidade funciona 24 horas por dia, todos os dias da semana, mas não possui capacidade adequada para atender a demanda e ainda apresenta uma série de deficiências estruturais.
Entre os pedidos, destacam-se, ainda, o fornecimento de recursos materiais e equipamentos adequados e a complementação do quadro de pessoal, de acordo com o NOB-RH/Suas e demais normativas do Sistema Único de Assistência Social (Suas). Também foi requisitada a adaptação do veículo da unidade para atendimento às pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida e a estruturação de uma nova unidade de acolhimento 24h em Natal.
Ao todo, o local, que deveria receber 50 moradores de rua, consegue acolher somente 37 (devido à falta de profissionais e à estrutura precária dos dormitórios). E ainda que funcionasse em sua plenitude não seria suficiente, já que a fila de espera conta com 70 pessoas.
Em inspeções feitas pelos ramos do Ministério Público e da Defensoria Pública têm sido constatadas falhas na manutenção do prédio, falta de iluminação e de reposição de materiais básicos, infiltrações, bem como ausência de limpeza por escassez de prestadores de serviço.
Quando caem chuvas fortes, ocorrem alagamentos na unidade, o que já provocou o entupimento dos canos e abertura da fossa. A ausência de câmeras em algumas áreas deixa “pontos cegos”, um risco para a segurança. “A falta da reposição de materiais de expediente é tão severa que são, em muitos casos, adquiridos com recursos próprios da equipe técnica”, expõe a ação.
O local não conta sequer com uma linha telefônica para efetivar ligações e os funcionários usam seus aparelhos particulares para desempenhar as tarefas, como contatar outras instituições ou receber informações e demandas. Nos quartos, existem, ainda, diversas camas quebradas e enferrujadas.
Há um único dormitório feito para abrigar famílias, já ocupado, mas este não possui cama, tendo pais e filhos que dormirem em um colchão no chão. O número de ventiladores também é insuficiente, assim como a ventilação natural, já que apenas parte dos quartos possui janela. A unidade não está devidamente adaptada para oferecer acessibilidade a pessoas com deficiência.
Direitos
Os autores da ação civil pública reforçam que a Constituição Federal e mesmo normas internacionais, como a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, estipulam que é dever do poder público assegurar os direitos fundamentais da população em situação de rua, um grupo social vulnerável que, frequentemente, é alvo de diversas violações.
De acordo com o censo estadual realizado no ano de 2023, o Rio Grande do Norte possui 2.202 pessoas em situação de rua, sendo 1.491 na capital. “É inaceitável que essa parcela da população, que vive em uma condição de extrema vulnerabilidade, não tenha acesso a um acolhimento digno e contínuo. Esta ação busca garantir que seus direitos sejam respeitados e que o poder público cumpra seu papel”, reforça o procurador da República Emanuel Ferreira, que representa o MPF na ação.
Os autores da ação destacam que o financiamento da política socioassistencial, com o funcionamento da Unidade de Acolhimento, deve ser feito em conjunto entre União, estado e município. Contudo, é à prefeitura que cabe executar a política em âmbito local, tendo sob sua responsabilidade direta a gestão do serviço.
Indenização
Além da estruturação da unidade de acolhimento 24h, a ação requer a condenação da União, do estado e do município ao pagamento de R$ 5,35 milhões a título de danos morais coletivos, como forma de compensar os prejuízos causados à sociedade pela omissão no atendimento a essa população.
Contudo, o MPF, o MPRN, a DPU e a DPE/RN acreditam na possibilidade de um acordo com os entes públicos e requerem que, caso seja realizada uma audiência de conciliação entre as partes, o Movimento Nacional da População em Situação de Rua seja convidado ao debate.
A ação foi protocolada na Justiça Federal do Rio Grande do Norte sob o número 0803399-71.2025.04.5.8400.